A resistência à criação de um fundo eleitoral com 3,6 bilhões de reais, abastecido com recursos públicos, e a indefinição das fontes orçamentárias para custeá-lo reacenderam no Congresso o debate sobre a volta do financiamento de campanhas por empresas. Deputados e senadores favoráveis às doações discutem nos bastidores a retomada dessa modalidade como uma alternativa ao financiamento público, caso emperre a aprovação do fundo eleitoral.
O plenário da Câmara dos Deputados vota nesta quarta-feira a proposta que cria a reserva pública bilionária para campanhas. Um dos entraves é o controle sobre a distribuição dos recursos e como o governo vai cobrir as novas despesas. Os deputados não aceitam abrir mão de cerca de 3,07 bilhões de reais em emendas de bancada, uma das possibilidades previstas na Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Em 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional as doações realizadas por pessoas jurídicas para candidatos e partidos e, nas eleições de 2016, apenas pessoas físicas puderam fazer os aportes em campanhas. A regra será mantida para o ano que vem caso o Congresso não modifique a tempo a Constituição Federal – o prazo é até o fim de setembro.
Na semana passada, os senadores Armando Monteiro (PTB-PE), Renan Calheiros (PMDB-AL) e Fernando Collor de Mello (PTC-AL) defenderam a volta do financiamento por empresas durante um jantar oferecido pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), na residência oficial.
Parlamentares presentes disseram que a ideia não foi bem recebida por causa das revelações da Operação Lava Jato relacionadas à prática de caixa dois, que colocou em suspeita a legalidade das doações declaradas à Justiça Eleitoral. Deputados dizem ter receio da repercussão ao apresentar a proposta.
“Costumam dizer que não tem sentido trazer o financiamento empresarial por causa das mazelas expostas pela Lava Jato. Acho o contrário. Se tiver financiamento com regras muito claras e rígidas, com limites individuais, podemos fazer algo compatível com o modelo adotado no Brasil”, disse Armando Monteiro. “Não faz sentido em um momento de crise você sobrecarregar o financiamento público.” O senador afirmou que está pesquisando maneiras como o financiamento por empresas pode ser incluído na reforma política para aplicação em 2018, embora admita que o prazo é curto.
Um dos caminhos mais rápidos para retomar as doações empresariais seria a aprovação, pelo Senado, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 113A/2015. O texto, originado na Câmara, foi relatado pelo atual presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ), quando a Casa era comandada pelo ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), condenado e preso na Lava Jato.
Em maio, a PEC passou pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e está pronta para a deliberação do plenário. Questionado, Eunício disse que não se recordava da PEC. A proposta abre a possibilidade de os partidos voltarem a arrecadar de empresas, embora mantenha a vedação aos candidatos. A norma diz que os limites de arrecadação devem ser estabelecidos por meio de lei, sem determinar o teto.
O senador Aécio Neves (MG), presidente licenciado do PSDB, disse que a retomada seria “um dos caminhos” alternativos ao fundo, mas que deve ser questionado no STF. Ele duvidou que “haja tempo hábil para que isso se construa”. “Vai esbarrar no Supremo.”
Porcentual
Diante da repercussão negativa entre a população, um grupo de deputados da base aliada e da oposição negocia a aprovação de uma emenda para reduzir o valor do fundo eleitoral de 3,6 bilhões de reais e para torná-lo temporário.
A ideia é diminuir o fundo para o equivalente a 0,25% da Receita Corrente Líquida da União (RCLU) e restringi-lo às eleições de 2018 e 2020. A partir do pleito de 2022, a articulação é para a retomada do financiamento empresarial. No texto da reforma política aprovado na comissão especial da Câmara, o fundo será permanente e equivalente a 0,5% da RCLU.
Maia é simpático à ideia. “Parece interessante”, afirmou. Embora já tenha defendido publicamente o retorno do financiamento empresarial, o presidente da Câmara disse não participar da articulação de bastidores para aprovar uma permissão para doação empresarial.
(Com Estadão Conteúdo)