Prevê-se uma escalada na crise, porque no governo, no Congresso e no Judiciário ninguém aposta num recuo de Jair Bolsonaro, que fez do confronto com o Supremo e a Justiça Eleitoral um método de marketing na campanha pela reeleição.
Alvo de uma CPI no Senado e de três inquéritos no circuito entre o STF e o Tribunal Superior Eleitoral, Bolsonaro passou a semana repetindo sua disposição de enfrentar todos, simultaneamente e até o limite.
Acenou a assessores até com a possibilidade de não cumprir decisões dos tribunais superiores nos inquéritos contra ele. Pode ter sido mais um arroubo retórico, porque na terça-feira passada ele respondeu à intimação da Justiça Eleitoral sobre “provas” que dizia possuir de fraudes nas eleições — e, no papel, alegou somente dispor de “indícios”.
É notável a coesão demonstrada pelos juízes do Supremo e do TSE nesse conflito, não só pelo ineditismo em colegiados habitualmente fragilizados pelo personalismo.
A união já foi muito além dos discursos, e avança com decisões coletivas e no compartilhamento de provas num rito processual recheado de inovações, seguindo o roteiro do inquérito do STF sobre a rede público-privada de divulgação de notícias falsas.
Nesta semana, o juiz Alexandre de Moraes deve liberar provas coletadas nesse inquérito para o corregedor da Justiça Eleitoral, Luis Felipe Salomão. Na investigação presidida por Moraes estão alinhadas as razões essenciais que tendem a mover Bolsonaro na trilha do radicalismo permanente até às eleições de 2022.
Ele está sujeito ao enquadramento numa seleta de 11 crimes tipificados nos códigos penal, eleitoral e de segurança nacional.
Alguns deles, como injúria, calúnia e difamação, não exigem um grande esforço de investigação. Mas a maioria pode levá-lo a duras punições, quando estiver na planície política, sem a blindagem com que a lei privilegia o cargo de presidente — se não conseguir se reeleger, a partir de 1º de janeiro de 2023, ou seja dentro de 16 meses; caso seja reeleito, a partir de janeiro de 2028, quando estará com 74 anos de idade.
No quadro atual, porém, Bolsonaro já perde. Virou um candidato de alto risco, cercado no Congresso por uma CPI que avança e no Judiciário por uma espécie de frente harmônica de juízes à espreita das suas ações.
São elas que vão determinar o ritmo de andamento dos processos, com ou sem o aval do procurador-geral Augusto Aras, como já ocorreu no inquérito das “fake news”.
Isso impõe um dilema a Bolsonaro. Ele pode entender a radicalização como uma tática eficaz de marketing eleitoral, até pelo ineditismo, mas ela implica num risco muito mais alto, o de criar um ambiente político propício à ocorrência decisões judiciais surpreendentes.
No limite, há um arsenal de possibilidades para liquefação judicial dos seus planos eleitorais. Por exemplo, uma eventual suspensão da candidatura à reeleição em plena campanha, com todo o desgaste consequente junto ao eleitorado.