“Que seu alimento seja o seu remédio”, disse o grego Hipócrates (460 a.C.-375 a.C.), considerado o pai da medicina ocidental. A afirmação, cunhada há 2 500 anos, nunca foi tão atual. A ideia de que se possa atribuir à dieta a condição de base essencial da boa saúde está por trás de todos os avanços na área da nutrição — incluindo os de caráter tecnológico. “A ciência jamais esteve tão empenhada em dar um basta às doenças e mortes associadas à má alimentação”, acredita o biólogo Charles Godfray, diretor do programa Alimentação do Futuro, da Universidade de Oxford, na Inglaterra, referência no campo nutricional. O objetivo primordial hoje é aliar a mais alta tecnologia ao desenvolvimento de alimentos saudáveis, acessíveis e extremamente nutritivos. Como se verá adiante, no futuro estarão à mesa, por exemplo, comida preparada em impressoras 3D, alimentos manipulados de forma a conter o dobro ou o triplo de nutrientes e embalagens comestíveis.
É claro que o aprimoramento dos alimentos representa um passo fundamental rumo a uma dieta saudável. Mas o modo como eles são consumidos é igualmente importante. E aqui o futuro olha com muita atenção para o passado, admitindo um retorno às origens na forma como nos alimentamos. A ordem da ciência é priorizar pratos naturais, que devem ser saboreados sem pressa. Nesse sentido, quanto aos alimentos em si, a melhor lição é dada pelo jornalista e ativista americano Michael Pollan, autor de quatro best-sellers sobre o assunto: “Não coma nada que sua avó não reconheceria como comida”. Já no âmbito do, digamos, estilo à mesa, um dos movimentos mais vigorosos é o Slow Food. Criado nos anos 80 pelo jornalista italiano Carlo Petrini, ele não para de crescer — está espalhado por 150 países, incluindo o Brasil. Com sua reação ao fast-food, o Slow Food é uma tendência que vai prevalecer nas próximas décadas, nas quais serão servidas a todos nós algumas das invenções descritas a seguir.
• Impressoras de comida
São máquinas que cozinham e imprimem alimentos em formatos, cores, texturas e sabores variados. Utilizando ingredientes em pó, pastas em extrato, lasers e braços robóticos, elas criam pratos em poucos minutos. Há também modelos de impressoras 3D que fazem uso de alimentos frescos em cápsulas de aço inoxidável e os que preparam macarrão com água e farinha de sêmola. As primeiras máquinas desse tipo começaram a ser testadas pela Nasa em 2014. Dois anos depois, surgiu na Europa o Food Ink, o primeiro restaurante a ter pratos em 3D. Itinerante, ele já passou pela Inglaterra, Espanha e Holanda.
• Superalimentos
Alterados geneticamente, eles constituem uma bomba nutricional. Alguns já começaram a ser comercializados, como um tipo de brócolis vendido na Grã-Bretanha enriquecido com o triplo de glucorafanina, substância naturalmente encontrada no vegetal que contribui para o bom funcionamento do sistema cardiovascular. Nem sempre o composto turbinado faz parte do próprio alimento. Pesquisadores do Conselho de Pesquisa em Biotecnologia e Ciências Biológicas da Inglaterra, por exemplo, estão desenvolvendo uma nanopartícula de ferro natural com o propósito de introduzi-la em diversos tipos de ingrediente. No Brasil, há estudos semelhantes conduzidos pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
• Hambúrguer vegetal
Um produto desse tipo criado pela startup americana Impossible Foods é macio e tem a mesma cor e o mesmo cheiro da carne tradicional. Sua fórmula contém proteína de batata (o que dá textura ao alimento), óleo de coco (que faz as vezes da gordura da carne) e uma molécula chamada heme (extraída de levedura, confere sabor, cheiro e cor de carne vermelha). Do ponto de vista nutricional, o hambúrguer vegetal representa o melhor dos mundos: tem mais proteína que os outros tipos de carne e nada de colesterol.
• Sirva com o pacote
O grande desafio da indústria alimentícia — criar embalagens que prolonguem a vida útil dos produtos e não agridam o meio ambiente — poderá ser vendido em breve. A Embrapa já iniciou a elaboração de filmes ultrafinos usando alimentos como mamão, espinafre e tomate desidratados, misturados a nanopartículas cuja função é dar liga ao conjunto. O material não só isola os alimentos do contato com o ar — impedindo a proliferação de microrganismos que necessitam de oxigênio para sobreviver — como também pode ser consumido. Nos Estados Unidos, a Sociedade Americana de Química está desenvolvendo embalagens à base de caseína, uma proteína do leite que pode ser até 500 vezes melhor do que o filme plástico para isolar o oxigênio dos alimentos — e é também comestível.
• Scanner de calorias
Saber exatamente, e em tempo real, quantas calorias e quais propriedades tem um alimento, além de quais toxinas estão presentes nele, será algo comum nos próximos anos. Empresas do Canadá e de Israel estão desenvolvendo um scanner portátil com o objetivo de ler as informações contidas em uma porção de comida. A tecnologia faz uso de sensores ópticos com algoritmos específicos e poderá ser utilizada em qualquer alimento.
Publicado em VEJA de 25 de julho de 2018, edição nº 2592