Na terça-feira 29, durante a terceira edição do fórum Amarelas ao Vivo, evento promovido por VEJA, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), foi indagada sobre a lição que a Operação Lava-Jato e seus desdobramentos haviam transmitido aos brasileiros. “Juridicamente, o Brasil mudou. Todos nós, cidadãos, servidores públicos, poderemos e seremos julgados pelos nossos atos. O devido processo legal aplica-se igualmente a todos”, respondeu. Olhando em perspectiva, os exemplos da efetividade da Justiça são de fato contundentes. Em Curitiba, o marco zero da investigação, 132 réus já foram condenados e 31 estão presos em regime fechado, inclusive o ex-presidente Lula e o ex-deputado Eduardo Cunha. No Rio de Janeiro, onde tramitam os processos que tratam da conexão carioca do caso, houve 37 condenações, entre elas a do ex-governador Sérgio Cabral, também preso.
Uma dúvida surge quando se observam os números do STF, encarregado dos inquéritos e processos contra políticos detentores de foro privilegiado. A estatística da Corte é incrivelmente modesta. Dos mais de 200 parlamentares envolvidos no escândalo, apenas um foi julgado até o momento — o deputado Nelson Meurer, condenado por corrupção na semana passada. É uma desproporção que permite algumas conclusões — a mais óbvia delas, que a morosidade da Justiça a faz leniente com os poderosos. A maioria dos condenados da Lava-Jato em Curitiba e no Rio são empresários, operadores e funcionários da Petrobras que se corromperam. Do universo político, caíram apenas os que não estavam protegidos pelo foro privilegiado, uma constrangedora minoria.
Cármen Lúcia lembrou que o Supremo tem ritmo próprio, mas reconheceu que é preciso julgar os processos “em tempo razoável”. Durante sua gestão, que termina em setembro, a ministra enfrentou pressões e resistiu bravamente a todas. Advogados de criminosos influentes e até colegas de magistratura tentaram convencê-la, por exemplo, a pôr em pauta uma ação que pretendia rever uma decisão do próprio Supremo que autoriza o cumprimento de pena após a condenação em segunda instância. Se a manobra prosperasse, os efeitos seriam deletérios: corruptos notórios voltariam às ruas e assim provavelmente permaneceriam até que o caso prescrevesse. A celeridade não é sinônimo de Justiça. Mas a lentidão sempre foi a senha para a impunidade.
Publicado em VEJA de 6 de junho de 2018, edição nº 2585