Nada abala o humor do ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab. Na manhã da quarta-feira 19, enquanto a Polícia Federal revirava sua casa em São Paulo, cumprindo mandado de busca e apreensão na operação que o investiga por receber 58 milhões de reais ilícitos da J&F, Kassab participava, tranquilo e sorridente, da última reunião ministerial do presidente Michel Temer — ocasião em que foi elogiado por sua “habilidade extraordinária”.
Pois a PF coletou extraordinários 301 000 reais em dinheiro vivo na residência de Kassab. A habilidade é mesmo um grande atributo do ministro. Afinal, não é por acidente que o futuro secretário da Casa Civil de João Doria se mantém firme em governos de variados nortes ideológicos. Ao anunciá-lo como secretário, no início de novembro, Doria elogiou: “É o melhor articulador político do país”.
Na ação protocolada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, investigadores apontam a Yape Consultoria, empresa de que Kassab foi sócio, como recebedora de mesadas de 350 000 reais da J&F, que totalizaram 30 milhões de reais. Os delatores Wesley Batista e Ricardo Saud disseram à PGR que a empresa nunca prestou serviços. Os outros 28 milhões de reais foram pagos ao diretório do PSD para apoio do partido ao PT e para custear a campanha do governador do Rio Grande do Norte, Robinson Faria (PSD), em 2014. O ministro do Supremo Alexandre de Moraes — secretário de Transportes de Kassab quando ele foi prefeito de São Paulo, entre 2007 e 2010 — autorizou a ação. Kassab nega as acusações e diz que o dinheiro tem origem lícita. Sua extraordinária habilidade política não se reproduz na área financeira: quem deixaria 301 000 reais parados em casa, sem gerar sequer os modestos rendimentos de uma poupança?
Publicado em VEJA de 26 de dezembro de 2018, edição nº 2614