Um grupo de professores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) prepara curso livre sobre o “golpe de 2016”, em referência ao processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). A iniciativa tem princípios semelhantes ao de uma disciplina optativa na Universidade de Brasília (UnB), que foi critica pelo ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM).
A proposta da Unicamp é um curso aberto ao público externo, batizado com o mesmo título do projeto da UnB: “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”. O curso dure cerca de três meses e deve envolver trinta professores em aulas como “As políticas do governo golpista” e “O jogo político do STF e o golpe”.
A bibliografia e o programa das aulas não foi divulgado. Um dos organizadores do curso, o professor Wagner Romão, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, explicou que os professores lecionaram “baseados nos temas que pesquisam”.
A disciplina também vai tratar de temas que os docentes avaliam ser correlatos ao “golpe”: os interesses econômicos na saída de Dilma e as políticas implementadas pelo ex-vice presidente Michel Temer, um dos articulares do impeachment. “Pretendemos tratar da causa indígena à conceituação do que é um golpe de estado”, explicou Romão.
Na última sexta-feira, o Departamento de Ciência Política da universidade já havia divulgado uma nota “em defesa da liberdade de cátedra e da autonomia universitária“, após declarações de Mendonça Filho contra o curso previsto para ocorrer na UnB, organizado pelo professor Luis Felipe Miguel.
“Repudiamos as declarações e ameaças do ministro da Educação do governo golpista contra nosso colega da UnB. Elas são a demonstração cabal de que vivemos em um contexto político autoritário, no qual a máxima autoridade federal no campo educacional infringe a liberdade de cátedra e a autonomia universitária contra um docente e cientista político que apenas cumpre seu dever de ofício: pesquisar, elaborar cursos sobre a realidade e ensinar”, criticam os docentes.
Reação
Após a divulgação do curso ofertado na UnB, o ministro da Educação enviou ofícios solicitando à Advocacia-Geral da União (AGU), o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Ministério Público Fedral (MPF) que apurassem se o professor Miguel e demais envolvidos cometeram crime de improbidade administrativa.
“A disciplina, em seu conteúdo, apresenta indicativos claros de uso da estrutura acadêmica, custeada por todos os brasileiros, para benefício político e ideológico de determinado segmento partidário em pleno ano eleitoral, algo que pode desrespeitar o Artigo 206 da Constituição Federal, que estabelece, em seu inciso III, sobre o direito de aprender dos estudantes respeitando o pluralismo de ideias”, disse Mendonça Filho, em nota.
O professor Wagner Romão afirma que, ao tomar essa posição, o ministro foi contrário à natureza do seu cargo. “Foi uma declaração, no mínimo, infeliz. O ministro da Educação deveria, em primeiro lugar, promover a autonomia dos seus contratados, para o ensino e para a pesquisa”.
Diante da posição do político do DEM, a Comissão de Ética Pública da Presidência abriu um procedimento para apurar se Mendonça Filho excedeu suas funções e ameaçou a autonomia constitucional das universidades públicas. O presidente da Comissão, Mauro Menezes, deu dez dias a Mendonça para prestar esclarecimentos.