A composição do Supremo Tribunal Federal é uma preocupação antiga de Jair Bolsonaro. Na campanha, ele disse que poderia aumentar de onze para 21 o número de ministros do STF para “colocar dez isentos lá dentro”. Sua proposta com a mudança, que jamais saiu do papel, era obter uma sólida maioria na mais alta instância do Judiciário, a quem cabe julgar o presidente da República e parlamentares, como seus filhos Flávio, senador, e Eduardo, deputado federal. Empossado no Planalto, Bolsonaro estimulou ofensivas contra os magistrados, tendo participado pessoalmente de uma manifestação de rua que tinha como bandeira, entre outras coisas, o fechamento do STF. As tentativas de intimidação não deram resultado. Na segunda-feira 27, o ministro Celso de Mello determinou a abertura de inquérito para apurar a denúncia — feita pelo ex-ministro Sergio Moro — de que Bolsonaro buscou interferir politicamente na Polícia Federal. Dois dias depois, em mais um revés para o governo, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu a nomeação de Alexandre Ramagem, o nome escolhido pelo presidente para chefiar a PF.
Jorge Oliveira
Perfil: advogado, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência é da estrita confiança de Jair Bolsonaro.
Problema: tem pouca vivência no mundo jurídico.
Hoje, as decisões e os humores do topo do Judiciário são desfavoráveis ao mandatário. Por isso, tornaram-se cruciais para Bolsonaro as indicações que ele fará ao Supremo quando das aposentadorias compulsórias de Celso de Mello, em novembro deste ano, de Marco Aurélio Mello, em julho de 2021. Inicialmente, a ideia do presidente era escolher para o tribunal um nome comprometido com sua agenda conservadora e que votasse, por exemplo, contra a flexibilização da lei do aborto e a descriminalização das drogas. Bolsonaro chegou a declarar que poderia optar por alguém “terrivelmente evangélico” para o posto. Agora, além de terem o conservadorismo, os candidatos à vaga deverão inspirar a certeza de que, uma vez empossados, trabalharão pelo arquivamento da investigação aberta contra o presidente. Se esse caso não estiver concluído até a aposentadoria de Celso de Mello, o nome indicado deverá assumir a relatoria do inquérito, como determinam as regras internas da Corte, e, em tese, decidir sobre quebras de sigilo, depoimentos e perícias.
André Mendonça
Perfil: ex-advogado-geral da União do governo Bolsonaro. Foi recentemente promovido a ministro da Justiça.
Problema: é jovem e enfrenta candidatos com maior experiência jurídica.
Até pedir demissão, o ex-juiz da Lava-Jato era considerado favorito para uma das cadeiras no Supremo. Outro nome em alta há tempos é André Mendonça, ex-advogado-geral da União e sucessor de Moro no Ministério da Justiça. Mendonça é evangélico, tem boa relação com o presidente do Supremo, Dias Toffoli, e ainda faz questão de demonstrar lealdade a Bolsonaro. Chegou a chamar o presidente de profeta ao assumir a pasta da Justiça. Entre os cotados para substituir Celso de Mello, Mendonça desponta como preferido. Também aparece bem posicionado no páreo o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Ives Gandra Martins Filho, que é terrivelmente católico e tem bom trânsito com os ministros do STF Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Gandra Filho é um antigo postulante a uma toga na Corte. No governo de Michel Temer fez campanha pela vaga, mas acabou preterido por Alexandre de Moraes, que agora cuida dos inquéritos sobre fake news e ameaças à democracia.
Ives Gandra Martins Filho
Perfil: tem sólida formação jurídica, trânsito no STF e boas relações com o presidente.
Problema: o conservadorismo exacerbado já o eliminou de indicações anteriores.
Além de juízes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que sempre se insinuam ao presidente de turno, figura entre os cotados para o STF o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Jorge Oliveira, que é amigo de Jair Bolsonaro. Há, no entanto, pelo menos duas restrições a seu nome. Uma é o fato de estar registrado na Ordem dos Advogados do Brasil há apenas sete anos e, por isso, ser chamado de estagiário por advogados mais experientes que trabalham com o presidente. Se as sabatinas do Senado não fossem de fancaria, provavelmente Oliveira seria reprovado no quesito notório saber jurídico, exigido pela Constituição. A outra restrição se baseia na vontade de Oliveira — segundo seus familiares, ele não quer ser nomeado para o Supremo. Nos corredores do Planalto, diz-se que o desejo dele é inversamente proporcional ao do juiz Marcelo Bretas, que cuida dos processos da Lava-Jato no Rio. Evangélico, Bretas tem se dedicado a afagos a Bolsonaro e, se fosse escolhido para a vaga, poderia dar ao presidente uma chance de retomar o discurso de campanha contra a corrupção. Bolsonaro não se mostra tão entusiasmado com a ideia. O motivo é simples: Bretas não goza de muito prestígio no Supremo — e é justamente de prestígio que o presidente precisa para pelo menos equilibrar o jogo no tribunal.
Marcelo Bretas
Perfil: é o responsável pela Lava-Jato no Rio. Evangélico,aproximou-se do presidente.
Problema: juiz de primeira instância, seus métodos são criticados por ministros de tribunais superiores.
Publicado em VEJA de 6 de maio de 2020, edição nº 2685