A saída da Argentina das negociações comerciais do Mercosul gera risco para a adoção do acordo fechado em julho de 2019 com a União Europeia e a Associação de Livre Comércio Europeia (Efta). O país vizinho precisa assinar o texto final, mesmo que planeje esquecê-lo em uma gaveta e não encaminhá-lo para a aprovação do Congresso. Se assim o fizer, Brasil, Uruguai e Paraguai poderão adotar seus termos, conforme a cláusula de vigência bilateral que consta do texto. Do contrário, todos estarão impedidos de cumpri-lo.
Há possibilidade de esses dois grandes acordos serem assinados no segundo semestre deste ano, segundo o secretário de Negociações Bilaterais e Regionais nas Américas, Pedro Miguel Costa e Silva. Ainda falta a revisão legal dos textos, detalhes ainda não concluídos sobre a liberalização comercial e a tradução para os diferentes idiomas da União Europeia. Essa expectativa leva em conta os atrasos provocados pela pandemia de Covid-19, que ceifou do calendário os encontros presenciais.
Em princípio, a Argentina não vai atrapalhar esse processo final. Foi essa a mensagem de Buenos Aires durante videoconferência dos representantes dos quatro países na sexta-feira 24. “Parto do que foi dito oficialmente pelo negociador argentino de que não havia problema na continuidade dessas e das demais negociações. Conto com a palavra dele”, afirmou Costa e Silva. “Mas o ideal é que a Argentina esteja presente nessas discussões finais e assine o acordo”, completou.
Naquela reunião, o governo de Alberto Fernández entrou em choque com a política de aceleração das negociações de livre comércio do Mercosul com países e blocos – posição especialmente defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. O negociador argentino afirmou que o país não participará das conversas em andamento e apenas acompanhará os próximos passos dos acordos já fechados pelo bloco com a União Europeia e a Efta. Para a chanceleria de Buenos Aires, esses debates são “estéreis” e contrariam as políticas nacionais de combate à pandemia e à crise econômica.
Os demais acordos em andamento pelo Mercosul – com Canadá, Coreia do Sul, Singapura e Líbano – e os que iriam começar em breve – com Índia, Vietnã, Indonésia e países da América Central – deverão ser tocados adiante pelo Brasil, Uruguai e Paraguai. As três chancelarias estudam a necessidade de o bloco aprovar um texto adicional para permitir a continuidade dessas conversas, sem arranhar o Protocolo de Ouro Preto, de 1994. Em seu artigo 14, o protocolo diz que acordos com terceiros países, grupos de países e organismos internacionais devem ser negociados com a participação de “representantes de todos os Estados Partes”. Suspensa, a Venezuela não toma parte de nenhum desses projetos.
Segundo Costa e Silva, a própria Argentina deixou claro que não vai criar problemas nessas etapas. No futuro, pode vir a aderir aos acordos fechados. O Itamaraty esperava encerrar as negociações do Mercosul em andamento até o início de 2021. Com a pandemia, o prazo não está delineado. Na sua agenda também estão as discussões sobre facilitação de negócios e outros temas não-tarifários com os Estados Unidos, também sem data para a conclusão. “Todas as negociações do mundo, sobre todos os temas, estão paradas. Não é diferente aqui”, afirmou o embaixador