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Os limites do Supremo

Alguns ministros acham que a democracia lhes deve um favor

Por Ricardo Rangel Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 09h46 - Publicado em 1 dez 2023, 06h00
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  • Lula chamou ministros do STF para conversar. Quis se explicar pela aprovação, no Senado, da PEC que limita decisões monocráticas (para variar, “não sabia”). Os ministros foram para garantir que a PEC seja derrubada na Câmara. O encontro não faz muito sentido. Afinal, o chefe do Executivo não tem que se explicar ao Judiciário por decisões legítimas do Legislativo. E muito menos cabe aos representantes mais altos do Judiciário questionar tais decisões com o Executivo. Ou com quem quer que seja.

    Dias antes, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes reagiram energicamente à PEC, que trataram como um ataque ao Supremo. Barroso disse que o Judiciário está funcionando bem e não precisa de ajuste. É verdade que a PEC surge em um momento de confronto entre o Senado e o STF, mas não é verdade que o Supremo esteja funcionando bem. Faz anos que decisões estapafúrdias são tomadas de forma individual sem jamais serem levadas ao colegiado. E há inúmeros episódios em que ministros se comportaram de maneira no mínimo discutível.

    No fim do ano passado, Rosa Weber decidiu que decisões monocráticas seriam submetidas “imediatamente” ao plenário, mas a medida não “pegou”. A absurda decisão de Ricardo Lewandowski, oito meses atrás, detonando a Lei das Estatais, até hoje não foi apreciada. O mesmo se dá com a decisão de Gilmar, que anulou as provas do processo contra um assessor de Arthur Lira, tomada três meses atrás. São apenas as mais notórias.

    “Esta casa não é composta por covardes”, arrebatou-se Gilmar. Mas a PEC não trata de covardia, e sim de falibilidade: juízes erram. Decisões monocráticas só se justificam como medidas cautelares, a serem referendadas (ou não) pelo colegiado o quanto antes.

    “Magistrados merecem deferência, mas para recebê-la não podem agir como políticos”

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    Ao limitar as decisões individuais, a PEC enfraquece o poder discricionário dos ministros (o que é bom) e fortalece o Tribunal, cujas decisões passam a ser mais legítimas e menos discutíveis. De resto, a PEC é modesta: se estivesse em vigor, teria obrigado o plenário a apreciar a decisão de Lewandowski, por exemplo, mas não a de Gilmar.

    Quando a democracia corria perigo, o STF foi a única instituição a defender a Constituição, e seus integrantes merecem aplausos por isso. Esse tempo passou, mas alguns ministros parecem crer que merecem prerrogativas especiais porque a democracia lhes deveria um favor. Defender a Constituição, porém, não é favor, é a própria razão de ser do Supremo. Os ministros não hão de ter salvado a Constituição para que ficassem desobrigados de obedecer a ela.

    Magistrados merecem deferência, mas para recebê-la não podem agir como políticos. Se os ministros adotarem a discrição e a compostura de Rosa Weber, o STF será tratado como um verdadeiro tribunal. O que é bom para todo mundo.

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    O susto da PEC fez com que a apreciação da decisão de Lewandowski fosse marcada para a semana que vem. Pode-se interpretar que os ministros entenderam o recado e decidiram entrar na linha. Os mais céticos preveem um toma-lá-dá-cá: os políticos liberam os juízes para tomar decisões monocráticas e, em troca, os juízes liberam o loteamento de cargos para os políticos.

    A ver.

    Publicado em VEJA de 1º de dezembro de 2023, edição nº 2870

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