O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta sexta-feira, 2, o julgamento de um recurso para que a Corte reveja seu entendimento a respeito da possibilidade de construção de aterros sanitários em áreas de preservação permanente. Um estudo conduzido pelo consultor do Banco Mundial Luis Sergio Akira Kaimoto atesta que onze capitais do país terão de remover estruturas construídas nestes locais e dar novo destino a mais de 30 milhões de toneladas de lixo, o que deve causar severos impactos sociais, ambientais e econômicos.
“Além de não cumprir a meta de erradicação dos lixões em todo o território nacional em 2024 – prazo estabelecido por lei –, o Brasil terá de lidar com um volume imenso de resíduos sólidos sem destino certo. Na prática, a medida pode causar efeito inverso e contribuir para a proliferação dos lixões, inclusive com a possibilidade de caminhamento dos resíduos para os rios, podendo chegar ao mar”, diz o especialista, que realizou projeções de cenários caso a decisão do STF não seja revertida.
Em 2018, o STF considerou inconstitucional a gestão de resíduos em áreas de proteção ambiental. Os defensores de que a decisão seja revertida alegam que aterros sanitários são parte essencial do saneamento básico, direito previsto na Constituição Federal. Portanto, a segura gestão de resíduos seria de responsabilidade do poder público, devendo ser reconhecida como atividade de utilidade pública e interesse social, o que permitiria a construção dessas estruturas em APP. Até o momento, no entanto, a maioria dos ministros se manifestou pela manutenção da decisão.
De acordo com Kaimoto, além dos problemas ambientais e de saúde pública com o destino incerto dos resíduos, outra grave consequência da decisão seria o aumento das emissões de gases de efeito estufa. No caso, a retirada dos aterros destes locais demandaria o transporte de milhares de carretas de lixo Brasil afora e geraria impacto significativo. “Esse incremento de emissões de gases de efeito estufa na atmosfera seria da ordem de 17,6 bilhões de toneladas de carbono equivalente (tCO2 eq.), correspondente ao desmatamento de uma floresta com a dimensão de 20 vezes a Floresta da Tijuca, no Estado do Rio de Janeiro, ou de toda a cidade de Salvador”, explica.
Kaimoto afirma que os aterros sanitários operados no Brasil possuem “absoluto controle ambiental e técnico” e são reconhecidos tanto pelo próprio Banco Mundial como por órgãos ambientais internacionais por ser uma das soluções mais seguras do mundo. “Ao contrário dos lixões, o armazenamento de resíduos nos aterros é realizado sobre superfícies absolutamente protegidas com impermeabilizações múltiplas, garantindo a preservação por meio do confinamento dos resíduos em camadas cobertas com material inerte, geralmente solo. Os aterros seguem normas operacionais específicas para evitar danos ao meio ambiente, em particular à saúde e à segurança pública. Os aterros são compostos por estruturas que evitam a contaminação do solo, da água e do ar e demandam um manejo adequado contínuo.”
“A erradicação tem que avançar de forma contundente, definitiva e irreversível. Ao interpretar que as obras de gestão de resíduos não são de utilidade pública, os diversos avanços conquistados nos últimos anos pelo setor serão fortemente impactados, podendo-se até mesmo gerar retrocessos que causarão um severo problema de saneamento em grande parte do país, senão o seu colapso”, conclui Kaimoto.