Há uma constante pressão sobre o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), com o andamento do inquérito das fake news. Não deveria ser assim. O magistrado tem avançado contra uma das principais doenças do nosso tempo: a desinformação em massa, responsável por manchar reputações, criar narrativas políticas mentirosas e até definir eleições presidenciais em democracias consolidadas – o que dirá nas jovens como a brasileira.
A mais recente decisão do ministro gerou uma série de críticas e contestações. Ele determinou a retirada do ar de alguns perfis de bolsonaristas em redes sociais, pessoas que estão sob investigação por espalhar fake news e fazerem ameaças às instituições democráticas. Vários reabriram seus perfis com IP do exterior e ele mandou que as plataformas também retirassem do ar. O Facebook, no entanto, afirmou que não cumpriria a decisão de bloquear as contas internacionais e que recorreria ao plenário da corte.
A plataforma tinha a preocupação legítima de combater um precedente delicado: a de um ministro brasileiro determinando algo para ser cumprido em outros países, fora portanto do alcance de sua jurisdição. Mesmo assim é preciso manter o foco no problema maior, o mal das fake news. Recentemente escrevi aqui na coluna que o Facebook havia saído na frente do Twitter ao excluir contas ligadas a assessores do presidente Jair Bolsonaro e dos seus filhos, encontrando terreno seguro no caminho estreito entre limpar a rede sem virar censor de conteúdo. A plataforma disse que era “conteúdo inautêntico”. Num caso específico, um assessor do Palácio do Planalto que escondia a sua identidade em páginas que controlava.
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Clique e AssineO inquérito das fake news já cometeu erros ao censurar órgãos de imprensa como a Crusoé e O Antagonista, mas se transformou em um dos mais importantes em andamento na corte. Ele não combate somente as notícias falsas, mas o extremismo crescente no país. E tenta responsabilizar aqueles que, encorajados pela impunidade de crimes cometidos nas redes, fizeram ameaças de bomba contra o STF.
A gravidade desses ilícitos é tão grande que, em determinado momento, viu-se, além da propagação do ódio, a defesa de teses contrárias à saúde pública em meio à maior pandemia dos últimos cem anos. Para os críticos do inquérito, o problema é a possibilidade de, na tentativa de controle das fake news, se ferir a liberdade de expressão. Como se o remédio fosse matar o paciente.
É preciso todo o cuidado na garantia da liberdade de expressão, mas manifestar opinião é diferente de alimentar o ambiente de ódio, montar uma máquina para reproduzir mentiras e atacar pessoas que não têm o mesmo arsenal para se defender. Ou mesmo para propagar ideias que aumentam a força de uma pandemia que já matou mais de 97 mil pessoas no Brasil.
Não há risco de se ferir a liberdade de expressão. Mesmo que houvesse, existem entidades, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), atentas em buscar evitar retrocessos. O próprio STF tem mecanismos de controle internos que podem corrigir eventuais excessos ou erros. Há divergências internas na corte e interlocutores de ministros afirmam que, quando as investigações perderem o sigilo, tudo ficará esclarecido para a sociedade.
A verdade é que o STF, e o próprio Alexandre de Moraes, têm acertado muito mais que errado neste e em outros casos em tramitação. A corte tornou-se um bastião de defesa da democracia brasileira. Não há risco de o relator do inquérito das fake news matar o paciente. O magistrado tem é combatido com eficácia um mal deste século que tem influenciado a vida de milhares de pessoas. A investigação é ainda mais necessário à medida em que 2022 se aproxima, sem que a polarização diminua. O risco de nada fazer é ver o país engatar de vez a marcha ré.
A chance aberta pelo inquérito é conhecer melhor os mecanismos digitais montados pelo bolsonarismo nas eleições de 2018. Essa mesma engrenagem tem sido acionada para simular movimentos de opinião pública em favor dos grupos mais extremos do atual governo. O país não pode cometer o erro de estar despreparado para neutralizar manipulações que capturem a vontade do eleitor. A democracia precisa ser protegida.