Doze mulheres conduziram o Senado à aprovação de um projeto de emenda constitucional que vai mudar o rumo das eleições a partir do próximo ano, com consequências relevantes na composição de candidaturas aos governos, ao Congresso, às assembleias legislativas e às câmaras de vereadores.
Senadoras de diferentes partidos passaram meses negociando uma consolidação de projetos paralisados há mais de uma década. Na quinta-feira passada, conseguiram aprovar por aclamação, em dois turnos de votação, o texto de uma emenda constitucional que leva a um significativo aumento da participação feminina na política nos próximos oito anos. Em agosto, ele será votado na Câmara.
Mulheres são maioria (53%) entre os 150 milhões de eleitores, mas detêm somente 14% dos votos no Legislativo — é a média de representação na Câmara dos Deputados, em 27 assembleias estaduais e 5,6 mil câmaras municipais.
A emenda constitucional induz a um aumento da participação feminina para 18% dos plenários, no mínimo, a partir das eleições gerais do ano que vem.
Dessa forma, numa conta conservadora, um período máximo de oito anos elas estariam ocupando mais de um terço das cadeiras legislativas em todo o país. E haveria paridade de sexos na representação política já década seguinte.
O mais provável, porém, é que esse processo seja acelerado como efeito das novas regras, entre elas:
* Garantia do mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas nacionais, de cada sexo, sendo proibido aos partidos preencher o número com candidaturas de outro sexo — ou seja, vagas reservadas às mulheres não podem, eventualmente, ser ocupadas por homens;
* Obrigatoriedade de separação de 30% dos recursos dos recursos de campanhas eleitorais para financiamento das candidatas — independentemente do número — nas eleições proporcionais e majoritárias, em todos os níveis da Federação. Caso esses recursos não sejam integralmente usados em uma eleição, poderão ser acumulados e gastos na disputa eleitoral seguinte;
* Determinação de reserva às mulheres de 30% do tempo propaganda eleitoral no rádio e na televisão, não importa o número de candidatas;
* Imposição de um gasto de 5%, no mínimo, do fundo de manutenção dos partidos na realização de programas, efetivos e permanentes, para formação e engajamento de mulheres na atividade política, focados na participação em disputas eleitorais.
Se confirmada na Câmara — por enquanto, nada indica o contrário—, essa emenda constitucional vai provocar mudanças estruturais na organização partidária, eleitoral e política nacional, numa etapa marcada pela tendência à redução do número de partidos e pelo debate sobre alteração no sistema de governo a partir de 2026, para um tipo de semiparlamentarismo, ou semipresidencialismo.
Um dos efeitos será o resgate do Brasil do fim da fila dos países com baixa representação feminina na política. Está na 132ª posição entre 190 nações associadas à ONU, atrás de Burkina Faso, Senegal e Equador, por exemplo.
Nos últimos 195 anos, a Câmara teve 7.333 deputados, incluindo suplentes. As mulheres conquistaram o direito de ser eleitas em 1933, mas nesses quase 90 anos, ocuparam somente 266 cadeiras.
Houve avanço nas eleições municipais de 2020, quando a Justiça Eleitoral impôs aos partidos uma cota de 30% de recursos do fundo eleitoral para financiamento de candidaturas femininas. Ocorreram manipulações, como a proliferação de candidatas-laranjas. Mas, no final, foram eleitas 652 prefeitas e 885 vice-prefeitas.
Ainda assim, restaram 948 municípios (17% do total) sem uma única mulher no plenário das câmaras de vereadores, e outras 1,3 mil cidades (23%) com apenas uma vereadora.