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Falar (de) abobrinha

A curiosa história de uma hortaliça injustiçada

Por Lucília Diniz
13 jun 2024, 18h42

Se você procurar por “abobrinha” no dicionário, verá que o tratamento popularmente dispensado a esse vegetal já se oficializou. Em diferentes léxicos, depois da descrição botânica e culinária, está lá registrada alguma variante de seu significado corrente: bobagem, besteira, disparate; desprovido de conteúdo, sem importância.

Nada mais injusto, porém, do que dizer que é uma hortaliça inútil. Alguns acham que ela é sem gosto, o que talvez elucide a associação com algo vão. Outra explicação, porém, pode vir de suas origens.

Como aconteceu com tantas outras riquezas alimentares que se espalham por toda parte, o mundo deve à colonização da América o conhecimento da abobrinha. No México, de onde é nativa, há registros de que há mais de 10 mil anos os indígenas locais começaram a domesticar as cucurbitáceas – a família inclui também abóboras e pepinos.

Domesticar, sim, porque eram plantas selvagens, de frutos mirrados e amargos – nem sempre ela foi assim sutil. A planta tenra que hoje encontramos em qualquer supermercado precisou de uma seleção cuidadosa, em que os antigos agricultores separavam os melhores exemplares para dar continuidade ao cultivo.

Descomplicada como é, adaptou-se bem na Europa a partir do século 16 e lá, especialmente a partir das plantações italianas, se desenvolveu até chegar a ser o que conhecemos hoje. Espalhou até o Oriente Médio e cruzou o oceano de volta, tornando-se popular, a partir do século 20, também no resto do continente americano.

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O papel da Itália para sua difusão foi tão preponderante que, aqui, a variante mais comum (existem 380) é a que chamamos “abobrinha italiana”, E é no idioma da Bota, como “zucchini”, que ela é conhecida nos Estados Unidos, na Austrália e no Canadá.

Ao desembarcar no Velho Continente, destinou-se primeiro à mesa dos menos favorecidos, outra possível raiz histórica de seu desprestígio. Mas, à semelhança do rabanete, foi fonte de alimentação em momentos de escassez.

Como cresce rápido, foi usada nas hortas caseiras durante a Grande Depressão americana, nos anos 1930. Nos anos 1940, pelo mesmo motivo, foi uma das escolhas dos britânicos para a campanha de incentivo ao plantio doméstico de vegetais. O país passou a produzir 75% do que consumia – antes da Segunda Guerra, essa era a porcentagem de alimentos que tinha de importar.

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Ela é verde porque, de fato, se colhe antes de amadurecer. Nesse estágio, ela tem a polpa mais macia. Depois, se torna mais fibrosa e aparece o amargor.

Nos mercados mexicanos e nas feiras italianas, é possível encontrar à venda belos buquês de suas flores amarelas e volumosas. A “flor de calabaza” ou “fiore di zucca” é uma iguaria empanada, recheada ou como recheio, e em sopa. Aqui não temos esse costume. Enquanto o fruto é durável e resistente, a flor é delicada e murcha logo.

Mas, mesmo sem levar em conta as flores, a abobrinha é muito versátil. Pode ser consumida crua, em saladas, ou cozida. Trabalhei muito para popularizar o “macarrão de abobrinha”, em que o vegetal é cortado em longos fios, substituindo a massa com vantagens, por ter poucas calorias e muitas fibras. Também não tem glúten, o que a torna apta aos intolerantes a esse elemento. É, portanto, uma amiga de qualquer dieta.

Por essas e outras, em vez de falar abobrinha, deveríamos falar mais – e melhor – de abobrinha.

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