Alguns anos são decisivos na história da humanidade, dado seu imenso poder de movimentar placas tectônicas. Tome-se como exemplo 1989, doze meses que fizeram ruir o bloco soviético, com a queda do Muro de Berlim. Há anos afeitos a pavimentar o amanhã, como aconteceu com 1968, porque era proibido proibir e não sobrou paralelepípedo sobre paralelepípedo nas ruas de Paris, Rio de Janeiro ou São Paulo, no “ano que não terminou”, na feliz e já clássica definição do jornalista Zuenir Ventura. E 2022, como entrará para a história? Não se trata de exercício de futurologia, muito menos de acessar uma bola de cristal inexistente, mas é possível antevê-lo como um tempo de arrumação — um período de olhar para o passado de modo a entender o presente.
Calhou de o ano em que o Brasil decidirá, na eleição presidencial de outubro, se prossegue ou não com a aventura do governo de Jair Bolsonaro ser marcado por efemérides — os 200 anos da Independência e os 100 anos da Semana de Arte Moderna. Em um e outro caso, o Brasil mudou. Naquele 7 de setembro de 1822, deixamos de ser colônia de Portugal para virarmos um reino. Era a abertura da estrada para um novo país, que depois abraçaria a República, mas que ainda hoje, dois séculos depois, parece exigir permanente zelo com a democracia, tão frágil, tão jovem. Atravessamos os séculos XIX, XX e este início do XXI no delicado equilíbrio entre o que fomos e o que desejamos ser, entre o que é fundamentalmente brasileiro e o que deve ser trazido de fora. É o que iluminou a Semana de 1922, ao beber da cultura beletrista da Europa e dos Estados Unidos, de modo a criar um caminho diferente, o do chiclete misturado com banana. Os modernistas redescobriram há 100 anos um Brasil que tinha sido reinventado 100 anos antes.
Em 2022, o ano 3 da pandemia, de esperança na força da vacina, apesar da eclosão da variante ômicron, o Brasil atrairá a atenção do mundo — em virtude da escolha do presidente, mas também dos 200 anos daquele grito do Ipiranga e porque está na hora de reconquistarmos a relevância perdida nos últimos tempos. O país tem, sim, condições políticas e econômicas para figurar no grupo de nações gigantes como os Estados Unidos ou China — que fará da Olimpíada de Inverno de Pequim, em fevereiro, vitrine de seu poderio. Convém olhar para os próximos meses, como se verá nas páginas a seguir, com o cuidado dedicado à antessala de um novo tempo. Pode não haver revoluções, talvez nenhum muro caia, mas 2022 é a janela histórica que nos levará para o futuro, sobretudo se formos capazes de virar a página da Covid-19 e soubermos escolher bem quem vai liderar o processo de modernização do Brasil.
1822
Os 200 anos da Independência são um modo de o país olhar o passado para enxergar o amanhã
China
A Olimpíada de Inverno em Pequim será vitrine das ambições globais da incontornável potência
Catar
A Copa do Mundo, a primeira no Oriente Médio, servirá de teste para o emirado absolutista
Publicado em VEJA de 12 de janeiro de 2022, edição nº 2771