Os primeiros testes em humanos da SpiN-Tec, vacina contra a COVID-19 desenvolvida com tecnologia e insumos totalmente nacionais e financiada por instituições brasileiras, começaram na sexta-feira (25/11), na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte (MG).
O imunizante foi desenvolvido no Centro de Tecnologia de Vacinas (CTVacinas) da UFMG em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz em Minas Gerais (Fiocruz Minas). Recebeu investimentos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para as etapas de ensaios pré-clínicos e clínicos de fases 1 e 2. O desenvolvimento da vacina também teve apoio da FAPESP e de outras instituições.
“Esse é mais um passo relevante do Brasil na direção de ter uma cadeia nacional de produção de imunobiológicos. O Ministério da Ciência e Tecnologia atua como fomentador desse desenvolvimento para que o resultado final dessas pesquisas possa ser revertido em autonomia nacional para a produção própria e atender às necessidades do sistema nacional de saúde”, disse o ministro Paulo Alvim à Assessoria de Imprensa do MCTI e da UFMG.
“O conhecimento acumulado com o desenvolvimento da SpiN-Tec nos deixa mais preparados para enfrentar futuros desafios no campo da saúde”, afirma a reitora da UFMG, Sandra Regina Goulart Almeida. Para ela, o início dos testes da vacina em humanos é resultado de um grande esforço institucional. “Além da UFMG, com sua competente equipe de cientistas, e do apoio imprescindível do MCTI, contamos com o suporte de vários parceiros, como o governo do Estado, a Prefeitura de Belo Horizonte e parlamentares estaduais e federais. Sem essa grande frente, não teríamos chegado até aqui”, destaca. Ela acrescenta que o investimento em vacinas contribui para a soberania nacional, uma vez que países que desenvolvem seus próprios imunizantes conseguem, de um lado, proteger sua população e, de outro, exportar as vacinas e os insumos necessários à sua fabricação. “É uma condição que possibilita a esses países influenciarem os rumos da geopolítica internacional de forma decisiva e colaborativa”, argumenta.
Ensaios clínicos
Os ensaios clínicos são coordenados pelo professor Helton Santiago, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG e serão realizados na Unidade de Pesquisa Clínica em Vacinas (UPqVac), sob a liderança do professor Jorge Andrade Pinto, da Faculdade de Medicina da UFMG.
O CTVacinas abriu cadastro para pessoas que desejam participar, como voluntárias, das fases 1 e 2 dos testes clínicos da SpiN-Tec em 17 de novembro. O início do recrutamento de voluntários se iniciou logo após a aprovação do estudo pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), instância de avaliação ética em protocolos de pesquisa com seres humanos. Em menos de dez dias, mais de mil pessoas se inscreveram para a triagem. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já havia autorizado a realização dos testes clínicos em outubro.
Até o início dos ensaios clínicos, a SpiN-Tec passou por várias fases. Os testes pré-clínicos, realizados em laboratório e em animais, confirmaram a eficácia e a segurança do imunizante. Os resultados foram publicados na revista Nature Communications em agosto deste ano.
Os testes clínicos serão realizados em três fases. As duas primeiras fases ocorrerão em Belo Horizonte: a primeira com 72 voluntários e a segunda com 360. Os testes serão realizados no modelo duplo-cego: parte dos voluntários integra um grupo-controle, que receberá a vacina da AstraZeneca. Durante o estudo, cada participante ficará em acompanhamento por um ano. Após a conclusão das fases 1 e 2, o grupo que desenvolve a SpiN-Tec enviará os relatórios do estudo para a Anvisa e solicitará autorização para a terceira e última etapa dos testes, que reunirá de 4 a 5 mil voluntários de várias partes do Brasil.
Mecanismo de ação
As pesquisas para o desenvolvimento da vacina foram iniciadas em novembro de 2020. O antígeno (substância que desencadeia a produção de anticorpos) da SpiN-Tec inclui duas proteínas do vírus SARS-CoV-2, causador da COVID-19. Uma é a proteína Spike (S) e a outra é a do nucleocapsídeo (N), o que explica o nome SpiN.
“As vacinas contra a COVID-19 em uso geram respostas de anticorpos neutralizantes. Já a SpiN-Tec foi desenvolvida para induzir resposta dos linfócitos-T, ou seja, ela gera uma resposta contra várias partes da molécula do vírus, e não apenas contra um de seus segmentos, como ocorre com as vacinas atuais”, explica Ricardo Gazzinelli, coordenador do projeto e do CTVacinas da UFMG, também pesquisador da Fiocruz.
Por essa particularidade, os pesquisadores acreditam que a SpiN-Tec seja mais efetiva que as vacinas atualmente disponíveis no Brasil contra variantes do SARS-CoV-2, como a ômicron e subvariantes. O imunizante também tem alta estabilidade, o que possibilita que seja mantido a 4 °C, como outras vacinas, e facilita a distribuição para lugares longínquos.