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Proteção contra o infarto numa só cápsula

Remédios que reúnem ativos contra pressão alta, colesterol e coágulos são armas para combater o mal — e estão prestes a ser lançados

Por Paula Felix, de Barcelona
Atualizado em 4 jun 2024, 12h19 - Publicado em 3 set 2022, 08h00
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  • Depois de um infarto, são muitos os pacientes que relatam como o evento os levou a adotar mudanças nos hábitos. O episódio é atalho para o recomeço da vida — mas é também vetor de comportamento contraditório. Ao menos metade das pessoas que sobrevivem abandona o tratamento. Em alguns casos, ainda no primeiro ano. Diante de uma atitude que foge do controle dos médicos e pode render complicações em cascata, a ciência parece estar próxima de uma solução. Na semana passada, foi apresentado ao mundo o desempenho de uma única cápsula capaz de reduzir em 33% a probabilidade de novos eventos. A boa notícia foi um dos maiores destaques do congresso da Sociedade Europeia de Cardiologia, realizado em Barcelona, na Espanha, um dos mais relevantes encontros da especialidade.

    arte Polipílula

    O remédio em questão é chamado de polipílula, uma categoria de medicação que há anos vem sendo objeto de atenção da cardiologia porque reúne, em um mesmo comprimido, princípios ativos reconhecidamente eficientes para reduzir os riscos de problemas cardiovasculares. O primeiro trabalho em busca dessa espécie de santo graal contra o infarto e o acidente vascular cerebral foi realizado em 2003. Desde então há no mundo uma corrida para chegar ao conjunto perfeito de medicamentos. Só na Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos existem 449 estudos registrados, 25 deles em andamento.

    O trabalho que acaba de ser apresentado une três medicamentos baratos, de fácil acesso e fundamentais no tratamento pós-ataque cardíaco: a aspirina, que tem ação antiplaquetária, a atorvastatina, que reduz o LDL, o colesterol ruim, e o ramipril, contra a hipertensão. Os médicos do Hospital Mount Sinai, dos Estados Unidos, e do Centro Nacional de Investigações Cardiovasculares, da Espanha, avaliaram a eficácia da medicação em cerca de 2 400 pacientes. O objetivo era medir seu efeito na mortalidade pós-infarto, na redução de novos infartos ou acidente vascular e na necessidade de realização de cirurgias emergenciais de revascularização, quando os cirurgiões constroem dentro do coração novas pontes por onde o sangue pode fluir. O remédio saiu-se bem em todas as circunstâncias, mas o que brilhou mesmo aos olhos foi a diminuição de mortes depois de um primeiro infarto em 33%.

    COMBO - Antígeno: a polipílula ataca as principais ameaças ao coração -
    COMBO - Antígeno: a polipílula ataca as principais ameaças ao coração – (//Divulgação)
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    Os resultados podem ser atribuídos à maior adesão ao tratamento entre os que receberam os três remédios em só um comprimido. O estudo mapeou a fidelidade às recomendações médicas após seis meses e três anos. Em seis meses, o índice de baixa aderência à terapia medicamentosa era de 5,5% no grupo da polipílula e de 9,5% entre os pacientes que seguiam o regime habitual, no qual os medicamentos são tomados separadamente. Na verdade, a dificuldade em fazer com que os pacientes sigam a prescrição médica é um calcanhar de aquiles em todo o esforço da medicina para prevenir eventos cardiovasculares. É normal que indivíduos em risco ou que já passaram por esses problemas tenham de tomar mais de um remédio ao menos duas vezes por dia. A situação pode causar confusão ou esquecimento de um comprimido, dois, ou de toda a medicação. “Só no tratamento da insuficiência cardíaca temos quatro medicamentos obrigatórios. Fora os demais usados para outras doenças”, diz João Fernando Monteiro Ferreira, presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia. “Isso desanima o paciente.”

    Em um estudo inédito, também apresentado no congresso, pesquisadores brasileiros traçaram pela primeira vez o perfil do paciente com insuficiência cardíaca no país. A partir de uma amostra de 3 000 pacientes que precisaram de internação depois do infarto, eles concluíram que metade deixa a medicação de lado já no primeiro ano. Dados assim dão a dimensão da importância de colocar à disposição opções como a polipílula. O combate às enfermidades cardiovasculares é feito de forma variada e inclui prática de exercícios físicos, alimentação equilibrada e cuidado com a saúde mental. Os remédios são parte do arsenal. Contudo, uma vez indicados, devem ser tomados corretamente. Enquanto as polipílulas não chegam, portanto, nada de esquecer comprimido na cartela.

    Publicado em VEJA de 7 de setembro de 2022, edição nº 2805

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