O Ministério da Saúde informou esta semana que 250 cidades no estado de São Paulo estão em estado de alerta para dengue, zika e chikungunya, doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. No entanto, um estudo publicado no periódico Science pode trazer uma boa notícia: indivíduos que já tiveram dengue em algum momento da vida apresentam menor risco de infecção pelo zika vírus. A explicação: é possível que os anticorpos produzidos para combater a contaminação pela dengue ofereça proteção cruzada contra o zika. Segundo a pesquisa, a redução de contágio é de 25% para a maioria dos indivíduos que desenvolveram anticorpos após uma infecção por dengue. Em alguns casos, essa proteção pode subir para 44%.
Apesar disso, os pesquisadores descobriram que indivíduos que foram infectados recentemente por dengue tem resultado oposto, ou seja, estão mais propensos ao zika. Algumas das possíveis explicações para o fenômeno podem ser anticorpos protetores ainda não suficientemente desenvolvidos ou algum problema no sistema imunológico que aumenta o risco de contrair a doença. Além disso, a baixa imunidade poderia ser explicado pelo fato de que as duas infecções poderiam estar ocorrendo em um curto espaço de tempo, o que não permitiria ao organismo se proteger contra a segunda infecção.
O estudo
A equipe, composta de pesquisadores brasileiros e americanos, acompanhou 1.453 pessoas residentes em um bairro pobre de Salvador, na Bahia, que esteve entre os principais focos do surto de zika que aconteceu no Brasil em 2015. O estudo, que já vinha acontecendo antes da epidemia, permitiu o recolhimento de amostras antes, durante e depois do surto, o que permitiu análises comparativas. Antes do surto de zika, 642 participantes foram testados para infecção anterior por dengue; destes 86% apresentaram resultados positivos. O teste, que também avaliou o nível de anticorpos contra a doença, apontou que a cada duplicação dos níveis de anticorpos contra dengue correspondia a uma redução de 9% no risco de zika.
Exames realizados durante a epidemia de 2015 indicou que 73% dos participantes apresentavam evidências de contaminação pelo zika. De acordo com os pesquisadores, indícios apontam que o número de infectados não foi maior porque muitos indivíduos haviam adquirido imunidade suficiente para reduzir a transmissão. Essa descoberta também explicaria porque a epidemia no Brasil não foi ainda maior. “Isso significa que existem alguns anticorpos de proteção cruzada contra a dengue que também protegem contra o zika. Mais estudos podem ser necessários para avaliar se as novas vacinas contra a dengue podem ser úteis na prevenção do zika”, comentou Ernesto Marques, da Fundação Oswaldo Cruz, em nota.
Diante das descobertas, os cientistas ressaltaram a necessidade de desenvolver testes confiáveis e de fácil acesso comercial (ou nos sistemas públicos de saúde) para mulheres em idade fértil que tenham pretensão de engravidar. Isso ajudaria a determinar o nível de imunidade contra o zika, doença que pode causar microcefalia no bebê durante a gestação. A equipe também salientou a importância de determinar se a vacinação contra a dengue pode ajudar a proteger as gestantes contra o zika e, consequentemente, diminuir os riscos de saúde para a criança.
Outros estudos em andamento acompanham bebês nascidos de mulheres que tiveram zika durante a gestação para estabelecer se a imunidade contra a dengue da mãe foi capaz de diminuir os riscos de condições congênitas relacionadas ao zika nas crianças.
Evitando a picada
Enquanto alguns cientistas se dedicam a relação entre a imunidade contra a dengue e a proteção contra o zika, outros tentam descobrir uma forma de evitar que mosquitos transmissores de doenças piquem o ser humano, impedindo, assim, a contaminação. Esse é o caso da equipe da Universidade Rockefeller, nos Estados Unidos. Os pesquisadores descobriram que quando mosquitos recebem doses de neuropeptideo Y – substância responsável por diminuir a sensação de fome – eles ficam menos inclinados a picar o ser humano. “Evitar que mosquitos piquem seres humanos é um ponto importante de intervenção na estratégia global de saúde pública”, escreveram os autores na revista Cell.
Segundo a equipe, as doses do medicamento seriam administradas através de armadilhas que imitam os sinais de um hospedeiro – para o qual os insetos são atraídos. Para eles, essa opção é mais eficiente do que técnicas que visam erradicar os mosquitos, que são importantes na manutenção da cadeia alimentar na natureza.
Dengue
A dengue é a doença viral que mais se espalha no mundo. Transmitida pelo mosquito Aedes Aegypti, estima-se que 2,5 bilhões de pessoas no mundo vivam em área de risco de transmissão do vírus, o que causa entre 50 milhões e 100 milhões de infecções e 20.000 mortes anualmente.
O vírus da dengue, possui quatro sorotipos (DENV 1, 2, 3 e 4), todos com circulação no Brasil, causa uma doença febril aguda. Na maioria dos casos, os sintomas são leves e autolimitados. A infecção por um sorotipo gera imunidade permanente para ele. No entanto, uma segunda infecção – por um outro sorotipo – é um fator de risco para o desenvolvimento da forma grave da doença (dengue hemorrágica).
Zika
O zika é um arbovírus, ou seja, sua transmissão ocorre principalmente através de mosquitos, em especial pelo Aedes aegypti, mas também pode ser adquirido através do contato sexual e pela transfusão de sangue. Quando se manifesta em adultos, os sintomas duram alguns dias e são leves, como erupções cutâneas, conjuntivite, artralgia e febre leve.
No entanto, se a infecção acontece durante a gestação, a doença pode trazer sérias consequências uma vez que pode causar microcefalia – condição que faz a cabeça e o cérebro da criança serem menores que o normal, o que pode levar a convulsões, atraso no desenvolvimento e outras deficiências. O vírus também pode aumentar o risco do desenvolvimento da síndrome de Guillain-Barré – doença que leva o sistema imunológico a atacar os nervos e pode causar fraqueza muscular e paralisia.