A ocitocina é um hormônio peculiar. Tem a função de promover as contrações uterinas durante o parto e a ejeção do leite durante a amamentação, mas ficou conhecida, principalmente, como o “hormônio do amor”, pois costuma ser liberada quando estamos perto de nossos parceiros. Quando isso acontece, os níveis de cortisol (hormônio do estresse) diminuem no organismo. Também está intimamente ligada à sensação de prazer e de bem-estar físico e emocional, tendo sua concentração aumentada em 40% depois do orgasmo.
Agora, pesquisadores da Michigan State University mostraram que, em peixes-zebra e culturas de células humanas, a ocitocina tem outra função inusitada: estimula as células-tronco derivadas da camada externa do coração (epicárdio) a migrar para sua camada intermediária (miocárdio) e ali se desenvolver em cardiomiócitos, células musculares que geram contrações cardíacas. Os resultados foram publicados em Frontiers in Cell and Developmental Biology.
“Isto abre portas para novas terapias potenciais para a regeneração do coração em humanos”, disse Aitor Aguirre, professor assistente do Departamento de Engenharia Biomédica da Michigan State University e autor do estudo.
Os cardiomiócitos geralmente morrem em grande número após um ataque cardíaco. Por serem células altamente especializadas, elas não podem ser reabastecidas. Mas estudos anteriores mostraram que um subconjunto de células no epicárdio pode sofrer reprogramação para transformar em células-tronco, chamadas células progenitoras derivadas do epicárdio (EpiPCs), que podem regenerar não apenas cardiomiócitos, mas também outros tipos de células cardíacas.
“Pense nos EpiPCs como os pedreiros que consertavam catedrais na Europa na Idade Média”, explicou Aguirre. Entretanto, para nós, a produção de EpiPCs é ineficiente para a regeneração do coração em humanos em condições naturais.
Regeneração
Entra o peixe-zebra: famoso por sua extraordinária capacidade de regeneração de órgãos, incluindo cérebro, retina, órgãos internos, ossos e pele. Eles não sofrem ataques cardíacos, podendo até regenerar um quarto do coração. Isso é feito em parte pela proliferação de cardiomiócitos, mas também por EpiPCs.
Mas como esse mecanismo fantástico pode ser aproveitado? Para os autores, a ocitocina é a resposta. Eles descobriram que, no peixe-zebra, dentro de três dias após uma lesão por congelamento no coração, a expressão do RNA mensageiro da ocitocina aumenta em até 20 vezes no cérebro. Eles mostraram ainda que essa ocitocina viaja para o epicárdio do peixe-zebra e se liga ao receptor de ocitocina, desencadeando uma cascata molecular que estimula as células locais a se expandirem e se desenvolverem em EpiPCs.
As novas células progenitoras, então, migram para o miocárdio do peixe-zebra para se desenvolver em cardiomiócitos, vasos sanguíneos e outras células cardíacas importantes, substituindo aquelas que foram perdidas.
Um efeito semelhante pode ser observado em tecido humano in vitro. A ocitocina estimula as culturas de células-tronco a se tornarem EpiPCs. Apesar de mais testes serem necessários, justamente em humanos. “Reaproveitar os pacientes após danos cardíacos não é um longo período de imaginação. Mesmo que a regeneração do coração seja apenas parcial, os benefícios para os pacientes podem ser enormes”.