Tumor silencioso e grave quando descoberto tardiamente, o câncer de pulmão foi tema de alguns dos mais promissores estudos apresentados durante a reunião anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco, na sigla em inglês), maior evento médico dedicado ao tema no mundo, que se encerrou nesta terça-feira, 4. Diferentes pesquisas investigaram terapias que aumentaram a sobrevida dos pacientes e apresentaram até soluções tecnológicas para dar suporte a pessoas em cuidados paliativos, abordagem que oferece acolhimento e qualidade de vida àqueles que já não se beneficiam com as propostas de tratamento disponíveis.
Relacionado principalmente ao tabagismo, em mais de 80% dos casos, o tumor é o que mais mata no mundo e as pesquisas mais atualizadas têm se debruçado em caminhos para personalizar o tratamento e atacar de forma eficaz as células cancerígenas. Os destaques no evento foram para as iniciativas que estudaram o câncer de pulmão de não pequenas células, tipo mais prevalente e que traz riscos de metástases cerebrais.
O mais celebrado foi o ensaio com o lorlatinibe, da farmacêutica Pfizer, que demonstrou eficácia para sobrevida em cinco anos sem progressão da doença em 60% dos casos. Esse parâmetro é considerado padrão-ouro em estudos dessa natureza. Foram analisados 296 pacientes que apresentavam mutação do gene ALK.
“Pela magnitude do benefício, do uso de lorlatinibe nestes pacientes, e sobretudo pela proteção que este medicamento dá no sistema nervoso central, ou seja, metástase cerebrais, que são na verdade um calcanhar de Aquiles nesse tipo de paciente, a gente pode dizer já é um dos mais importantes da história recente da oncologia”, declarou Carlos Gil Ferreira, presidente do Instituto Oncoclínicas.
Terapia-alvo e imunoterapia
Os estudos de fase 3 Laura e Adriatic, da farmacêutica AstraZeneca, demonstraram pioneirismo para a aplicação de terapia-alvo e imunoterapia nesse tipo de tumor e também com resultados positivos.
No Laura, foi utilizado o osimertinibe, primeiro inibidor do gene EGFR, que aumentou a sobrevida livre de progressão em pacientes com mutação no receptor do fator de crescimento epidérmico (EGFRm). A redução no risco de morte ou progressão da doença foi de 84%. Participaram do ensaio voluntários em estágio III após quimio e radioterapia concomitante e nove centros de pesquisa brasileiros. Ele foi apresentado na plenária, o momento mais importante do evento.
“Esses pacientes faziam habitualmente quimioterapia e radioterapia, mas agora temos no horizonte um estudo mostrando que, para pacientes com mutação no gene EGFR, a terapia-alvo também melhora a eficácia do tratamento”, analisa William Nassib William Jr., líder da especialidade tumores torácicos da Oncoclínicas.
O Adriatic focou em outro tipo de tumor que atinge o órgão: o câncer de pulmão de pequenas células em estágio limitado, voltado para pacientes que não tiveram avanços com a quimioradioterapia. Com adoção da imunoterapia durvalumabe, eles evoluíram positivamente, de modo que o candidato a tratamento pode ser a primeira imunoterapia a demonstrar benefícios para esse padrão de paciente.
O risco de morte foi reduzido em 27% e, após três anos, 57% dos pacientes estavam vivos. O achado é importante, tendo em vista que apenas 15% a 30% dos pacientes diagnosticados com esse tipo de tumor sobrevivem cinco anos após o diagnóstico.
É uma mudança de paradigma após 20 anos de resultados negativos nesse cenário. Com o medicamento foi possível quase dobrar as chances de cura desses pacientes”, afirma Mauro Zukin, especialista em câncer de pulmão da Oncologia D’Or.
Rastreamento e cuidados paliativos
Na esfera do diagnóstico, um estudo realizado em Taiwan apresentou a proposta de fazer o rastreamento de pacientes com predisposição ao aparecimento do tumor também com base no histórico familiar.
“Tradicionalmente, este exame é feito baseado no histórico de tabagismo dos pacientes, mas a pesquisa sugere a possibilidade de avaliarmos um novo protocolo de indicação, baseado na história familiar, independentemente do tabagismo, ou seja, a recomendação de tomografia de screening para pacientes que têm parentes próximos com câncer de pulmão”, explica William Jr.
Para pacientes em cuidados paliativos, um estudo do Hospital Geral de Massachusetts se propôs comparar o atendimento por meio de telessaúde ao suporte presencial. A análise foi feita com 1.250 pacientes recém-diagnosticados com câncer de pulmão de células não pequenas avançado e constatou que os resultados para a qualidade de vida eram equivalentes.
“Nossas descobertas destacam a necessidade crítica dos sistemas de saúde e dos legisladores adotarem a telessaúde de forma mais ampla em padrões de cuidados paliativos baseados em evidências”, afirmou, em comunicado, Joseph Greer, autor do estudo.