Apesar da Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmar que uma dose da vacina de febre amarela é suficiente para uma proteção vitalícia contra a doença, no Brasil, o Ministério da Saúde, continua a indicar duas doses. Para Reinaldo de Menezes Martins, consultor científico sênior de Biomanguinhos/Fiocruz, instituição que produz a vacina, a estratégia do governo brasileiro é prudente, segundo informações do jornal O Globo.
“Garantir que uma dose só imuniza por toda a vida é um pouco arriscado. No Brasil, onde há a doença de forma endêmica, é melhor ser mais prudente. A recomendação no país já foi tomar a vacina de dez em dez anos ao longo de toda a vida, mas comprovamos que isso é um exagero. No entanto, se vai continuar sendo dada em duas doses ou se passará para somente uma dose, isso vai depender de novas pesquisas científicas feitas nos próximos anos.”, disse Martins, ao jornal O Globo.
Pela recomendação do ministério, a medida vale para quem mora ou vai viajar para áreas endêmicas da doença. No esquema vacinal de duas doses, a primeira garante proteção por dez anos; e após esse período, deve ser aplicada uma segunda dose, de reforço, que irá conferir imunização definitiva.
Recomendação da OMS
Em maio de 2013 a OMS anunciou uma nova recomendação aos governos: a suspensão da segunda dose da vacina de febre amarela, aplicada dez anos após a primeira. De acordo com a organização, pesquisas apontam que apenas uma dose da vacina é suficiente para imunizar contra a doença durante toda a vida.
Mas, segundo Martins, estudos brasileiros evidenciam o contrário. “Não estou dizendo que a decisão da OMS é errada, mas optamos por ser mais cautelosos.”, explicou.
Desde o início das campanhas de vacinação, em 1930, 600 milhões de doses já foram aplicadas ao redor do mundo. De acordo com dados da OMS, desde então foram registrados apenas 12 casos de pessoas que realmente precisariam tomar uma segunda dose da vacina.
Decisão controversa
Para alguns especialistas, mais do que saúde pública, a decisão da OMS foi motivada por uma questão econômica. Existem poucas empresas no mundo que produzem a vacina em escala e com qualidade – a Biomanguinhos/Fiocruz, localizada no Rio, é uma delas.
Diante de preços baixos e de um mercado concentrado apenas nos países mais pobres, empresas farmacêuticas não investem na produção dessas vacinas. Em grande parte da África, por exemplo, onde já há escassez desse recurso, os governos aplicam apenas uma dose por pessoa. No entanto, a OMS garantiu que esse não foi o motivo da decisão.
Outro argumento da organização é que as vacinas não se tornaram mais eficazes nos últimos anos e, por isso, pessoas que receberam o imunizante há uma década, por exemplo, estariam tão protegidas quanto alguém que acaba de ser vacinado. “As vacinas não mudaram. Foi o acúmulo de informação que nos fez chegar a uma nova conclusão científica”, declarou Philippe Douclos, secretário científico da OMS, na época da decisão.
No Brasil, segundo o jornal O Globo, os pesquisadores se preocupam em conseguir aprimorar a técnica para fabricá-la, porque o método utilizado atualmente é o mesmo de 1937, quando a vacina começou a ser usada. A técnica não permite uma produção acelerada, por isso algumas regiões do mundo recebem uma quantidade menor de vacinas do que realmente precisam.
Aumento da procura
O atual surto de febre amarela em Minas Gerais, preocupou muitas pessoas que começaram a correr aos postos de saúde em busca da vacina. Mas, segundo Martins, pessoas fora das áreas de recomendação para a vacina não precisam correr para tomá-la.
“A grande maioria das pessoas que toma a vacina da febre amarela não sente nada. Mas uma a cada 300.000 ou 400.000 desenvolve febre amarela. Quando sabe-se que o vírus circula por determinado lugar, o benefício de se vacinar supera o risco. Mas, quando o vírus não é encontrado na região, não tem motivo para se expor a esse risco. É basicamente por causa desses efeitos adversos que não se coloca a imunização contra febre amarela como política de vacinação em todo o país”, explicou ao O Globo.
No Brasil, os locais de risco são as regiões de matas e rios das seguintes regiões: todos os Estados da Região Norte e Centro-Oeste, bem como parte da Região Nordeste (Maranhão, sudoeste do Piauí, oeste e extremo-sul da Bahia), Região Sudeste (Minas Gerais, oeste de São Paulo e norte do Espírito Santo) e Região Sul (oeste do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul).
As pessoas que moram ou aqueles que irão viaja para estas regiões devem tomar a vacina, caso ainda não tenham feito ou se o fizeram há mais de dez anos. Para crianças, a política é que elas sejam imunizadas pela primeira vez aos nove meses de idade e tomem a segunda dose aos quatro anos. As que tomaram a primeira dose depois dos cinco anos de idade deve tomar um reforço após dez anos, conforme recomendado para o restante da população.
Em nota ao jornal O Globo, o Ministério da Saúde disse que as duas doses são uma medida extra de segurança. “O esquema adotado pelo Ministério da Saúde de manter a dose de reforço é uma medida a mais de segurança para evitar a transmissão da doença, visto que não há estudos locais que comprovem a eficácia de apenas uma dose na população brasileira, até o momento.”