O alto consumo de pornografia pode ser a principal causa de disfunção erétil em indivíduos jovens, alertam especialistas. Segundo estudos recentes, o número de homens abaixo de 40 anos que apresentam o problema subiu de 2% a 3% para até 35%. Um dos principais motivos para o aumento de casos está relacionado ao consumo de conteúdos pornográficos facilitado pela ampliação do acesso à internet. “Eu agora tenho clientes com disfunção erétil que ainda estão no início dos seus 20 anos”, comentou Clare Faulkner, terapeuta psicossexual e de relacionamento, ao The Guardian.
Para tentar solucionar o problema, muitos médicos prescrevem Viagra para esses pacientes. No entanto, para muitos deles, o remédio não funciona já que o problema tem origem no comportamento sexual compulsivo estimulado pela pornografia. Como consequência, muitos desses jovens apresentam dificuldades não apenas na vida sexual como têm problemas para formar relações românticas, já que a principal fonte de educação sexual vem de um cenário distorcido que não representa a realidade.
“Um dos meus amigos começou a tratar as meninas como ele vê nos vídeos – nada muito pesado – apenas um tapa aqui ou ali”, relatou um garoto de 13 anos que participou de uma pesquisa realizada pela Universidade de Middlesex, na Inglaterra.
Cada vez mais cedo
O fenômeno se torna ainda mais preocupante uma vez que adolescentes entre 11 e 16 anos já iniciam o processo de masturbação com material explícito disponível na rede. Pesquisa realizada pela Universidade de Middlesex, na Inglaterra, descobriu que 94% dos jovens de 14 anos (entre meninos e meninas) já viram pornografia on-line, enquanto 60% deles acessaram o conteúdo pela primeira vez dentro de casa. Já um estudo irlandês de 2018 publicado no periódico Porn Studies revelou que 52% dos entrevistados (homens) começaram a usar pornografia para masturbação com 13 anos.
Alguns iniciaram ainda mais cedo, como é o caso de Alexander Rhodes, de 31 anos, que passou a utilizar esse recurso a partir dos 11 ou 12 anos de idade. “Eu estava na primeira geração de pessoas que cresceram com pornografia [disponível] na internet de alta velocidade”, disse no ano passado em Conferência no Centro Nacional de Exploração Sexual dos Estados Unidos.
Desde a inserção de Rhodes no mundo da pornografia, a internet evoluiu ainda mais e celebridades da indústria pornográfica agora dispõem de contas no Instagram onde fazem propaganda do próprio trabalho e atraem a atenção de crianças de 12 ou 13 anos que não deveriam estar consumindo esse tipo de conteúdo. “Uma geração de crianças corre o risco de perder a infância em tenra idade ao deparar com pornografia extrema e violenta on-line”, alertou Peter Wanless, diretor executivo da Sociedade Nacional para a Prevenção da Crueldade contra Crianças (NSPCC), à BBC.
Para Mary Sharpe, da Fundação Reward, responsável pelo alerta no Reino Unido, a situação chega a ser perturbadora. Ela contou que, em uma visita recente a uma escola, um adolescente perguntou quantas vezes por dia se masturbar com pornografia era considerado “exagero”, deixando claro que a prática é realizada indiscriminadamente ao longo do dia. “Eles estão usando isso o tempo todo e ninguém está dizendo que é um problema”, ressaltou ao The Guardian.
Já Clare destacou que esse tipo de comportamento é muito parecido com os vícios (drogas, cigarro ou álcool). Isso significa que quanto mais eles consomem, maior é a compulsão que gera a necessidade de aumentar a quantidade diária para alcançar a satisfação desejada. ”Quando os pesquisadores estudam o cérebro de usuários compulsivos de pornografia, eles notam as mesmas mudanças cerebrais comuns a todos os vícios”, acrescentou Mary.
Problemas sexuais
Alguns especialistas afirmam que o aumento no número de casos de disfunção erétil em homens jovens está associado a questões como ansiedade de desempenho. No entanto, para um número considerável de profissionais de saúde, o comportamento sexual compulsivo estimulado pela pornografia é responsável por mais de 80% dos problemas sexuais masculinos, incluindo a disfunção erétil.
Clare ressaltou que indivíduos acostumados a se masturbar sozinhos com conteúdo pornográfico estão habituados a ter o controle total da própria experiência sexual, portanto, não estão adaptados a variáveis importantes no sexo a dois, como as necessidades de um parceiro na vida real e o próprio papel dentro da relação sexual. “Se os meninos acreditam que a pornografia on-line oferece uma visão realista das relações sexuais, isso pode levar a expectativas inadequadas de meninas e mulheres”, disse Elena Martellozzo, principal autora da pesquisa inglês, à BBC.
Segundo a Fundação Reward, o excesso de pornografia está mudando a forma como adolescentes e jovens se excitam sexualmente, e, por estarem condicionados ao conteúdo pornográfico para se sentirem excitados, eles apresentam dificuldades em ter ereções longe desse cenário. “Eu não conseguia manter uma ereção sem imaginar pornografia”, revelou Rhodes.
Ele não é o único. Outro homem jovem que passou por dificuldades sexuais é Gabe Deem, fundador do Reboot Nation, grupo voltado para conscientização e recuperação dos efeitos negativos causados pela estimulação sexual artificial como a pornografia. “[Aos 23 anos] eu tentei fazer sexo com uma mulher bonita por quem eu estava extremamente atraído, mas nada aconteceu. Eu não conseguia sentir nenhuma excitação física e não conseguia a menor ereção”, revelou em vídeo para o YouTube.
E a solução?
Apesar de não ser possível provar a ligação direta entre a pornografia e a disfunção erétil, depoimentos em fóruns on-line sobre o tema confirmam os achados da literatura clínica: abandonar o vício em conteúdo pornográfico melhora a capacidade do homem de ficar excitado pela intimidade na vida real.
De acordo com Mary, o primeiro passo para resolver a questão é parar de prescrever Viagra para um problema de origem claramente psicológica. A aceitação social do consumo de pornografia por homens leva muitos médicos a desconsiderarem que os pacientes têm um vício que precisa ser tratado adequadamente. Por causa disso, muitos homens recorrem até mesmo a implantes penianos (próteses implantadas no pênis para ajudar a ter ereções) quando as prescrições médicas para a pílula azul não exercem o efeito esperado. Ou seja, ainda que o sintoma desapareça, a causa permanece e continuará a prejudicar a vida sexual e afetiva desses homens.
Inibir o acesso a esse tipo de conteúdo durante a infância também é fundamental. “O sexo adequado à idade e a educação para relacionamentos nas escolas, lidando com questões como pornografia on-line e crianças enviando imagens indecentes, são cruciais”, concluiu Wanless.