Desde que o destino do ex-presidente Lula começou a ser selado pela Justiça, o PT montou dois cenários alternativos para garantir a presença do partido nas eleições presidenciais de 2018. Ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad foi alçado à segunda e mais promissora opção — o plano B. Na definição do próprio Lula, Haddad era detentor de qualidades importantes como a de ser um “petista com cara de tucano”, além de um intelectual capaz de atrair aquela parcela do eleitorado que se afastou da agremiação após os sucessivos escândalos de corrupção. Em janeiro, a Polícia Federal indiciou o ex-prefeito por falsidade ideológica eleitoral, o popular caixa dois. Ele é acusado de receber 2,6 milhões de reais de um dos empreiteiros envolvidos no petrolão, dinheiro usado para pagar despesas de sua campanha eleitoral em 2012. Embora não tenha sido fatal, a acusação fragilizou a situação de Haddad. Mesmo assim, o PT considerava ainda uma terceira hipótese: o ex-governador da Bahia Jaques Wagner. Na semana passada, essa hipótese ficou mais remota.
A Polícia Federal pediu a prisão temporária do petista. Na segunda-feira 26, o ex-governador foi o alvo principal da Operação Cartão Vermelho, que investiga o superfaturamento nas obras da Fonte Nova, um dos estádios da Copa de 2014. O pedido de prisão foi negado, mas a Justiça autorizou buscas na casa do ex-governador para tentar localizar provas do seu envolvimento com as construtoras denunciadas na Lava-Jato. Wagner, de acordo com os investigadores, teria recebido 82 milhões de reais em troca de defender os interesses das construtoras. “Verificamos que de fato o então governador recebeu boa parte do valor desviado do superfaturamento para o pagamento de campanha eleitoral e de propina”, disse a delegada Luciana Caires, responsável pela operação. O petista governou a Bahia entre 2007 e 2014. Segundo os investigadores, nesse período ele serviu aos interesses de empreiteiras da Lava-Jato.
O superfaturamento do estádio é apenas uma das denúncias. VEJA teve acesso a outras duas acusações contra o ex-governador que serão tornadas públicas em breve. A primeira vem da OAS, uma das empreiteiras da Lava-Jato. Um dos anexos da proposta de delação do empreiteiro Léo Pinheiro, ex-presidente da empresa, entregue à Procuradoria-Geral da República no ano passado, deixa Jaques Wagner em péssima situação. Léo Pinheiro promete revelar os detalhes do dia em que, em troca de propina, o petista abriu as portas do Palácio de Ondina, a residência oficial do governador da Bahia, para um encontro em que foi tramado um golpe contra os cofres do fundo de pensão dos funcionários da Caixa Econômica Federal, a Funcef.
No encontro, segundo Léo Pinheiro, Wagner foi orientado pela empreiteira a interceder junto ao então presidente da Caixa, Jorge Hereda, seu afilhado político, para convencer a Funcef a adquirir uma participação na OAS Empreendimentos, braço imobiliário da empreiteira. O lobby funcionou: em novembro de 2013, a Funcef autorizou a compra de cotas de 500 milhões de reais da subsidiária da OAS. Na proposta de delação, o empreiteiro também se dispõe a contextualizar mensagens encontradas pela polícia em seu celular. Em uma delas, ele conversa com outro executivo da OAS sobre os interesses da empreiteira na Funcef. “Que ótimo, como foi na Funcef, o nosso JW me perguntou”, escreve um interlocutor de Léo Pinheiro. “Ótimo. Foi aprovado para contratação do avaliador, Deloitte. Agora, precisaremos de JW, na aprovação final”, responde o próprio empreiteiro. JW é Jaques Wagner. Em troca, a OAS despejou dinheiro na campanha do governador.
Outra delação no forno tem como personagem a dona de uma ONG ligada ao PT da Bahia. Em 2014, Dalva Sele Paiva admitiu a VEJA que o Instituto Brasil, entidade de caráter social que ela comandava, fora usado para desviar cerca de 50 milhões de reais dos cofres da Bahia, quase tudo na gestão de JW — dinheiro que deveria ser utilizado para construir casas populares para famílias de baixa renda e que acabou nos bolsos e campanhas eleitorais de petistas. Dalva contou que a propina fora distribuída a membros do governo baiano, parlamentares petistas e até ao atual governador, Rui Costa, afilhado político de JW. As investigações, acompanhadas pelo Supremo Tribunal Federal, seguem ainda hoje.
Com tantas suspeitas sob investigação, é difícil imaginar que alguém consiga se viabilizar como candidato e ser levado a sério em uma campanha presidencial pós-Lava-Jato. Para a cúpula do partido, no entanto, a notícia de que JW recebeu 82 milhões de reais é mais uma prova de perseguição política contra os petistas. Por meio de sua conta no Twitter, o deputado Paulo Teixeira, do PT paulista, já chamou a atenção da militância: “Alerta aos petistas! Não cogitem nomes como candidatos à Presidência da República porque a Polícia Federal instaura inquérito e pede busca e apreensão na casa do sujeito. Já ocorreu com o Lula, com Haddad e agora com o Jaques Wagner”.
Publicado em VEJA de 7 de março de 2018, edição nº 2572