O fotojornalista baiano Gervásio Baptista esteve em sete Copas do Mundo, dezesseis edições do concurso de Miss Universo, acompanhou a Revolução Cubana, a Revolução dos Cravos e passou uma temporada registrando a Guerra do Vietnã — mas ficou conhecido mesmo como “o fotógrafo dos presidentes”. Precursor dos primeiros dias de Brasília, quando a então futura capital era apenas areia, terra e lama no cerrado, aproximou-se do presidente Juscelino Kubitschek, de quem viraria amigo. É de Gervásio, ou Gegê, como o tratavam, uma das imagens mais conhecidas de JK — em 21 de abril de 1960, data da inauguração de Brasília, Juscelino estava sorridente, com chapéu na mão esquerda, na celebração de novos tempos, que terminariam em 1964. Falante, bom de conversa, Gervásio desfiava histórias curiosas de sua longa carreira. Contava ter subido numa estátua de anjo durante o enterro de Getúlio Vargas, em São Borja, no Rio Grande do Sul. A certa altura da cerimônia, um homem puxou-lhe o pé: “Rapaz, você vai cair daí”. Era Tancredo Neves, então ministro da Justiça.
Foi de Tancredo, aliás, outra imagem muito conhecida clicada por Gervásio, certamente a mais discutida de todas. Em março de 1985, ele foi chamado pelo próprio presidente eleito para fotografá-lo ao lado da equipe médica, no Hospital de Base, em Brasília, onde Tancredo fora internado às pressas, com quadro de diverticulite aguda, inflamação das cavidades do intestino grosso. Era preciso mostrar que ele estava bem. Uma reportagem de VEJA, contudo, revelaria, semanas depois, que a cena fora montada. Havia duas sondas injetadas no braço de Tancredo, apagadas da imagem. Havia uma enfermeira no fundo, também subtraída. Gervásio sempre negou qualquer contrafação. “Ele estava bem”, disse numa entrevista em 2015. Três horas após aquela foto, uma hemorragia levou Tancredo para o Incor, em São Paulo, onde faleceu 27 dias depois. Gervásio tinha 95 anos. Vivia em uma casa de idosos no Distrito Federal. Morreu de causas naturais.
Publicado em VEJA de 17 de abril de 2019, edição nº 2630