Pouco antes do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e do Programa Universidade para Todos (ProUni) estar sob o fogo cruzado do Tribunal de Contas da União (TCU), que revelou em auditoria que as duas principais vitrines educacionais do governo não têm metas de acesso pleno à graduação, políticas contra a evasão escolar ou estudos sobre empregabilidade, era o Bolsa Família – e seu dispêndio mensal de mais de 14 bilhões de reais pagos aos beneficiários – um dos mais relevantes projetos do governo auditados pela Corte de Contas.
Em entrevista a VEJA, o ministro do Desenvolvimento Social Wellington Dias, que no ano passado viu o tribunal apontar fraude de 34 bilhões de reais no principal programa de transferência de renda do país, disse que defenderá a priorização do pagamento per capita à população contemplada pelo benefício e afirmou que o governo está à caça de desvios e ilegalidades em programas como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Seguro Defeso.
“Onde tiver fraude vamos combatê-las. Estamos tratando de dinheiro público”, afirmou. “Combater a fraude é importante não como estratégia de equilíbrio fiscal, mas para que o próprio país tenha eficiência em suas políticas sociais”, acrescentou ele. Na quarta-feira, 28, a equipe econômica anunciou que, na busca de uma economia de 25 bilhões de reais perseguida pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad, o BPC terá cortes de 6,4 bilhões no ano que vem e o Bolsa Família outros 2,3 bilhões.
A seguir os principais trechos da entrevista.
No ano passado o TCU apontou fraudes monumentais no Bolsa Família. Agora os problemas detectados pelo tribunal miram o ProUni e o Fies. Como diagnósticos assim são recebidos pelo governo? Considero muito importante o controle externo. Tão logo assumi, trouxe de volta a rede federal de fiscalização do Bolsa Família, fizemos uma parceria com o TCU e com os tribunais de contas estaduais e o resultado foi que, a partir dos relatórios que foram produzidos, temos mais segurança na tomada de decisão e no planejamento. Encontramos 3,7 milhões benefícios que tinham fraudes. Estamos falando de dinheiro do povo que poderia ser aplicado para os mais pobres, mas que, desviados, foram parar no bolso de quem não cumpriu as regras legais.
O TCU cobra agora que se verifique a eficiência do Benefício Complementar, pago às famílias para garantir o mínimo de 600 reais por núcleo familiar. O tribunal alega que o fim dele e a priorização do cálculo per capita poderiam economizar mais de 9% do caixa do Bolsa Família e até reduzir a pobreza em patamar 7% superior à configuração atual do programa. O TCU quer que a gente tenha como prioridade o valor per capita e vamos seguir nesse caminho. O ideal era se no Brasil a gente pudesse pegar pelo menos 218 reais, o que equivale a 40 dólares, igualmente para todo mundo. Reconheço que famílias maiores que não têm crianças têm per capita menor, e é sobre isso que o TCU nos alerta. Na primeira condição de reajuste que for possível fazer eu quero defender a tese de aumentar o per capita das famílias.
O Ministério do Planejamento afirmou que o corte de 25,9 bilhões de reais previstos pelo ministro Haddad para arrumar as contas públicas atingirá o BPC e ainda será preciso economizar pelo menos 2 bilhões no Bolsa Família. O que vai ser feito? Não é bem um corte no Bolsa Família. Começamos o ano passado com valores de 168 bilhões de reais para o programa e fechamos o ano com 166,7 bilhões. Em 2024 temos condição de alcançar uma cifra próxima à do ano passado. É por isso esses 2 bilhões anunciados. Tenho defendido que tenhamos para 2025 o patamar que seja claramente necessário para não ter problema no pagamento. Estou pedindo para que tenhamos na fixação do orçamento um valor semelhante ao que fecharmos neste ano.
O foco é buscar fraudes no BPC? No governo anterior, tivemos fraudes não só no Bolsa Família. Temos que averiguar porque é grande a possibilidade de fraude no BPC, no Seguro Defeso e no Benefício para Trabalhadores Rurais. Onde tiver fraude vamos combatê-las. Estamos tratando de dinheiro público. Combater a fraude é importante não como estratégia de equilíbrio fiscal, mas para que o próprio país tenha eficiência em suas políticas sociais. Um bilhão de brasileiros que tenham amparo do BPC através de fraude representa 16,8 bilhões de reais por ano. Combater a fraude é importante não como estratégia de equilíbrio fiscal, mas para que o próprio país tenha eficiência em suas políticas sociais.