Sem acordo sobre o conteúdo do “pacto”, o Palácio do Planalto decidiu adiar a cerimônia, que estava prevista para a próxima segunda-feira, de um protocolo de intenções com a assinatura dos chefes dos três Poderes. O principal motivo do impasse se refere ao formato do documento em defesa das reformas, que, na visão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acabou rotulado como “pauta do governo”.
O texto também sofre resistências de líderes de partidos. Além disso, a participação do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, tem sido alvo de críticas porque, na avaliação de alguns magistrados, fere a independência do Judiciário. Diante das divergências, o Planalto resolveu suspender, por tempo indeterminado, a divulgação do “Pacto pelo Brasil”, como foi batizada a iniciativa.
A ideia de apresentar um cardápio de propostas para o País, avalizado pelo Executivo, Legislativo e Judiciário, partiu do próprio Toffoli e começou a tomar forma em reunião promovida pelo presidente Jair Bolsonaro, no último dia 28, quarenta e oito horas depois das manifestações de rua que defenderam o governo e alvejaram o Congresso e o Supremo.
Até agora foram redigidos pelo menos dois textos, mas ainda não há consenso sobre os temas a serem tratados ali. O primeiro documento, sugerido por Toffoli, mencionava a necessidade de um “terceiro pacto republicano pela realização de microrreformas estruturais”. A segunda mensagem, fruto do encontro entre Bolsonaro, Toffoli, Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), citava as demandas da população como “o grande farol da democracia”, dizia que os Poderes estão unidos “em favor do estabelecimento de um novo tempo” e destacava cinco pontos considerados prioritários.
Na lista constam a reforma da Previdência – com um sistema “sustentável, eficiente e fraterno” –; a “modernização” tributária, a desburocratização das rotinas administrativas, a repactuação federativa e o combate ao crime – “nas ruas e nos gabinetes” –, à corrupção e aos privilégios.
O trecho do documento que aborda crime de “gabinetes” provocou revolta no Congresso. Nos bastidores, integrantes do Centrão entenderam esse capítulo como mais uma provocação de Bolsonaro à chamada “velha política”, por causa das investigações da Lava Jato. Na outra ponta, o Planalto passou uma borracha na parte que destacava a importância de um “terceiro pacto republicano”. Motivo: avaliou que era inconcebível apresentar esse acordo como uma continuidade dos outros, de 2004 e 2009, firmados na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), hoje preso.
Críticas
“Nós não podemos transformar o texto em um documento de política partidária, ideológica”, disse Maia. “A proposta veio numa linha muito política, muito carimbada como pauta do governo. Então, tendo em vista que são as instituições que estão assinando, é preciso avaliar se não é mais conveniente um formato de pacto como os anteriores, com alguns princípios fundamentais da relação entre os Poderes.”
Líderes de partidos consultados por Maia e por Alcolumbre também atacaram o pacto pela governabilidade, sob o argumento de que o Legislativo não pode dar um “cheque em branco” ao Planalto. Maia chegou a propor que Alcolumbre, no comando do Congresso, coordenasse uma nova proposta de pacto. “Na agenda econômica, não tenho nenhum problema em assinar. Só que é preciso um ambiente de apoio majoritário na Casa para que eu não fique assinando algo que não tem respaldo”, afirmou o deputado.
A participação do Judiciário em um “pacto” com os outros Poderes também era vista com desconfiança no STF. O ministro Marco Aurélio Mello disse a VEJA que “jamais” sequer participaria de um encontro com esse objetivo. “O Judiciário, como ele julga inclusive leis editadas, deve manter uma certa cerimônia”, afirmou.