O ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, não precisa de muito esforço para impor respeito. Com 48 anos de serviços prestados ao Exército, ele comandou duas missões de paz da Organização das Nações Unidas. Em 2007, derrotou gangues que aterrorizavam moradores de uma favela em Porto Príncipe, a capital do Haiti. Em 2013, no Congo, enquadrou o grupo rebelde M23, com ataques de infantaria, artilharia e lançadores múltiplos, numa ofensiva que deixou centenas de mortos. Além do currículo, Santos Cruz tem cara de poucos amigos e olhar intimidador. Por isso, quando foi escolhido para trabalhar na articulação política, difundiu-se em Brasília a seguinte pergunta: qual parlamentar teria a ousadia de tratar de assuntos não republicanos com o ministro? Sua nomeação, segundo os bolsonaristas, era a prova irrefutável daquilo que chamavam de “nova política”.
Em pouco mais de quatro meses de governo, Santos Cruz passou de solução a problema — pelo menos para alguns colegas de governo. Os adversários criticam sua avidez por abocanhar novas áreas para sua responsabilidade. Em abril, durante uma reunião no Planalto, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que coordenaria o processo de privatização dos Correios. Santos Cruz atalhou: “Deixa comigo. Tenho um time do Programa de Parcerias e Investimentos que sabe fazer análises de projetos e pode cuidar dos Correios”. Guedes não retrucou, mas não gostou da intervenção.
Santos Cruz também está em campanha contra o chanceler Ernesto Araújo, a quem julga despreparado, e se mostra disposto a indicar um militar para o comando da Apex, agência de fomento às exportações abrigada sob o guarda-chuva do Itamaraty e que já teve dois presidentes desde o início do governo. Para Santos Cruz, a rotatividade só acabará quando o órgão sair da alçada de Ernesto Araújo. Ou quando Araújo sair do governo. O general encomendou até um levantamento para contestar a legalidade das decisões do chanceler em relação à Apex.
Seus embates com a ala mais ideológica do governo têm sido renhidos desde que ele entrou em choque com Olavo de Carvalho, o guru da direita radical que encanta a família Bolsonaro. Em março, o general chamou o guru de “desequilibrado” por criticar o vice Hamilton Mourão e dizer que os militares do governo têm “mentalidade golpista”. Em resposta, Carvalho disse que Santos Cruz “simplesmente não presta”. O vereador Carlos Bolsonaro, o Zero Dois, discípulo do guru, também entrou na fila dos inimigos do general. Em abril, o Zero Dois chancelou a indicação do empresário Fabio Wajngarten para o comando da Secretaria de Comunicação, derrubando Floriano Amorim, com quem o general mantinha um bom relacionamento. A troca produziu — e ainda produz — faísca no setor.
Quando Santos Cruz defendeu a ideia de que a verba publicitária para as campanhas da reforma da Previdência fosse enxugada, Wajngarten advogou o contrário. Bolsonaro arbitrou a disputa em favor do novo titular da secretaria. Quando a verba foi finalmente aprovada por Santos Cruz, o Zero Dois atacou: “Depois de quase cinco meses! Isso é uma piada”. Passados alguns dias, voltou a disparar: “Vejo uma comunicação falha há meses da equipe do presidente”. No Congresso, porém, a atmosfera é outra. São cada vez mais recorrentes os elogios a Santos Cruz, em contraposição ao ministro Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil e articulador político do governo. “Há mais de quatro meses eu tento contato com o Onyx. O Santos Cruz é muito mais acessível e fácil de lidar”, diz o deputado Fausto Pinato (PP-SP). Durante a operação no Congo, um helicóptero em que estava Santos Cruz foi alvo de tiros, que provocaram um pouso forçado. O general relembrou assim o episódio: “Essas coisas fazem parte do trabalho. Quando estamos no meio, levamos tiro e temos de seguir, fazer o que tem de ser feito”. Pelo jeito, não será o fogo amigo que o fará desistir da missão.
Colaborou Nonato Viegas
Publicado em VEJA de 8 de maio de 2019, edição nº 2633
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