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Sergio Moro pode ser prejudicado pelo famoso vídeo da reunião ministerial

Dois meses depois da divulgação, a gravação não provou a interferência do presidente na PF, e o caso agora pode se voltar contra o ex-ministro

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 13h48 - Publicado em 24 jul 2020, 06h00
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  • Quando o seu conteúdo ainda era desconhecido, circularam duas versões sobre os bastidores da famosa reunião ministerial de 22 de abril. Para Jair Bolsonaro, ela revelaria que o ex-juiz Sergio Moro não era uma figura de princípios tão nobres. Prova disso é que ele teria sido repreendido pelo presidente na frente dos colegas por fechar os olhos a supostos excessos cometidos por policiais que estariam arbitrariamente prendendo pessoas no início da pandemia. Bolsonaro chegou a anunciar que iria tornar pública essa parte da reunião — uma clara tentativa de constranger Moro, que havia se demitido do Ministério da Justiça e acusava o presidente de tentar interferir indevidamente na Polícia Federal. Ao saber da intenção de Bolsonaro, Moro pediu ao Supremo Tribunal Federal que autorizasse a divulgação não apenas de um trecho, mas também da íntegra da reunião. O ex-ministro argumentou que havia nela diálogos que provariam as más intenções do presidente.

    O pedido de Moro foi acatado, mas o conteúdo da gravação não produziu o resultado previsto por nenhum dos dois lados. A reunião, na verdade, expôs o núcleo radical do governo. Ao longo de duas horas, o que se viu foram ofensas contra ministros do Supremo, contra governadores, críticas a outros países e um presidente da República visivelmente alterado. A confusão provocada pelo vídeo foi tamanha que, passados dois meses desde a sua divulgação, o Planalto ainda trabalha para contornar os danos institucionais, diplomáticas e políticos. Por causa da repercussão, Bolsonaro submergiu, escalou uma equipe de auxiliares para pacificar as relações com o Supremo e foi aconselhado a demitir três ministros. Abraham Weintraub, da Educação, foi o primeiro a tombar. Na reunião, ele defendeu prender ministros do STF, a quem chamou de “vagabundos”. Os outros dois ministros — Ernesto Araújo, das Relações Exteriores, que apareceu fazendo críticas pesadas à China, e Ricardo Salles, do Meio Ambiente, que sugeriu aproveitar o surto da Covid-19 como distração para aprovar leis controversas — balançaram em seus cargos e, agora, mantêm-se bem mais retraídos.

    Os desdobramentos do caso atingiram diretamente o presidente da República e ampliaram o fosso que já não era pequeno entre ele e o Supremo. Bolsonaro foi impedido pelo STF de nomear o seu amigo Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal, vai prestar depoimento no inquérito que investiga a denúncia de interferência na PF, viu seus ministros mais próximos e fiéis aliados sendo convocados a depor “debaixo de vara” e teve de enfrentar o endurecimento da Corte em relação aos militantes bolsonaristas mais radicais — um monumental turbilhão que, apesar de tudo, não produziu até agora uma prova contundente a ponto de esclarecer se, de fato, Bolsonaro cometeu alguma irregularidade, como sugeria Moro, nem algo que comprometesse a biografia do ex-ministro da Justiça, como insinuava o presidente. Apesar disso, Moro, o denunciante, pode acabar sendo o maior prejudicado.

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    EFEITOS PRÁTICOS - O vídeo: queda de Weintraub e radicais mais frágeis. (Marcos Corrêa/PR)

    Logo que o ex-ministro da Justiça pediu demissão, a Procuradoria-Geral da República decidiu abrir uma investigação para apurar as acusações contra o presidente. O ex-ministro confidenciou a amigos estar convencido de que a apuração será concluída pelo procurador-geral Augusto Aras sem fazer imputação alguma a Bolsonaro. Está convencido também de que há boa probabilidade de ele passar de acusador a acusado. Isso porque, ao instaurar o inquérito, Aras determinou que, além da tentativa de interferência, fosse apurada a eventual ocorrência de crime contra a honra e de denunciação caluniosa contra o presidente, cujas penas, somadas em caso de condenação, podem chegar a até dez anos de prisão. “Ele era o ministro da Justiça e devia ter mais responsabilidade sobre o que estava dizendo contra o presidente”, afirmou a VEJA um auxiliar de Aras, revelando a disposição da PGR.

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    Na reunião de abril, Bolsonaro reclamou de ações que teriam como alvo ele, sua família e seus amigos. “Eu não vou esperar f… a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meus, porque eu não posso trocar alguém da segurança. Vai trocar!”, disse o presidente. Esse era o trecho que, segundo o ex-ministro, demonstraria a intenção de Bolsonaro em interferir na PF atendendo a interesses pessoais. A investigação está na fase de diligências. Já foram ouvidos o ex-juiz, ministros, funcionários do Planalto e delegados. Uma das últimas etapas antes de a Polícia Federal concluir o trabalho é tomar o depoimento do próprio presidente. Depois disso, Aras decidirá se apresenta denúncia contra Bolsonaro, Moro ou nenhum dos dois. As duas últimas hipóteses são as mais prováveis.

    Com reportagem de Laryssa Borges

    Publicado em VEJA de 29 de julho de 2020, edição nº 2697

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