Enquanto o presidente Jair Bolsonaro promete manter uma distância regulamentar das eleições municipais deste ano, o vice Hamilton Mourão pretende fazer exatamente o contrário. Alçado a garoto-propaganda do PRTB, partido ao qual é filiado, o número 2 da República se prepara para uma maratona. Nas próximas semanas, começam a desembarcar em Brasília candidatos a prefeito oriundos de praticamente todos os estados. São quase duzentos peerretebistas em busca dos três cronometrados minutos que o general estipulou para que cada um deles tire uma fotografia e grave um vídeo com uma mensagem de apoio do vice a ser usada na campanha. “Vamos ver se a gente consegue eleger pelo menos 10% dessa turma”, diz Mourão. Seria um resultado histórico para uma legenda acostumada ao papel de figurante e uma demonstração de força política do general.
O PRTB deve lançar cerca de 1 000 candidatos a prefeito neste ano. Como não é possível o vice receber pessoalmente todos eles, o partido decidiu usar seu cabo eleitoral mais vistoso nas campanhas das capitais, das cidades apontadas como estratégicas e nas candidaturas consideradas com mais chance de vitória. Para atender os políticos de cidades pequenas e postulantes a vereador, totens do vice, com exatos 1,73 metro de altura, estarão à disposição nas sedes da legenda Brasil afora. “Isso vai permitir que todos os nossos candidatos possam aparecer ao lado do vice-presidente da República, mesmo que seja apenas um clone dele”, diz Levy Fidelix, presidente do PRTB.
O vice-presidente será, de fato, a principal peça de campanha. O PRTB, partido que não tem nenhum deputado federal, senador, governador nem sequer prefeitos em capitais, aposta as fichas em Mourão e na aliança com o governo Bolsonaro para sair do traço político. A legenda encomendou uma pesquisa, feita em São Paulo, para medir o tamanho da influência do general nas eleições de novembro. A amostra indicou que quatro em cada dez pessoas afirmam que votariam em um nome apoiado pelo vice. O resultado entusiasmou. O próprio Fidelix, o eterno candidato (desde 1984, ele já participou de treze pleitos, de vereador a presidente da República, sem nunca ter vencido nenhum), está confiante. Ele pretende disputar a prefeitura de São Paulo e aposta que, com Mourão a seu lado, pela primeira vez conseguirá ser um candidato competitivo.
Acreditando no próprio potencial para angariar votos, o vice tem chamado de “viradão eleitoral” o evento partidário em que será o centro das atenções. A romaria dos candidatos ocorrerá num clube da capital federal no primeiro e no terceiro fim de semana de setembro, aos sábados e domingos. Em tempos de pandemia, haverá todo um protocolo a ser seguido. Logo na entrada do salão, foi reservada uma área para a realização de testes rápidos de Covid-19. Somente após o resultado é que os candidatos poderão seguir até outra área, ocupada por 120 cadeiras espaçadas, para aguardarem a sua vez. Para evitar aglomeração, Mourão, de 67 anos, receberá os correligionários, um a um, num mezanino bem ventilado.
O ativismo do general foi previamente comunicado a Bolsonaro — uma precaução importante, já que as aparições do vice costumam eriçar a mente de muitos que cercam o presidente e que veem conspiração em tudo. “Vamos destacar as realizações do nosso governo nos pronunciamentos de campanha”, explica o general. Ao se engajar nos pleitos municipais, Mourão também está investindo para aumentar o próprio cacife eleitoral. O general, que disputou sua primeira e única eleição em 2018, não esconde que gostou da vida política e se diz “precipitadamente pronto” para disputar a reeleição ao lado de Bolsonaro em 2022. Ele sabe que sua cadeira é cobiçada por outros figurões da política — e o presidente, que já cogitou até o ex-ministro Sergio Moro como seu candidato a vice, nunca se pronunciou sobre a reedição da parceria. No que depender do vice, a guerra pelo posto vai começar.
Publicado em VEJA de 9 de setembro de 2020, edição nº 2703