A política é feita de símbolos. A tese do ministro Fernando Haddad de retornar a cobrança do PIS/Cofins sobre combustíveis a partir do dia primeiro poderia ter sido aceita ou recusada pelo presidente Lula da Silva e isso faz parte do jogo. Mas o anúncio através de um tuíte agressivo da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, de que a medida será possivelmente descartada enquanto Haddad representava o Brasil no encontro do G-20, na Índia, foi humilhante.
Ao tomar para si o papel de porta-voz da decisão do presidente, Hoffmann foi incisiva:
“Antes de falar em retomar tributos sobre combustíveis, é preciso definir uma nova política de preços para a Petrobrás. Isso será possível a partir de abril, quando o Conselho de Administração for renovado, com pessoas comprometidas com a reconstrução da empresa e de seu papel para o país. (…) Não somos contra taxar combustíveis, mas fazer isso agora é penalizar o consumidor, gerar mais inflação e descumprir compromisso de campanha”.
Em outras palavras: Hoffmann interditou o debate até abril, impôs como pré-condição a elaboração de uma nova política de preços na Petrobras e insinuou que a proposta de Fernando Haddad “penaliza o consumidor, gera mais inflação e descumpre compromisso de campanha”. Ninguém no governo saiu em defesa de Haddad.
A posição oficial do governo deve ser anunciada na segunda-feira, 27, depois do retorno de Haddad ao país. Mesmo que Lula agora decida a favor do time da economia, o estrago está feito.
A última vez que um ministro da Fazenda foi atacado publicamente dessa forma por um colega de partido foi em 1999, quando em crítica à austeridade de Pedro Malan, o novo ministro do Desenvolvimento, Clovis Carvalho, afirmou que “era preciso apressar o passo da retomada do crescimento (porque) o excesso de cautela, a esta altura, será outro nome para a covardia”. Carvalho vocalizava a opinião do PSDB e, embora amigo de décadas de FHC, foi demitido dias depois. A diferença é que agora Gleisi Hoffmann parece ter o aval de Lula para atacar Haddad.
A postura da presidente do PT reflete a impaciência de Lula com o gradualismo da política econômica de Haddad. A diretriz do ministro é linear: para retomar o crescimento sustentado, o governo precisa realinhar a política fiscal e monetária, reformar e simplificar o sistema tributário, ampliar o comércio internacional para além da China, recuperar o crédito do grau de investimento e usar a preocupação dos países ricos com a preservação ambiental para remodelar a indústria nacional. Só que Lula tem pressa.
Essa urgência do presidente é instigada por um grupo assessores palacianos que compõe o que batizei de “República dos isqueiros”. Ao contrário da turma do deixa-disso, os isqueiros do Palácio do Planalto querem botar fogo em tudo, incentivando os discursos mais beligerantes do presidente.
Dias atrás, um ministro, sabendo que por motivos de segurança é proibindo entrar com celular no gabinete presidencial, trouxe prints de memes bolsonaristas para tentar convencer Lula a apimentar seu discurso.
A insatisfação do presidente com Haddad é latente. Os ‘isqueiros’ sabem disso e insinuam que o ministro está próximo demais ao mercado, o que por si seria uma contradição com as promessas sociais do governo petista. No Planalto, a moderação de Haddad é confundida com tibieza e impaciência de Lula é vista como um aval para desqualificar a política econômica.
Haddad tem até a Pascoa para recuperar o protagonismo na condução da política econômica. A volta do imposto sobre combustíveis é o primeiro teste. Depois vem a nomeação dos novos diretores do Banco Central, a aprovação das medidas de ajuste fiscal, o anúncio do arcabouço que vai substituir o Teto de Gastos e o início da tramitação da Reforma Tributária no Congresso. Se não conseguir ter o apoio de Lula nesses pontos, a gestão de Haddad chega num impasse.
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As queixas de Lula sobre a moderação de Fernando Haddad são gentilezas comparadas com as opiniões que ele tem usado para descrever o novo presidente da Petrobras, Jean Paul Prattes.