Há pouco mais de uma semana, o presidente Jair Bolsonaro, durante viagem a Dubai, elogiou o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo). “Falamos a mesma linguagem. Temos interesses em comum. Ele, pelo seu estado; eu, pelo Brasil. É um casamento praticamente”, disse. Na quarta-feira 24, Sergio Moro (Podemos), em uma das primeiras visitas após colocar o seu nome na corrida presidencial, teve uma reunião com Zema em Belo Horizonte, que um aliado do ex-juiz classificou como “encontro de convergências”. O assédio dos presidenciáveis não é gratuito: além de Minas ser o segundo maior colégio eleitoral do país, Zema tem seu governo aprovado por 72,3% da população, segundo levantamento do Paraná Pesquisas feito neste mês. E é favorito para obter a reeleição em um estado onde isso é raro — Aécio Neves (PSDB) é o único da história de Minas a ter vencido duas eleições seguidas para o cargo, em 2002 e 2006.
Há pouco tempo, o cenário era bem distinto. Em junho, uma pesquisa do instituto Atlas mostrava Zema empatado com o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD). Na sondagem de novembro feita pelo Paraná, o governador já aparece com o dobro das intenções de voto do rival — 46,5% a 22,5%. A virada vem da melhora das finanças do estado empreendida por sua gestão. Desde agosto, o governo paga o funcionalismo em dia — o que não ocorria desde 2016 — e, pela primeira vez em seis anos, o 13º será quitado de uma vez, em dezembro. Mas o maior reforço de caixa veio do acordo assinado por Zema com a mineradora Vale como reparação pela tragédia de Brumadinho, que deixou 270 mortos em 2019: serão 37,6 bilhões de reais, sendo que 1,5 bilhão de reais será transferido pelo estado diretamente aos municípios.
Agradar aos prefeitos é parte importante da estratégia eleitoral em Minas, estado que tem o maior número de municípios do país, 854. O dinheiro será gasto obrigatoriamente em obras com apelo junto ao eleitor, como postos de saúde, redes de esgoto, reformas em creches, escolas, casas, quadras esportivas e pavimentação de ruas e estradas. Para as prefeituras, é um contraste muito grande com a gestão do antecessor de Zema, Fernando Pimentel (PT), com quem tinham uma relação conturbada devido à falta de repasses do ICMS, regularizados nos últimos três anos. “Por cumprir os acordos e a legislação, Zema conquistou a confiança dos prefeitos”, diz o presidente da Associação de Municípios Mineiros, Julvan Lacerda.
Para recuperar terreno, Kalil, que também é bem avaliado, terá de crescer para além da região metropolitana, o que, nesse contexto, é um desafio e tanto. Uma alternativa é tentar explorar os pontos considerados fracos do governador. Na Assembleia, Zema já enfrentou duas CPIs e se viu numa briga com os deputados pela paternidade de um auxílio financeiro de 600 reais aos atingidos pela pandemia. Mesmo com a melhora fiscal, o governo ainda prevê um rombo de 11,7 bilhões de reais em 2022, o que pode atrapalhar um pouco o discurso de boa administração. Seu principal projeto para sanar o problema é ser enquadrado no Regime de Recuperação Fiscal, iniciativa que sofre resistência dos deputados estaduais. “Provavelmente esse projeto vai continuar em banho-maria, mas, para todos os efeitos, Zema explora a imagem de um bom gestor junto à opinião pública”, avalia o sociólogo Robson Sávio, da PUC-MG. Como se vê, não são tantos flancos negativos assim.
Produto da onda de renovação política de 2018, Zema, ao lado de Ibaneis Rocha (MDB), do DF, ocupa uma posição confortável entre os governadores de primeira viagem. Na mesma categoria naufragaram Wilson Witzel, que sofreu impeachment no Rio de Janeiro; Carlos Moisés, afastado do cargo em processo semelhante em Santa Catarina (conseguiu voltar); e Wilson Lima, alvo de busca e apreensão e investigado pela tragédia que se abateu sobre o Amazonas na pandemia. Com a popularidade em alta e o caixa turbinado, Zema vem se distanciando desse grupo de outsiders fracassados. A respeito de seu papel na corrida presidencial em 2022, ele minimiza o assédio de nomes de outros partidos, lembrando que o Novo tem um pré-candidato, Luiz Felipe d’Avila. “Ainda é cedo para falarmos de eleição”, disse a VEJA. Para quem trocou há relativamente pouco tempo a vida de empresário pelo Palácio da Liberdade, o aprendizado na escola mineira de fazer política foi rápido.
Publicado em VEJA de 1 de dezembro de 2021, edição nº 2766