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Bolsonaro omite prisão ao dizer que esquerda matou pai de dirigente da OAB

Após críticas, presidente diz que Fernando Santa Cruz foi morto pelo grupo no qual atuava, mas ele foi detido junto com outro militante, também desaparecido

Por Fernando Molica e André Siqueira
Atualizado em 29 jul 2019, 19h28 - Publicado em 29 jul 2019, 18h58
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  • O presidente Jair Bolsonaro voltou a se manifestar nesta segunda-feira 29 sobre a morte de Fernando Santa Cruz – pai do presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz -, desaparecido durante a ditadura militar, quando militava na APML (Ação Popular Marxista-Leninista), grupo de esquerda que combatia o regime.

    De manhã, ele havia dito que “um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, eu conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade”. Após repercussão negativa entre entidades de Justiça e direitos humanos e críticas de líderes políticos, entre eles o governador João Doria (PSDB), o presidente, no final da tarde, fez uma transmissão ao vivo no Facebook – enquanto cortava seu cabelo – na qual disse que Fernando Santa Cruz foi morto pelos próprios militantes de esquerda.

    “O pai do Santa Cruz integrava a AP (Ação Popular de Pernambuco), era o grupo terrorista mais sanguinário que tinha. Esse pessoal tinha umas ramificações pelo Brasil, e uma delas, grande, no Rio de Janeiro. O pai dele, bastante jovem ainda, veio para o Rio de Janeiro. De onde eu obtive essas informações? Com quem eu conversei na época, oras bolas”, disse.

    Segundo Bolsonaro, “o pessoal da AP do Rio de Janeiro ficou estupefato” com a vinda de Fernando Santa Cruz para o Rio de Janeiro, porque a ação poderia comprometer a segurança do grupo. “Eles resolveram sumir com o pai do Santa Cruz, essa é a informação que eu tive na época sobre esse episódio”, disse. “Não foram os militares que mataram ele, não, tá? É muito fácil culpar os militares por tudo o que acontece”, acrescentou.

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    O presidente, no entanto, fez uma ressalva. “Não quero polemizar com ninguém, não quero mexer com os sentimentos do senhor Santa Cruz. Não tenho nada pessoal no tocante a ele. Acho que ele está equivocado em acreditar numa versão apenas do fato, mas ele tem todo o direito de me criticar”, disse.

    Omissão

    Ao declarar que Fernando Santa Cruz foi morto por integrantes de sua própria organização, no entanto, Bolsonaro omitiu que um outro militante, Eduardo Collier Filho, que também era ligado à Ação Popular Marxista-Leninista, foi preso na mesma ocasião. Ambos são considerados desaparecidos políticos.

    Relatório da Comissão Estadual da Verdade de Pernambuco (estado natal dos dois) cita que ambos foram presos no Rio em 23 de fevereiro de 1974, um sábado de Carnaval. Irmão de Fernando, o advogado Marcelo Santa Cruz Oliveira relatou à comissão que, na época, as duas famílias fizeram contato com a Anistia Internacional e com autoridades brasileiras em busca do paradeiro dos dois jovens.

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    No dia 14 de março, parentes dos dois militantes estiveram no DOI (Destacamento de Operações de Informação) do então II Exército, em São Paulo, em busca de notícias. Receberam de um carcereiro então a informação de que Santa Cruz e Collier Filho estavam presos lá e que poderiam ser visitados no domingo seguinte. Os parentes chegaram a deixar roupas e objetos pessoais para os dois. No domingo, ao retornarem, um certo “Dr. Homero” disse que houvera um equívoco e que nenhum dos dois esteve lá.

    No livro Memórias de uma Guerra Suja, o delegado aposentado Cláudio Guerra disse que Santa Cruz e Collier Filho foram assassinados pelas forças de repressão e tiveram seus corpos incinerados numa usina de cana localizada em Campos dos Goytacazes RJ).

    Atestado de óbito

    A coluna Radar revelou nesta segunda-feira que a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, um colegiado do Estado, vai emitir um atestado de óbito que reconhece que Fernando Santa Cruz, ao contrário do que afirmou Bolsonaro, morreu vítima da ditadura.

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    A comissão vai expedir no fim de agosto o documento com o reconhecimento do Estado pela sua morte, as circunstâncias em que se deram e também o pedido oficial de desculpas aos familiares. De outros casos também. Essa cerimônia já estava prevista desde maio. O atestado segue para o cartório que emitirá a nova certidão de óbito, contendo essas informações.

    O atestado vai dizer que Fernando morreu provavelmente em 23 de fevereiro de 1974, no Rio:  “morreu de morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985” – diz o documento oficial da comissão, que Radar teve acesso.

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