Em maio deste ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou que o PROS devolvesse aos cofres públicos um total de R$ 10,7 milhões por conta de irregularidades no uso do Fundo Partidário – uma espécie de mesada, bancada com dinheiro do contribuinte, que serve para financiar as despesas do dia a dia das agremiações. Neste ano, a cifra a ser injetada em todos os partidos alcança R$ 1 bilhão. No caso do PROS, entre os desvios apontados estavam a compra de um jatinho, um helicóptero e três imóveis, entre eles uma mansão em Brasília, onde está a sede da legenda. As irregularidades foram apontadas por uma área do próprio TSE, responsável por se debruçar sobre notas fiscais, fiscalizar os gastos e elaborar pareceres que orientam os ministros em julgamentos. Essa forma de atuação da Justiça Eleitoral, no entanto, está sob ameaça. A reforma do Código Eleitoral, em discussão na Câmara dos Deputados, pretende justamente esvaziar a competência do TSE na fiscalização do dinheiro público.
O texto, de relatoria da deputada federal Margarete Coelho (Progressistas-PI), prevê a possibilidade de os partidos contratarem empresas privadas de auditoria para atestar a legalidade de suas contas. A medida acendeu o alerta de técnicos do TSE, que apontam para o risco de um conflito de interesses, já que os partidos utilizariam dinheiro público para contratar uma empresa que fiscalizaria justamente o uso dessa verba pública. Nesse cenário, o TSE poderia reprovar as contas apenas se o relatório da auditoria “apresentar incongruências na movimentação financeira da agremiação”, ou seja, sem fazer uma análise mais aprofundada das despesas.
“A possibilidade de se contratar empresa de auditoria para produzir um relatório não é em si um problema, não é algo vedado hoje. O grande problema é que essa proposta amarra as mãos da Justiça Eleitoral na fiscalização das contas”, critica o diretor-executivo do Movimento Transparência Partidária, Marcelo Issa. “O que mais preocupa é essa possibilidade de transformar a fiscalização que a Justiça Eleitoral faz num ato meramente formal.”
O projeto também esvazia as punições que podem ser aplicadas aos partidos, ao fixar multa de R$ 5 mil a R$ 30 mil — atualmente, o limite é 20% do valor da irregularidade. Para Margarete, a proposta serve justamente para dinamizar e dar celeridade à prestação de contas. No caso do PROS, o julgamento de maio do TSE se refere às contas do partido de 2015. “Vamos ter uma empresa de auditoria, pré-cadastrada, autorizada pelo próprio TSE, que se vincula àquela prestação de contas, mas nada impede que se houver algum erro, inconsistência grave, essas contas sejam rejeitadas. Não é uma empresa do fundo do quintal, é uma contribuição para dar celeridade à Justiça Eleitoral”, justifica a parlamentar.
Os problemas do PROS não se resumem à desaprovação na prestação de contas de 2015 e lançam luz sobre o uso do dinheiro público pelas legendas. Candidatos das eleições de 2018 estão impetrando ações de indenização contra o partido e seu presidente, Eurípedes Júnior, por se sentirem lesados durante o pleito. Somente em Goiás, já são quatro candidatos nas eleições para deputados estaduais que impetraram ações no Tribunal de Justiça contra a legenda e seu presidente. Em comum, todos os candidatos reclamam que receberam cartões de débito para os gastos de campanha e que a Justiça Eleitoral rejeitou as contas por não ter como comprovar os gastos. Muitos candidatos do PROS estão respondendo a inquéritos na Polícia Federal por apropriação indébita de dinheiro de campanha.
A candidata Tania Ademar de Araújo disputou e perdeu a eleição para deputada estadual por Goiás em 2018. No mês passado, ela entrou com ação de indenização contra o PROS e Eurípedes Júnior. Ela foi uma das candidatas que recebeu o cartão de débito para gastos de campanha, não conseguiu justificar os gastos na Justiça Eleitoral e ainda foi condenada a restituir o valor que aplicou na campanha. O advogado Ricardo Antônio Simão, que defende Tania, diz que já impetrou ações em favor de três candidatos que se sentiram lesados. “Os candidatos foram induzidos a erro pelo partido e suas contas foram rejeitadas”, diz o advogado. Além de serem condenados a devolver o dinheiro do fundo partidário à Justiça Eleitoral, diz Simão, estes candidatos estão respondendo a inquéritos na Justiça Federal por apropriação indébita.
O candidato Johnathan Tarley, que é capitão da PM de Goiás, que disputou vaga de deputado estadual pelo PROS em 2018, é outro que impetrou ação de indenização contra o partido. Além de ter as contas desaprovadas, ele terá de devolver mais de 100 mil reais à Justiça Eleitoral. A unidade técnica da Justiça Eleitoral salientou que a sistemática utilizada para pagamento do pessoal contratado para a campanha, por intermédio de cartão de débito, impossibilita a efetiva fiscalização dos recursos financeiros transferidos pelo PROS. Um dos fundadores do PROS, Niomar Calazans, que foi afastado da direção da legenda após denunciar desmandos no partido, afirma que os repasses via cartão de débito foram uma foram que a atual direção encontrou para camuflar irregularidades com o dinheiro do fundo partidário. “Além de ser irregularidade, é fraude mesmo”, diz Niomar.
O PROS afirmou a VEJA que “a responsabilidade pela elaboração da prestação de contas é do candidato, não havendo qualquer ingerência do partido em sua elaboração”. Sobre a prestação de contas, desaprovada pelo TSE, o partido alegou que os gastos se “deram de forma regular, dentro da legalidade e foram, na sua totalidade, informados à Justiça Eleitoral”.