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Derrite nega excessos da PM de SP e diz: ‘Bandido bom é bandido preso’

Secretário da Segurança Pública de São Paulo afirma que combate ao PCC foi negligenciado no passado e declara que esquerda não sabe lidar com criminalidade

Oferecimento de Atualizado em 25 jun 2024, 18h22 - Publicado em 21 jun 2024, 06h00
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  • O capitão reformado Guilherme Muraro Derrite chegou ao cargo de secretário da Segurança Pública de São Paulo em janeiro de 2023 sob o signo da polêmica. Primeiro policial militar a chefiar a pasta, viu muita gente torcer o nariz para o fato de um oficial de baixa patente, com 38 anos, dar ordens a um major ou coronel. Além disso, trazia no currículo uma passagem turbulenta pela Rota, entre 2010 e 2015, quando deixou o comando de um pelotão marcado pela alta letalidade. É dessa época um áudio no qual diz ser “vergonhoso” um policial não ter ao menos três mortes na ficha em cinco anos — depois, pediu desculpas. Foi para o Corpo de Bombeiros, onde ficou até 2018, quando, na onda bolsonarista, conquistou a cadeira de deputado federal com 119 000 votos. Quatro anos depois, dobrou o número de eleitores. Sempre com o apoio do ex-presidente, acabou chegando ao posto atual. No cargo, reduziu taxas de homicídios, de latrocínios e de roubos. Em duas operações, a PM deixou 84 mortos na Baixada Santista, o que lhe rendeu uma saraivada de críticas. Em entrevista a VEJA, ele nega excessos, afirma odiar a frase “bandido bom é bandido morto”, mas ressalva que não se combate o PCC e outras facções vivendo em um “mundo utópico”.

    O senhor adotou a linha dura no combate à criminalidade. Isso funciona? O pilar é o combate ao crime organizado. A nossa estratégia é asfixiar financeiramente o PCC, e isso tem sido feito. Em 2023, batemos todos os recordes de drogas e armas apreendidas e de prisões de criminosos. Fizemos operações que ganharam relevância na mídia justamente pela postura de enfrentar de fato o crime organizado e não permitir que territórios paralelos sejam criados em São Paulo.

    Apesar de indicadores positivos na redução de crimes, a sensação de insegurança entre a população continua grande. Por que isso ocorre? A percepção de segurança ainda não está no patamar que a gente deseja porque os crimes continuam acontecendo. Para melhorar, é preciso presença ostensiva da polícia nas ruas. O governador autorizou a contratação de mais 13 000 policiais, vamos construir onze postos e acabamos de entregar 91 novas viaturas para a PM e outras 143 para a Polícia Civil. O reforço do efetivo e a disposição deles com base nos locais de maior necessidade irão, ao longo da gestão, melhorar a percepção de segurança.

    Operações recentes da PM que resultaram em dezenas de mortes foram alvo de muitas críticas. Como o senhor as recebeu? É claro que não desejamos as mortes de criminosos, muito menos de policiais que se colocam em risco, mas não podemos viver em um mundo utópico, achando que os locais onde realizamos as operações não eram dominados pelo crime organizado. Os confrontos aconteceram, não por desejo nosso, mas por necessidade.

    “A frase ‘bandido bom é bandido morto’ é reflexo da falta de punição aos criminosos. Para mim, bandido bom é bandido preso e cumprindo pena adequada e severa pelo crime que cometeu”

    Mas há relatos de policiais entrando em residências sem mandado. Houve também o chocante caso de uma mulher, mãe de seis filhos, que morreu baleada, por erro da PM. Não são sinais claros de que algo está errado? O sistema de justiça criminal tem todas as ferramentas para comprovar algum excesso. O que houve foram narrativas. Diziam que policial tirou uma criança do colo de um morador, queimou com cigarro, arrancou as unhas e depois executou, mas nenhum laudo do IML trouxe sinal de hematoma, quanto mais de tortura. Foram mentiras estimuladas pelo crime organizado para que as operações parassem de acontecer, por causa do prejuízo que demos: foram 2,6 toneladas de droga apreendidas, mais de 400 indivíduos procurados pela Justiça capturados, 119 fuzis apreendidos. Isso prova que a região onde atuamos, a Baixada Santista, não vivia um estado de normalidade antes dessas operações.

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    O que achou de o governador Tarcísio de Freitas ter ironizado as acusações das entidades de direitos humanos feitas à ONU, dizendo que poderiam ser levadas até a “Liga da Justiça”? Ele acompanhou todos os passos nas operações. Eu transferi o gabinete da secretaria para Santos para monitorar de perto, justamente para evitar que excessos acontecessem. Imagine que hoje todo mundo tem uma câmera no celular — se tivesse acontecido o que essas narrativas mencionaram, esses vídeos já teriam sido expostos.

    O que acha da expressão “bandido bom é bandido morto”? Odeio. Infelizmente, essa frase é reflexo da falta de punição adequada para os criminosos. Para mim, bandido bom é bandido preso e cumprindo pena adequada e severa pelo crime que cometeu.

    Por que houve tanta objeção ao uso das câmeras corporais pela PM? Eu fui um dos que mudaram de opinião com relação a isso. O modelo anterior era muito limitado quanto à funcionalidade, tinha custo altíssimo e entregava muito pouco. Vimos uma janela para, dentro de uma política pública nova, desenhar o que queríamos: uma câmera que evite abusos por parte de policiais, mas que permita também fazer o reconhecimento facial de criminosos, que funcione como radiocomunicador, que faça leitura de placas de veículos roubados. Vamos extrair o máximo possível de novos aparelhos, inclusive para proteger o policial.

    Qual o caminho para combater de forma efetiva as facções? Temos que inviabilizar a sua cadeia logística. O crime organizado se aproveita da infraestrutura rodoviária e aeroportuária de São Paulo para escoar o tráfico de drogas. Quando colocamos o policiamento estrategicamente em pontos das rodovias, quando usamos inteligência para aumentar as apreensões, impedimos a mobilidade, aumentando o custo e asfixiando financeiramente as quadrilhas. O nosso objetivo é que isso chegue a tal ponto que o crime organizado diga que não compensa mais transportar pasta-­base de cocaína da Bolívia e do Peru por São Paulo.

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    A segurança pública em São Paulo foi tocada por quase três décadas por governos de um mesmo partido, o PSDB. Houve falhas nessa área? O PCC, infelizmente, foi negligenciado por mais de trinta anos e se fortaleceu muito. Tem mais de 40 000 membros, inclusive células nos países produtores de cocaína, como a Bolívia, ou de maconha, como o Paraguai (leia a reportagem na pág. 40). Operam o tráfico de armas também. Quando eu era tenente da Rota, não se tinha uma dimensão da proporção a que poderiam chegar e o que fazer para implodir essa cadeia logística. A minha experiência no Congresso me deu uma visão sobre a infiltração do PCC até na política. Há comunidades em que se ouve: “Olha, aqui esse partido não pode fazer campanha, só pode esse”. Alguém tem que colocar um freio nisso, precisa virar o jogo.

    O senhor se licenciou do cargo para voltar a ser relator do projeto na Câmara que limitou as chamadas “saidinhas de presos”. Por que não concorda com a tese de que esse instrumento é importante para a ressocialização de quem está cumprindo pena? Estudos mostram que os indicadores criminais sobem nas saidinhas. Existem ainda aqueles que não voltam à prisão. Há ainda o aspecto moral, ou imoral, da legislação, porque criminosos famosos por matar os pais saem no Dia dos Pais, criminoso famoso por matar a filha tem saída temporária no Dia das Crianças. Isso vai resolver o problema da segurança? É óbvio que não, mas o fim da saidinha é um passo importante para combater a impunidade.

    O percentual dos que não voltam não é muito baixo? Vamos colocar 5%. Em São Paulo são 35 000 beneficiados, então, dá quase 2 000 presos que não voltam à prisão. Não é pouco. Temos um estudo que mostra que 47% dos criminosos presos pela polícia são retrabalho. É a famosa porta giratória. Fazer o preso pagar pelo crime que cometeu deveria ser causa suprapartidária. O bandido, quando chega com a arma na cabeça do cidadão, não pergunta se ele votou no Lula ou no Bolsonaro.

    Como parlamentar, quais outras mudanças o senhor defende? A au­diên­cia de custódia tem que ser reanalisada. Mais de 50% dos presos são liberados em até 24 horas. Temos ainda que endurecer regras para quem pertence a facções. A reincidência também deve ser tratada com maturidade. O cara não pertence a uma organização criminosa e foi preso pela primeira vez? Vai cumprir uma parte da pena, o.k. Mas, quando for reincidente, tem que tratá-lo de outra maneira.

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    “Fazer o preso pagar pelo crime que cometeu deveria ser causa suprapartidária. O bandido, quando chega com a arma na cabeça do cidadão, não pergunta se ele votou no Lula ou no Bolsonaro”

    Tanto o ministro da Justiça atual, Ricardo Lewandowski, quanto o anterior, Flávio Dino, disseram que a prioridade da União seria combater as facções. O senhor vê isso? O retrato para o governo deveriam ser os estados governados pelo PT. Como está a segurança pública nesses locais? Eles não têm conhecimento sobre a pauta, é o seu calcanhar de Aquiles. E tenho minhas dúvidas se eles realmente querem colocar o dedo nessa ferida.

    O senhor, então, é contra que a União assuma papel central de coordenação da segurança pública, como defendeu Lewandowski? O que o governo pode fazer é ouvir experiências, difundir boas práticas e estratégias e o principal: tem a obrigação de financiar. Os valores para educação e saúde são gigantescos, mas a segurança pública tem um recurso ínfimo.

    O senhor é uma personalidade política em ascensão e já é visto como um possível nome ao governo paulista em 2026, caso Tarcísio dispute a Presidência. Isso está no horizonte? Não está. Sou um grande idealista, estudei em escola pública em Sorocaba, com muito suor e sacrifício consegui passar na Fuvest, realizei meus sonhos de ser oficial da PM e trabalhar na Rota e no Corpo de Bombeiros. Sou muito católico, não adianta antecipar os planos de Deus. Estou entregando o máximo que eu posso. O resto é consequência.

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    Bolsonaro, de quem o senhor foi vice-­líder na Câmara, pode ser indiciado em alguns casos nos quais é investigado. Vai continuar a apoiá-lo? O governo dele foi disruptivo. Aprovamos a reforma da Previdência, a autonomia do Banco Central, ele deu suporte ao emprego, à renda, sustentou a economia, comprou vacinas, mas muitas coisas foram distorcidas. Em qualquer país, sempre fica um clima ruim quando há um ex-presidente da República respondendo a processos.

    A direita brasileira sobrevive com Bolsonaro fora das eleições? Ele pode estar sem mandato, mas se vier agora na Praça da Sé, daqui a quinze minutos, ela vai estar lotada. Gostem ou não, ele é um grande líder, e o seu maior trunfo foi que ele formou novas lideranças políticas.

    Publicado em VEJA de 21 de junho de 2024, edição nº 2898

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