Candidato democrata à Casa Branca, Joe Biden lidera as principais pesquisas eleitorais do país. Com uma média de 8 pontos percentuais de vantagem em relação a Donald Trump, o ex-vice-presidente se beneficia da rejeição à resposta do atual governo à pandemia de coronavírus e da insatisfação de afro-americanos, latinos e outras minorias com as medidas tomadas pelo presidente republicano.
Para além das críticas à gestão de Trump e das promessas por mais justiça social, melhores serviços de saúde e mais empregos, Biden gasta parte de seu tempo em comícios e eventos de campanha falando sobre seu passado. Vítima de tragédias familiares e diversos contratempos, o democrata atribui parte de seu sucesso profissional à sua resiliência e fé.
Joe Biden, de 77 anos, é católico e se aproximou mais da religiosidade após a morte de sua primeira mulher, Neilia, e a filha mais nova, Naomi Christina, em dezembro de 1972. As duas se envolveram em um acidente de carro em Wilmington, no estado de Delaware, enquanto o democrata, na época recém-eleito como senador, estava em Washington DC.
Naomi tinha apenas 13 meses de idade. O veículo da família foi atingido por um caminhão. Os outros dois filhos do casal, Beau e Hunter, também estavam no carro, mas sobreviveram. A suspeita de que o motorista do caminhão estivesse bêbado nunca foi confirmada.
Em um livro publicado em 2017, Biden escreveu que “a dor parecia insuportável no início e levei muito tempo para sarar, mas sobrevivi à provação. Com muito apoio, consegui sobreviver e reconstruir a minha vida e a minha família ”.
Pouco após o acidente, o democrata tomou posse como senador por Delaware. A cerimônia oficial foi conduzida no hospital, onde Biden ainda acompanhava Beau e Hunter, que ficaram feridos na batida.
Biden também teve o auxílio de uma nova mulher para superar a tragédia. Em 1977, o americano se casou com sua atual esposa, Jill Biden. Com ela, teve mais uma filha, Ashley, que hoje aos 39 anos é assistente social e defensora da reforma no sistema criminal dos EUA.
Quarenta e dois anos depois, porém, ele viveria outra tragédia. Seu filho mais velho, Beau, morreu de câncer no cérebro em maio de 2015, aos 46 anos. Procurador-geral do estado de Delaware (2007 a 2015), reservista do Exército enviado ao Iraque, Biden cogitou durante algum tempo a ideia de tentar suceder ao pai no Senado e parecia destinado a atuar na política nacional.
Desde que o filho morreu, o pai cita seu nome, emocionado, em quase todas as oportunidades. “Embora ele não esteja mais conosco, todos os dias ele continua a inspirar o próximo presidente dos Estados Unidos”, anunciou uma voz em off na Convenção Nacional Democrata, quando o ex-vice-presidente aceitou formalmente a indicação do partido em agosto.
Beau era casado e deixou dois filhos, Natalie, de 16 anos, e Robert, de 14. Após seu falecimento, sua mulher Hallie supostamente passou por um longo período de luto. Em 2016, anunicou formalmente um relacionamento com Hunter, irmão de Beau e seu antigo cunhado. Os dois namoraram por dois anos, mas não estão mais juntos.
Hunter, que é advogado e lobista, se separou de sua ex-mulher Melissa em 2015. No ano passado se casou com a advogada Kathleen, com quem vive até hoje.
Escândalo na Ucrânia
As tragédias, de certa forma, ajudaram a cimentar a empatia com a opinião pública americana. Biden é um dos políticos com carreira mais longa nos Estados Unidos e, além da experiência profissional, se apresenta como um homem movido pelo desejo de mudança e esperança – qualidades que afirma ter conquistado ao longo dos desafios enfrentados.
“O grande apelo de Biden é que ele é uma alternativa sólida a Trump”, diz o analista político e sociólogo da Universidade Columbia, Robert Y. Shapiro. “Ele também é visto como mais capaz de líder com a pandemia de Covid-19”.
Alguns escândalos envolvendo seu filho Hunter, porém, são vistos como uma das pedras no sapato do democrata. O advogado de 50 anos fez parte do conselho da empresa ucraniana de gás Burisma, envolvida em casos de corrupção durante os anos em que o pai ocupou a vice-Presidência dos Estados Unidos (2009-2017).
Em 2012, o fundador da empresa e ex-ministro do Meio Ambiente ucraniano, Mikola Zlochevski, passou a ser investigado por lavagem de dinheiro e sonegação de impostos. O empresário também foi acusado de ter usado sua posição como ministro para conceder contratos lucrativos para a Burisma. Hunter, porém, nunca foi investigado diretamente.
Em fevereiro de 2015, o jurista Viktor Shokin foi nomeado procurador-geral da Ucrânia e assumiu as investigações do caso. O governo de Donald Trump acusou Joe Biden de ter tentado intervir nas investigações e colaborado para a demissão de Shokin em 2016 em favor do filho e da empresa em que atuava. A denúncia, porém, nunca foi provada.
Segundo a defesa do democrata, Biden realmente intercedeu pela saída de Shokin, mas o fez a pedido do presidente Barack Obama e quando outras forças da sociedade ucraniana já vinham pressionando havia meses, em consenso, na mesma direção. Shokin era acusado pelo governo americano de encobrir casos de corrupção envolvendo aliados.
Porém, as suspeitas em relação à atuação dos democratas no país levaram Donald Trump a pedir ao presidente ucraniano Volodymyr Zelensky para investigar a fundo as ações de Biden e seu filho. A participação do mandatário foi entendida pelo Congresso americano como interferência em uma nação estrangeira e levou a abertura de um processo de impeachment em 2019. Trump foi absolvido pelo Senado de maioria republicana.
O caso ainda paira sob a campanha de Biden e os republicanos constantemente mencionam o tema como prova de que o democrata não é confiável. Há algumas semanas, o jornal New York Post publicou a transcrição de uma troca de e-mails entre Hunter e um executivo ucraniano, na qual o empresário supostamente agradecia ao americano pela oportunidade de se reunir com seu pai.
A reportagem foi traduzida pelos adversários de Biden como uma prova de sua interferência na política ucraniana e da existência de conflitos de interesses decorrentes da presença de Hunter na Burisma. Trump utilizou a história para atacar o rival no último debate presidencial, mas não teve muito sucesso, já que o assunto não ganhou destaque entre a opinião pública.
“O caso revelado pelo New York Post não deve ter grande impacto no desempenho de Joe Biden nas eleições, já que recebeu pouca atenção da imprensa local”, diz Hans Hassell, cientista político e professor da Universidade do Estado da Flórida. “Mas a campanha de Biden se preocupa o tempo todo com conservar sua imagem e posição”.
Hunter ainda foi vítima de uma reportagem publicada pelo GTV Media Group, grupo cofundado pelo ex-conselheiro da Casa Branca e antigo aliado de Trump, Steve Bannon. Imagens divulgadas por um veículo chinês comandado pelo grupo mostram o empresário abusando de drogas e se envolvendo em relações sexuais.
A reportagem é baseado em e-mails que teriam sido encontrados em um laptop abandonado de Hunter. Um conteúdo supostamente copiado do disco rígido mostra imagens pornográficas de uma pessoa supostamente parecida com o filho de Joe Biden.
O candidato democrata afirmou que as fotografias e vídeos são falsos e apenas mais uma tentativa de difamar sua imagem. Hunter não se pronunciou publicamente sobre o tema.