No mesmo dia em que a invasão da Rússia à Ucrânia completa duas semanas, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores russo, Maria Zakharova, afirmou que Moscou não tem objetivo de derrubar o governo de Kiev e espera alcançar progressos significativos na próxima rodada de negociações com representantes ucranianos.
Segundo Zakharova, a Rússia irá alcançar seu objetivo de garantir o status neutro da Ucrânia, mas pretende fazer isso através de conversas, mesmo que a operação militar esteja seguindo “estritamente em linha com os planos”.
A fala da porta-voz sugere uma mudança de tom dentro do governo russo. Em 25 de fevereiro, dia seguinte à invasão, o presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que Moscou combate “terroristas e neonazistas” no país vizinho e disse para soldados ucranianos tomarem o poder, deixando “mais fácil para chegarmos a um acordo”.
Em falas feitas durante uma reunião do Conselho de Segurança russo, Putin classificou autoridades do governo de Zelensky como “gangue de viciados em drogas e neonazistas”.
Antes mesmo da invasão, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, já afirmava ser o “alvo número 1” da Rússia, podendo ser assassinado “a qualquer momento”, segundo ele. Para Moscou, Zelensky possui ligação com grupos neonazistas, e a operação militar teria objetivo de “desnazificar” a Ucrânia.
Condições
Na segunda-feira, o porta-voz do governo russo, Dmitry Peskov, listou as condições para que a Rússia interrompa suas operações militares na Ucrânia. Em entrevista à agência Reuters, Peskov disse que o Kremlin exige que Kiev encerre sua ação militar, mude sua Constituição para a neutralidade, de modo que o país garanta que jamais irá fazer parte da Otan ou da União Europeia, e reconheça a independência das regiões de Donetsk e Luhansk, além de enxergar a Crimeia como um território russo.
A declaração foi a mais explícita por parte da Rússia de que está disposta a encerrar a “operação militar especial” no território ucraniano. Por telefone, o porta-voz disse que o governo da Ucrânia está ciente de todas as exigências desde o último encontro entre as delegações, em Belarus, e que “tudo pode ser interrompido em um momento”.
Pouco depois, perguntado sobre as condições de Putin para o fim da guerra, Zelensky disse que está “pronto para o diálogo, não para capitalização”. No entanto, em entrevista à rede americana ABC, disse também que “amenizou a situação com a Otan depois que entendeu que a aliança não está pronta para aceitar a Ucrânia”.
Sobre Luhansk e Donetsk, o presidente ucraniano afirmou que a “a situação é mais complicada do que simplesmente reconhecer” a independência dessas regiões, por se tratar da vida das pessoas que vivem lá, e reforçou seu compromisso com os que querem fazer parte da Ucrânia. Ele ainda saudou a coragem dos ucranianos, que estão servindo ao país, como algo “sem precedentes”.
“Podemos discutir e nos comprometer em como essas questões seguirão”, disse o presidente ucraniano.
Na segunda-feira, 7, representantes russos e ucranianos se encontraram para a terceira rodada de negociações. Após dois encontros na semana passada que renderam entendimentos escassos para proteção de civis, a terceira rodada de conversas terminou com “pequenos desenvolvimentos positivos”, segundo um representante ucraniano. Apesar do tom mais positivo, a implementação de corredores humanitários, que têm objetivo de facilitar a retirada de civis e a entrada de itens básicos como remédios, tem se mostrado difícil em cidades afetadas pela guerra.
Durante o fim de semana, duas tentativas de retirada de civis fracassaram. Grupos separatistas pró-Rússia e a Guarda Nacional da Ucrânia trocaram acusações de violações à ordem de interromper momentaneamente o conflito.
A Rússia acusa nacionalistas ucranianos de impedir a saída de civis da região, usando a população como ‘escudo humano’. “Devido à falta de vontade do lado ucraniano de influenciar os nacionalistas ou de estender o cessar-fogo, as operações ofensivas foram retomadas”, disse o major-general Igor Konashenkov.
As autoridades da cidade de Mariupol, por sua vez, disseram que a retirada de civis foi adiada porque militares russos não estariam respeitando a trégua. As prefeituras de Mariupol e Volnovakha disseram que as cidades são alvos de bloqueios e ataques russos, impedindo a saída segura dos civis. Mesmo após o acordo, a Ucrânia vinha alegando desrespeito dos russos ao acordo com as regiões sendo alvos de constantes ataques. As duas cidades foram as únicas autorizadas a funcionar como um corredor de fuga para os civis.
Mais de 2.000 civis foram mortos desde o início da invasão russa à Ucrânia, segundo Kiev, e centenas de estruturas, como instalações de transporte, hospitais, jardins de infância e prédios residenciais foram destruídos, relatou o serviço de emergência ucraniano na quarta-feira. Nesta segunda-feira, a Organização das Nações Unidas relatou que há mais de 1.200 pessoas afetadas, sejam mortas ou feridas, desde o início da guerra na Ucrânia. Ao todo, 406 pessoas teriam morrido, segundo levantamento da organização.