Em meio à guerra entre Israel e o grupo terrorista palestino Hamas, iniciada em 7 de outubro, a fronteira israelense com a Faixa de Gaza assumiu o centro dos holofotes da comunidade internacional. A divisa, contudo, não é a única fonte de dor de cabeça para Tel Aviv. A fronteira norte com o Líbano pode ser responsável pela abertura de uma nova linha de frente preocupante: o país é ocupado pela organização paramilitar xiita Hezbollah, nome que significa “Partido de Deus”, aliada do Hamas.
O grupo político e militante muçulmano, que também realiza operações terroristas, foi fundado em 1982, ano em que eclodiu a guerra entre Beirute e Tel Aviv. O conflito foi instaurado após o início da operação “Paz para a Galileia”, na qual Forças de Defesa de Israel (FDI) invadiram o sul do Líbano sob a justificativa de expulsar os centros de operação da Organização para Libertação da Palestina (OLP), instalados no país árabe.
A OLP foi considerada por muito tempo como uma organização terrorista por parte da comunidade internacional. Após os Acordos de Oslo, negociações entre o governo israelense e o grupo palestino em 1993, mediadas pelo presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, contudo, passou a ser reconhecida como uma organização política comprometida com a solução de dois Estados e realização da paz entre os dois povos. Também foi o início do fim com a guerra com o Líbano, que perdurou por 15 anos e é considerada uma das piores da história de Israel.
No entanto, três anos após o início do conflito, o Hezbollah lançou seu primeiro manifesto, em que determinava o Partido Social Democrata Libanês – relacionado aos cristãos, a Israel, à França e aos Estados Unidos – como seu grande inimigo. A carta estabeleceu a expulsão de todos os adversários de Beirute como seu principal objetivo. Ao contrário da OLP, além disso, o grupo se declarou contrário à solução de dois Estados e não reconhece o Estado de Israel até hoje.
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O Hezbollah estreou na política libanesa em 1992, alcançando popularidade apenas 17 anos depois, com um manifesto atualizado que apelava à “verdadeira democracia”. Desde então, obteve conquistas significativas nos últimos 30 anos, por meio da via política. Nas eleições de 2022, o partido obteve 13 assentos no parlamento, composto por 128 cadeiras. Perdeu, no entanto, a maioria na corte legislativa.
A opinião internacional quanto à organização radical libanesa não é uníssona. A União Europeia só condena o braço militar do círculo libanês, não a sua atuação política. Os Estados Unidos, por sua vez, definem o grupo como “terrorista”, associando-o a diversos ataques a civis ao redor do globo, como os ocorridos em quartéis militares dos Estados Unidos e da França em Beirute, em 1983.
Além disso, a Departamento de Estado americano acusa o Irã de ser o grande responsável por treinar, armar e financiar o Hezbollah, em um investimento que supera centenas de milhões de dólares anualmente. Como consequência, os militantes contam com bons recursos bélicos e uma força de tamanho médio, capaz de derrotar muitos exércitos árabes.
O Instituto Internacional de Estudos Estratégicos estimou em 2020 que a facção libanesa tinha até 10 mil combatentes ativos e cerca de outros 20 mil reservistas, com um arsenal de tanques, drones e vários foguetes de longo alcance. O analista e brigadeiro-general aposentado Assaf Orion, do Instituto de Estudos de Segurança Nacional de Israel, afirma que o Hezbollah possui “um arsenal de artilharia maior do que a maioria das nações”, e um relatório de 2018 do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais chamou o grupo de “o ator não estatal mais fortemente armado do mundo”.
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O Hezbollah não é o único a ser apoiado pelo Irã: o país muçulmano xiita foi vital para a militarização do Hamas, a partir de 2002. Embora os dois grupos tenham tomado lados opostos na guerra civil da Síria, a organização libanesa elogiou o mais recente ataque do Hamas ao território israelense, descrevendo o episódio como uma “resposta decisiva à contínua ocupação de Israel” e uma “mensagem” para os países árabes que buscam restaurar os laços com o Estado judeu, como Arábia Saudita.
“Os nossos corações estão convosco. Nossas mentes estão com você. Nossas almas estão com você. Nossa história, nossas armas e nossos foguetes estão com você”, acrescentou a declaração.
No domingo 15, o Hezbollah lançou um míssil contra Israel, com uma vítima registrada. O bombardeio teria sido uma resposta a um foguete de Tel Aviv que atingiu o território do Líbano no sábado 14, responsável pela morte do jornalista da Reuters, Issam Abdallah, e por ferir outras seis pessoas. Diversas trocas de disparos foram registradas na fronteira líbano-israelense desde a incursão do Hamas.
Os ataques aumentaram as preocupações da ampliação da guerra entre o Hamas e israelenses para um grande conflito regional, o que produziria um saldo maior de mortes de civis. Na semana passada, o Hezbollah ameaçou se juntar ao grupo terrorista palestino na luta contra o Estado judeu.
O Hezbollah e Israel estiveram em guerra pela última vez em 2006, quando paramilitares libaneses sequestraram soldados israelenses na fronteira norte. O embate durou apenas um mês, e foi encerrado com um acordo de cessar-fogo organizado pelas Nações Unidas.