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Primeiro debate republicano revela que será difícil tirar Trump de cena

Não há, até onde a vista alcança, ninguém na direita americana capaz de fazer sombra ao atual rei Sol e sua ruidosa onipresença.

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h11 - Publicado em 26 ago 2023, 08h00
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  • O jogo promete ser quente, embora um tanto desequilibrado. Na abertura semioficial da corrida para a Casa Branca, com o primeiro debate entre os pré-candidatos do Partido Republicano, realizado pela rede de TV Fox News, oito aspirantes marcaram presença, mas a grande estrela do partido, o ex-presidente Donald Trump, ficou de fora. Ou, como definiu o mediador Bret Baier, havia um “elefante fora da sala”, ao brincar com a dimensão política do personagem e a logomarca dos republicanos. Líder nas pesquisas de intenção de voto, Trump decidiu não dar a cara em um encontro no qual seria o centro dos ataques. Esperto, gravou uma entrevista para o jornalista conservador e chapa-branca Tucker Carlson.

    O resultado da noite americana? Goleada de Trump. O show dos oito, insosso, atraiu 24 milhões de telespectadores. A conversa trumpista, transmitida na plataforma X, que um dia se chamou Twitter, alcançou a marca de 74 milhões de visualizações. Não há, portanto, até onde a vista alcança, ninguém na direita americana capaz de fazer sombra ao atual rei Sol e sua ruidosa onipresença.

    Houve um momento, no debate, que ajuda a resumir a força magnética de Trump, e da qual parece ser impossível escapar. Baier perguntou à penca de candidatos se apoiariam a nomeação do líder republicano mesmo se ele fosse condenado em algum dos quatro processos que enfrenta na Justiça. Os que concordassem deveriam levantar a mão. Seis dos presentes se manifestaram positivamente. Apenas Asa Hutchinson, ex-governador do Arkansas, permaneceu impávido. Chris Christie, ex-governador de Nova Jersey, balançou timidamente um dedinho: “Quer você acredite ou não que as acusações criminais estão certas ou erradas, a conduta está abaixo do cargo de presidente dos Estados Unidos”, justificou, sob vaias da plateia. Foi o ápice de uma refrega chocha, em que sobraram respostas evasivas sobre temas espinhosos como mudanças climáticas, aborto e imigração. Apenas o novato Vivek Ramaswamy brilhou, na cola de Trump, a quem parecia imitar, dados os trejeitos e os olhares. Jovem empresário do ramo da tecnologia, filho de imigrantes indianos, ele afirmou que concederia perdão presidencial ao todo-poderoso. O ex-vice-presidente Mike Pence e o governador da Flórida, Ron DeSantis, que lutam para conquistar apoio, pareciam fantasmas sem voz.

    Do lado de lá, fora do picadeiro, nos 46 minutos em que esteve com Carlson, o apresentador de maior audiência da Fox, que foi demitido e trava uma batalha judicial com a emissora, Trump foi Trump. Cometeu racismo explícito ao defender que brancos “estão sendo trocados por pessoas de cor”; sugeriu que adversários poderiam tentar matá-lo; e disse que a combinação entre paixão e ódio, em um patamar nunca antes observado, poderia ser explosiva. No comentário mais cínico da noite, afirmou que havia “muito amor” entre a multidão que invadiu o Capitólio para tentar impedir a certificação de Joe Biden como presidente, em 6 de janeiro de 2021. “As pessoas dizem que foi o dia mais bonito que já viveram”, disse, esquecendo-se convenientemente dos cinco mortos no episódio e dos inúmeros feridos. Sem rebater os argumentos, o entrevistador se limitou a afagar o empresário: “Foi uma decisão terrível termos ficado sem você”, lamentou, deixando de lado as diversas vezes em que criticou o magnata, em mensagens privadas vazadas para a imprensa.

    MONOTONIA - A turma dos oito no debate: havia um “elefante fora da sala”
    MONOTONIA - A turma dos oito no debate: havia um “elefante fora da sala” (Win McNamee/Getty Images)
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    A ausência de Trump no debate republicano foi mantida em suspense enquanto se pôde e assessores se encarregaram de espalhar que ele “estava tentado” a comparecer, em um truque barato e antigo. Foram desmentidos pelo próprio pré-candidato. Em postagem na sua rede, a mentirosa Truth Social, ele alegou que a posição confortável nas pesquisas justificavam o bolo. Trump conta, segundo os levantamentos mais recentes, com 52% da preferência dos eleitores republicanos. Seu rival mais próximo, DeSantis, tem 12%. Todos os demais patinam em um mísero dígito. Outra sondagem aponta que 70% dos eleitores registrados no partido acham que seu mandato na Casa Branca foi bom e 60% querem que ele seja candidato novamente. “A vantagem de Trump sobre o segundo colocado não é limitada por situação socioeconômica ou área geográfica”, avalia Matthew Baum, professor de políticas públicas da Universidade Harvard. “Ela retrata o domínio dele em todo o espectro republicano.”

    Enquanto segue confiante, dizendo-se vítima de perseguição, Trump se enrola cada vez mais na pilha de processos a que responde por atos relacionados ao período em que foi presidente. No mais recente, no estado da Geórgia, seus advogados concordaram com o pagamento de uma fiança de 200 000 dólares para que ele possa aguardar o julgamento em liberdade, a primeira vez que a exigência foi feita — nas ações anteriores, ela foi considerada desnecessária.

    A promotora encarregada do caso, Fani Willis, com base em uma lei criada para combater mafiosos, acusa o ex-presidente e dezoito assessores de formarem uma organização criminosa para tentar alterar o resultado da eleição no estado — aí incluído o famoso telefonema de Trump para o republicano Brad Raffensperger, funcionário encarregado da apuração, solicitando que ele “achasse” votos suficientes para reverter a derrota para o democrata Biden. A expectativa é que pelo menos dois julgamentos se realizem antes da eleição, mesmo sendo o ex-presidente especialista em postergar processos judiciais. Se podem ou não influenciar o resultado da eleição, ninguém se arrisca a prever. O elefante está na sala.

    Publicado em VEJA de 25 de agosto de 2023, edição nº 2856

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