Mais votado nas primárias da Argentina, o candidato presidencial ultradireitista Javier Milei acumula uma série de declarações polêmicas. Entre a defesa da venda de órgãos humanos e a condenação da justiça social, as falas controversas alcançaram o representante máximo da Igreja Católica, o também argentino papa Francisco, chamado de “representante do maligno” e “imbecil” por Milei durante a corrida à Casa Rosada. Os “insultos irreproduzíveis” levaram o presidente da Conferência Episcopal Argentina (CEA), o bispo Oscar Ojea, a exigir respeito ao pontífice na segunda-feira, 11.
“Um dos candidatos proferiu insultos irreproduzíveis e falsidades. (…) O papa é para nós um profeta da dignidade humana em um tempo de violência e exclusão”, disse, em entrevista difundida pela Conferência Episcopal Argentina (CEA), sem citar o nome de Milei. “[Francisco] também é um chefe de Estado ao qual se deve um respeito particular”.
O puxão de orelha de Ojea soma-se ao coro de padres de Buenos Aires, que realizaram uma missa em repúdio a insultos contra o papa Francisco na última terça-feira. Na ocasião, o padre José Di Paola afirmou ser “indigno de um candidato” atacar a justiça social, uma vez que esta “faz parte do Evangelho, da doutrina social da igreja”.
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“Em última análise, o ataque [de Milei] atinge as raízes da nossa fé e do humanismo porque a justiça social não começa no ressentimento e na inveja, mas sim na compreensão do que significa liberdade, que não é apenas fazer o que se quer”, destacou o religioso.
Ao final da missa, o bispo auxiliar e vigário geral de Buenos Aires, Gustavo Carrara, e outros 71 padres do movimento “curas villeros” assinaram um documento conjunto. Os párocos condenaram a filosofia política de Milei e ressaltaram o desejo “de uma política a favor do bem comum, com a pessoa humana no centro”.
As primárias argentinas, realizadas em 13 de agosto, coroaram o favoritismo de Milei (da coalizão A Liberdade Avança), que recebeu mais de 7,3 milhões de votos. Ele foi seguido pelo ministro da Economia, Sergio Massa (do partido Frente de Renovação), com 5,2 milhões, e por Patricia Bullrich (da coalizão Juntos pela Mudança), com 4,1 milhões.
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Previsto para 22 de outubro, o primeiro turno argentino será marcado pela insatisfação com a economia e pela desconfiança em políticos considerados tradicionais. Na última sexta-feira, a consultora argentina Analogies apontou um empate técnico entre Milei, com 31,1%, e Massa, que arrecadaria 28,1%, com dois pontos percentuais para mais ou para menos.
Um levantamento da empresa de consultoria Voices!, liderada pela socióloga Marita Carballo, revelou que 52% da população argentina se considera católica, um número em queda quando comparado aos impressionantes 76% de 2008, mas ainda relevante para a disputa presidencial. Continuar a criticar Francisco pode, então, afastar o eleitorado católico do líder das pesquisas.
Economista pela Universidade de Belgrano, o ultradireitista prometeu “dinamitar” o Banco Central argentino e reduzir os gastos públicos, com iniciativas como reduzir o número de ministérios presidenciais para apenas oito – um contraste e tanto quando comparado aos atuais 18. As propostas extremas, contudo, parecem ter caído no gosto do público, ávido pela renovação política e afetado pela alta inflação, que chegou a 114% ao ano.
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Questões sociais, principalmente saúde, educação e desenvolvimento social, devem sofrer os primeiros desfalques caso alcance o poder. O radical argentino planeja reunir os três ministérios em um só, chamado “Capital Humano”. Além disso, ele é a favor das armas de fogo, contra o aborto – pauta prezada pela Igreja Católica – e questiona os crimes da ditadura militar, que englobam tortura e o desaparecimento de milhares de pessoas.
Milei é comparado a outros políticos de extrema direita, como o ex-presidente americano Donald Trump e o brasileiro Jair Bolsonaro, apoiador declarado do candidato de 52 anos. Em contrapartida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva alega que a democracia argentina estaria em risco, enquanto diplomatas brasileiros estariam preocupados com o efeito Milei no Mercosul.