A maioria dos eleitores dos Estados Unidos em quase todas as demografias e ideologias acreditam que seu sistema de governo atual não funciona, de acordo com pesquisa feita pelo jornal The New York Times em parceria com o Siena College. Segundo os dados, 58% dos entrevistados dizem que a democracia constitucional americana precisa de grandes mudanças ou de uma revisão completa.
Os descontentamentos que afetam o eleitorado republicano é motivado por dúvidas generalizadas e infundadas sobre a legitimidade das eleições no país, enquanto para os democratas há a percepção de que, mesmo que haja controle sobre a Casa Branca e o Congresso, são os republicanos e seus aliados estaduais e na Suprema Corte que estão alcançando objetivos políticos almejados há muito tempo.
Essa desconfiança daqueles que votam em candidatos republicanos é consequência direta natural da dominação do ex-presidente, Donald Trump, sobre o partido e, em grande parte, sobre a política americana como um todo. Depois de sete anos de ataques implacáveis às instituições nacionais, uma ampla maioria de eleitores republicanos compartilha de suas opiniões sobre as eleições de 2020.
De acordo com a pesquisa, 61% desse eleitorado disseram que Trump era o vencedor legítimo e 72% descrevem a invasão ao Capitólio de 6 de janeiro como um ato de protesto que saiu do controle. Os números saem no momento em que as evidências apontam cada vez mais que o ex-presidente e seus assessores ajudaram a direcionar a multidão de modo a manter seu controle sobre o poder executivo do país.
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Dentre todos os eleitores, 49% disseram que o ato de 6 de janeiro foi uma tentativa de derrubar o governo, ao mesmo tempo que outros 55% dizem achar que as atitudes de Trump ameaçaram a democracia dos Estados Unidos. Assim como vários outros pontos abordados, os eleitores em geral seguiram as narrativas de seus partidos – para 76% dos republicanos, ele estava apenas exercendo o seu direito de contestar a vitória de Joe Biden.
Questionados se Trump havia cometido crimes enquanto contestava o resultado das eleições, 89% dos democratas e 49% dos que se denominam independentes disseram que sim, enquanto 80% dos republicanos escolheram a resposta contrária. Olhando apenas para os que votam no Partido Democrata, 84% disseram que o ataque ao Capitólio foi uma tentativa de golpe e 92% afirmam que o ex-presidente ameaçou a democracia americana.
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O cinismo bipartidário sobre o governo sinaliza uma mudança filosófica importante. Por gerações, os democratas fizeram campanha com a ideia de que o governo era uma força para o bem, enquanto os republicanos procuravam limitá-lo. Agora, a pesquisa mostra que o número de americanos em ambos os partidos que acreditam que seu governo é capaz de responder às preocupações dos eleitores diminuiu.
Mais da metade das pessoas ouvidas – 53% – o sistema político dos Estados Unidos está dividido demais para resolver os problemas do país, um aumento de 40% em relação à mesma pesquisa realizada em outubro de 2020. Esse sentimento se tornou ainda mais agudo nas populações negras e mais jovens. Cerca de 48% dos entrevistados entre 18 e 29 anos disseram que o ato de votar não interfere na maneira como o governo opera.
A mudança de opinião afeta também a Suprema Corte, que passou a ser vista como um órgão político. Segundo a pesquisa, quase dois terços dos americanos acham que os votos dos juízes foram baseados em suas posições políticas, ideia compartilhada entre 88% dos democratas e 39% dos republicanos.
Os eleitores que apoiaram Biden em 2020 disseram estar desanimados com a maioria conservadora da Suprema Corte, que inclui três juízes nomeados por Trump. Entrevistas revelaram abismos na sociedade americana que se estendiam muito além dos debates políticos em Washington e se estendiam a questões culturais que muitas vezes dominam a cobertura jornalística.
Os conservadores expressaram oposição às medidas propostas de controle de armas e ganhos de direitos para pessoas trans, enquanto os liberais disseram não acreditar que os avanços dos direitos civis no país tenham sido tão lentos e que a Suprema Corte tenha encerrado o direito federal ao aborto.
A diminuição da confiança no sistema político americano ocorre em um momento de grande retração dos meios de comunicação locais. Mais de 2.500 jornais – cerca de um quarto do total – fecharam desde 2005, ao mesmo tempo que a audiência dos telejornais caiu drasticamente, levando mais americanos a receberem notícias através das redes sociais.
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A pesquisa apontou que apenas 34% dos eleitores confiam no que é veiculado sobre política e apenas 7% recorrem a um grande jornal nacional. Em relação aos jornais locais, esse número cai ainda mais, com apenas 1% dos entrevistados consumindo suas notícias.