Madeleine McCann — a garota britânica que desapareceu em Portugal quando tinha apenas três anos de idade, em 2007, durante uma viagem de férias com sua família — foi declarada morta pela Justiça alemã na quinta-feira 4, possivelmente encerrando um dos grandes mistérios em torno do caso que, ao longo de mais de uma década sem ser resolvido, repercutiu em todo o mundo.
“Assumimos que a garota está morta”, disse o procurador estadual da cidade alemã de Braunschweig, Hans Christian Wolters. E, o gabinete do procurador está “investigando um cidadão alemão de 43 anos por suspeita de assassinato”. O homem já foi condenado pelos crimes de estupro e abuso de menores
O desaparecimento de Madeleine desencadeou uma busca internacional, com pôsteres com o rosto da menininha impressos em todo o mundo, e celebridades, como Cristiano Ronaldo e J.K. Rowling, apelando por informações que pudessem ajudar a localizá-la e levar seus sequestradores à Justiça.
Mesmo que o corpo da garota nunca tenha sido encontrado, as declarações alemãs de que a Madeleine foi considerada morta foram as mais reveladoras até agora.
A polícia alemã havia dito na quarta-feira 3 que, embora a sequência exata de eventos ainda fosse objeto de investigação, o suspeito pode ter tido um motivo sexual, mas também é possível que ele tenha tomado uma decisão espontânea de sequestrar McCann durante uma invasão do quarto onde ela estava dormindo.
“Tudo o que sempre desejamos é encontrá-la, descobrir a verdade e levar os responsáveis à Justiça”, disseram os pais de Madeleine, Kate e Gerry McCann, em comunicado divulgado antes do anúncio do promotor alemão.
“Nunca deixaremos de ter esperança de encontrar Madeleine viva, mas, seja qual for o resultado, precisamos saber para ter paz”, acrescentaram. A polícia britânica, que está trabalhando em cooperação com as autoridades alemãs, disse que o caso continua sendo um inquérito de sequestro.
Conheça os detalhes sobre os principais desenvolvimentos no caso McCann, um dos maiores crimes europeus não solucionados e que atraiu a atenção mundial e motivou uma caçada global.
Desaparecimento
Em 3 de maio de 2007, Madeleine McCann, então com 3 anos de idade, desapareceu do quarto em que sua família estava hospedada no Ocean Club, um resort na Praia da Luz, em Portugal, enquanto seus pais, Kate e Gerry, jantavam com amigos em um restaurante próximo, ainda no resort, a menos de 100 metros de seu quarto.
O apartamento foi arrombado enquanto Madeleine e seus irmãos caçulas gêmeos, um menino e uma menina, estavam dormindo, e a polícia local concluiu que se tratava de um sequestro. “Não podemos descrever a angústia e o desespero”, disseram os McCanns em 12 de maio sobre o caso.
Duas semanas depois, em 26 de maio, a polícia portuguesa divulgou uma descrição de um homem visto possivelmente carregando uma criança na noite do desaparecimento de Madeleine.
Em um revés à investigação, os investigadores portugueses admitiram em junho que a cena do crime não fora protegida adequadamente, e pistas poderiam ter sido perdidas. No mês seguinte, em julho, a polícia britânica começou a ajudar na investigação na Praia da Luz.
Gerry e Kate como suspeitos
Cerca de 100 dias após o desaparecimento de Madeleine, em agosto, as autoridades responsáveis pelo caso reconheceram publicamente que a garota poderia não ser encontrada viva.
A imprensa internacional repercute o caso de Madeleine em todo o mundo, mas a investigação inicial da polícia portuguesa não produziu pistas importantes. Os detetives começaram a investigar os pais da garota, e, em setembro, Gerry e Kate foram interrogados como suspeitos.
Os McCanns publicaram em novembro um vídeo dizendo que acreditavam que sua família fora observada por “um predador” nos dias anteriores ao desaparecimento de sua filha. Então, em janeiro de 2008, o casal divulgou alguns esboços de um suspeito, com base na descrição de um britânico que estava de férias na Praia da Luz e que afirmou ter avistado um “homem assustador” pelo resort.
Em março, Gerry e Kate venceram uma ação contra dois tablóides britânicos, The Daily Express e Daily Star, que haviam sugerido que o casal estava envolvido no desaparecimento de sua filha. Os tablóides concordaram no tribunal em pagar 550.000 libras (3,4 milhões de reais, a libra não corrigida pela inflação) em danos por difamação.
No mês seguinte, em abril, a polícia portuguesa participou no Reino Unido, sob a condução da polícia britânica, do interrogatório dos amigos dos McCanns com quem o casal jantou na noite em que Madeleine desapareceu. Em julho, a polícia portuguesa apresentou seu relatório final sobre o caso, encerrou a investigação por falta de provas, e retirou Gerrry e Kate da lista de suspeitos do caso.
Dossiê vazado
Depois do ano de 2009, em que não houve desenvolvimento do caso por parte das autoridades de Portugal ou do Reino Unido, documentos não antes divulgados da investigação portuguesa vazaram para a imprensa britânica no primeiro trimestre de 2010. Os arquivos, que o jornal The Guardian estimou se estenderem por centenas de páginas, incluíam relatos de um britânico que viu uma garota loira sendo arrastada por uma estrada para o aeroporto de Faro, em Portugal, na noite em que Madeleine desapareceu.
Havia ainda no relatório imagens de câmeras de segurança mostrando uma jovem que se parece com Madeleine sendo levada a um supermercado na Nova Zelândia em 2007. Outro documento, no entanto, apontava que uma sósia da menina sequestrada foi vista sendo mantida à mão armada em uma rodovia francesa por meia hora por um homem nu em agosto de 2008.
Em abril de 2010, Gerry disse que é “incrivelmente frustrante” que a polícia em Portugal e no Reino Unido não buscassem ativamente sua filha “há muito tempo”. No final daquele ano, em novembro, o casal assinou um contrato para escrever um livro sobre o desaparecimento de Madeleine, que foi publicado em maio de 2011.
Operação Grange
Ainda em 2011, o então primeiro-ministro britânico, David Cameron, após ser contatado pelos McCanns, ordenou uma revisão do caso pelo período de dois anos pela Polícia Metropolitana de Londres, a Scotland Yard. As autoridades portuguesas disseram em abril de 2012 que não tinham elementos para reabrir sua investigação.
Em maio de 2013, a Scotland Yard disse que identificou “várias pessoas de interesse” e, até julho, abriu uma investigação formal, chamada Operação Grange.
Em outubro, as autoridades britânicas disseram ter identificado cerca de 40 suspeitos em potencial, e a polícia portuguesa reabriu sua investigação ao lado da britânica. Os portugueses disseram ter “novas linhas de investigação”.
Em 2014, o inquérito levou a polícia portuguesa a entrevistar quatro suspeitos. Enquanto isso, ainda em 2014, uma busca comandada pelas autoridades britânicas em um terreno baldio perto da Praia da Luz também não resultou em nenhuma nova pista.
Em setembro de 2015, o governo britânico divulgou que a investigação custou ao governo britânico mais de 10 milhões de libras (63 milhões de reais) até aquele momento.
Até abril de 2017, todos os quatro suspeitos interrogados pela polícia portuguesa em 2014 seriam considerados descartados de qualquer envolvimento no sequestro de Madeleine, até os anúncios desta semana.
O suspeito apontado pela Justiça alemã na última quinta-feira, 4, ainda comparecerá diante de um juiz e será julgado. O alemão, que tem 43 anos, está preso na cidade de Kiel, cumprindo pena por uma condenação que não foi divulgada, mas tem antecedentes de crimes sexuais, inclusive cometidos contra menores de idade. O jornal alemão Bild o identificou como Christian B..
A promotoria de Braunschweig confirmou que o homem é investigado por assassinato e, por isso, a acusação foi obrigada a admitir publicamente que a menina morreu. Ainda segundo o Bild, Christian B. viveu no Algarve, em Portugal, entre 1995 e 2007, próximo da Praia da Luz.
As investigações já confirmaram que o suspeito estava na região na época. Além disso, que ele fazia trabalhos ocasionais no setor de hotelaria no Algarve, mas possivelmente também se financiava com roubos em hotéis e apartamentos turísticos e tráfico de drogas. A polícia não divulgou mais informações sobre sua identidade ou como teria cometido o assassinato.
De qualquer maneira, seu indiciamento é o mais promissor desenvolvimento deste caso, que já se arrasta por 13 anos e desperta grande curiosidade de cidadãos ao redor do mundo.
(Com Reuters)