Depois de uma manobra constitucional para aprovar sua polêmica reforma previdenciária sem aval parlamentar, o governo do presidente francês, Emmanuel Macron, sobreviveu nesta segunda-feira, 20, à primeira de duas moções de censura levadas à Assembleia Nacional. Ao todo, 278 votaram a favor, nove votos a menos dos 287 necessários para reverter a medida do presidente.
Na semana passada, sob comando do presidente, a primeira-ministra francesa, Élisabeth Borne, usou o artigo 49:3 da Constituição para aprovar sem votação a reforma que, entre outras medidas, aumenta de 62 para 64 anos a idade mínima de aposentadoria a partir de 2023. Sob a reforma, os trabalhadores também precisariam trabalhar por, no mínimo, 43 anos para receber uma aposentadoria integral.
Em resposta, as moções de censura foram apresentadas por deputados de centro e pelo partido de extrema-direita Rassemblement National, de Marine Le Pen. Conforme a primeira delas, apresentada por três partidos, já fracassou, espera-se que a apresentada pela extrema-direita tenha o mesmo destino.
Assim que o fracasso da primeira votação foi anunciado, parlamentares do partido de extrema-esquerda LFI pediram a renúncia da premiê e levantaram cartazes convocando a população a ir às ruas.
“Nada está resolvido, vamos continuar fazendo tudo que podemos até que essa reforma seja retirada”, disse Mathilde Panot, diretora do partido.
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Mesmo com o sucesso, a vida de Macron pode ser complicada. Sindicatos e manifestantes, irritados com a reforma e com o fato de que não houve uma votação, disseram que vão seguir em frente com marchas e greves. Segundo François Hommeril, da Confederação Francesa de Executivos, “70% da população e 94% dos trabalhadores se opõem a este projeto”.
Macron argumenta que o ritmo envelhecimento da população francesa torna o atual regime de pensões inacessível. O rombo causado pelas pensões chega a 10 bilhões de euros — e segue em rota ascendente, com aumento previsto de 40% até o fim da década. O país já emprega 14% do PIB para o pagamento de pensões, bem mais que a vizinha Alemanha (10%) e os membros da OCDE, clube de nações ricas, com média de 8%.
Os franceses começam a receber o benefício, em média, aos 62 anos, contra 63 na Itália, 64 na Alemanha e 66 na Holanda. O problema é agravado pela redução no número de jovens. Em 2000, havia 2,1 trabalhadores contribuindo para cada aposentado, número que caiu para 1,7 em 2020.
Mas esse não é um sentimento compartilhado por todos no Parlamento, nem entre a população. Na faixa entre 35 e 49 anos, 77% disseram ser contrários à reforma.
O autor de um dos dois votos de desconfiança, Charles de Courson, disse que remover o governo é “a única maneira de deter a crise social e política neste país”, informou a agência de notícias AFP.
Os aliados de Macron estão em minoria na Câmara dos Deputados da Assembleia Nacional, mas para que as moções de censura tenham sucesso, toda a oposição teria que se unir.
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O Partido Republicano da França detém 61 assentos, e na semana passada seu líder, Eric Ciotti, disse que não apoiaria as moções de desconfiança. Segundo ele, a decisão de invocar o artigo 49:3 foi “resultado de muitos anos de fracassos políticos” que demonstraram “uma profunda crise em nossa constituição”, mas não acredita que o voto de desconfiança seja a solução.
Mas um membro sênior da legenda, Aurelien Pradie, disse que votaria contra o governo.