Na eleição em que o conservadorismo mostrou que ainda é forte, a longa e pouco produtiva política de guerra total às drogas nos Estados Unidos deu uma guinada. Seis estados puseram em plebiscito, com maior ou menor amplitude, a remoção da posse e uso de entorpecentes da lista de delitos passíveis de prisão — e em todos eles a proposta foi aprovada por ampla margem. “Foi uma declaração histórica de que está na hora de parar de criminalizar as pessoas pelo uso de drogas”, celebrou Kassandra Frederique, diretora da Drug Policy Alliance, ONG nova-iorquina que prega a isenção de penas para consumo “responsável”. Quatro estados — Nova Jersey, Arizona, Montana e Dakota do Sul — juntaram-se a outros onze que legalizaram a maconha, o que significa que um em cada três americanos já pode consumir cannabis sem descumprir a lei. Os eleitores de Dakota do Sul e Mississippi, dois bastiões conservadores, aprovaram ainda seu uso medicinal, que já é autorizado em mais de trinta estados americanos.
Na liberal Costa Oeste, o Oregon foi além: por maioria de 58,6%, descriminalizou o uso e posse de pequenas quantidades de todas as drogas, inclusive cocaína, heroína, LSD e metanfetamina, além de autorizar o consumo medicinal de cogumelos psicodélicos. Plantas alucinógenas deixaram de ser proibidas na capital, Washington. Os resultados confirmam a disposição da sociedade americana, à direita e à esquerda, de reavaliar a política em vigor desde o governo do ex-presidente Richard Nixon, nos anos 1970. Segundo pesquisa do Pew Research Center, em 2000, 60% da população era contra a legalização e 32%, a favor. No ano passado, a proporção se inverteu: 67% a favor e 32% contra. A nova mentalidade abrange a maioria dos republicanos: 55% apoiam a legalização da maconha. Detalhe: quase todas as propostas de liberação de drogas até agora foram aceitas em plebiscitos. Os políticos continuam mantendo distância da polêmica.
Publicado em VEJA de 11 de novembro de 2020, edição nº 2712