O Exército do Sudão se retirou nesta quarta-feira, 31, das negociações com o objetivo de alcançar um cessar-fogo total e fornecer ajuda humanitária em todo o país. A medida representa um golpe aos esforços para acabar com a guerra entre generais rivais, que já dura dois meses no terceiro maior país da África.
As negociações, mediadas por Arábia Saudita e Estados Unidos, foram o único grande esforço oficial em andamento entre o Exército sudanês e seu rival paramilitar, as Forças de Apoio Rápido. A guerra desencadeada provocou um momento de violência e caos que matou centenas de pessoas e deslocou milhões.
O Exército afirmou em um comunicado publicado em sua página no Facebook que está suspendendo sua participação nas negociações porque as forças paramilitares falharam “em implementar qualquer uma das disposições do acordo e continuar violando o armistício”. No Twitter, o grupo paramilitar disse estar apoiando “incondicionalmente” a iniciativa e que as violações do Exército “não nos impediram de honrar nossos compromissos”.
As negociações começaram na cidade portuária saudita de Jeddah no início de maio e alcançaram resultados limitados. Os dois lados concordaram com um cessar-fogo de sete dias que começou em 22 de maio. Essa trégua foi estendida por cinco dias na segunda-feira, quando ambas as partes planejavam maneiras de permitir a entrega de mais ajuda, a restauração de serviços como água e eletricidade e a retirada de suas forças de áreas urbanas, incluindo casas de civis e hospitais.
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Porém, apesar do andamento das negociações, o conflito continuou com combates em áreas urbanas, ataques de drones e ataques aéreos que forçaram a população a continuar deixando a capital Cartum e as cidades vizinhas de Omdurman e Bahri. Nos últimos dias, os combates também se intensificaram em El Obeid e Darfur, levando milhares de pessoas a fugir e cruzar para o vizinho Chade.
De acordo com o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários, em El Geneina, uma cidade no oeste de Darfur, as instalações de saúde foram destruídas e todos os 86 campos para pessoas deslocadas foram arrasados. Um apagão nas comunicações também manteve a região isolada do resto do mundo por mais de uma semana, aumentando o medo de mortes não relatadas.
Nas redes sociais, cada lado continuou a acusar o outro de quebrar o cessar-fogo. Segundo o Sindicato dos Médicos do Sudão, a guerra já deixou 865 mortos e 3.634 feridos. Quase 1,4 milhão de pessoas foram deslocadas, com 360 mil delas cruzando para países vizinhos como Egito, Etiópia e Sudão do Sul. As Nações Unidas disseram no mês passado que precisariam de US$ 2,56 bilhões, cerca de R$ 13 bilhões, para ajudar os afetados.
O Exército, controlado pelo general Abdel Fattah al-Burhan, e as Forças de Apoio Rápido paramilitares, lideradas pelo tenente-general Mohamed Hamdan, estiveram por muito tempo do mesmo lado. Em 2019, eles ajudaram a derrubar o ditador Omar Hassan al-Bashir, que ocupou o poder por três décadas.
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Em 2021, as duas forças também realizaram um golpe que derrubou o governo civil, frustrando a transição para um regime democrático. Entretanto, no ano passado, os dois líderes começaram a se desentender enquanto disputavam a supremacia sobre o Sudão.
Enquanto as negociações para um cessar-fogo eram realizadas na Arábia Saudita, líderes da União Africana e da Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento, também esperavam chegar a um acordo sobre um roteiro para futuras negociações políticas, incluindo apoios a uma possível transição democrática do país. Com o fracasso das negociações em Jeddah, os observadores agora estão agora preocupados com um conflito prolongado que pode ter sérias ramificações regionais.