País ao Norte da África assolado por toda sorte de mazelas, a Líbia foi palco, no domingo 10, da fúria de uma tempestade mortal. Segundo as últimas contagens, foram ceifadas mais de 5 000 vidas, mas as autoridades acreditam que o número pode dobrar, já que há 10 000 desaparecidos, números que tornam este o evento climático mais devastador na região em mais de um século. Uma conjunção de fatores, que alia o inclemente aquecimento global à inépcia humana, explica a tragédia que vai revelando sua face mais dolorosa à medida que a água baixa. Bairros de Derna, cidade na porção oriental, foram tragados pelas águas, os hospitais não comportam mais pacientes e corpos se espalham nas calçadas. Famílias inteiras são enterradas em valas comuns, como indigentes. O sistema de tempestades com características de ciclone, batizado de Daniel, que havia deixado um rastro de mortes na Grécia, na semana passada, ganhou potência de tsunami com as elevadas temperaturas do Mediterrâneo e rumou para a Líbia. Foi aí que entrou em cena o descalabro provocado por uma nação há uma década rachada por dois governos (o da área da tragédia não é apoiado pelo Ocidente). Duas velhas barragens se romperam, por completa falta de manutenção, e a terra foi engolida, sem que qualquer estratégia de alertas tenha sido posta em prática. “Muitos devem ter sido arrastados para o mar”, lamentou o ministro da Saúde, Othman Jalil. Não muito longe dali, outro desastre natural de terrível envergadura — o terremoto que chacoalhou o Marrocos dias antes, com mais de 2 900 mortos — produzia imagens do drama de quem perde tudo de uma hora para outra. Resta agora aos sobreviventes dos dois países o longo caminho da reconstrução.
Publicado em VEJA de 15 de setembro de 2023, edição nº 2859