O ativista anticorrupção e político do centro Bernardo Arévalo foi eleito presidente da Guatemala na noite de domingo 20. O resultado, quase inconcebível apenas algumas semanas atrás, é sintoma da crescente preocupação com a democracia na América Central.
Junto a El Salvador e Nicarágua, a Guatemala foi um dos vários países centro-americanos que sofreram com regimes autoritários nos últimos anos. Lá, juízes e promotores foram forçados a deixar o país em exílio e um importante jornalista foi preso.
A eleição de Arévalo – filho do primeiro presidente democraticamente eleito da Guatemala, Juan José Arévalo – representa um forte repúdio a essa erosão democrática e à corrupção política arraigada no país mais populoso da América Central.
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Em entrevista coletiva após a vitória, Arévalo comemorou a coragem dos eleitores que foram às urnas para “defender a democracia”. O ativista teve uma vitória esmagadora, fazendo sua rival e ex-primeira-dama, Sandra Torres, comer poeira. Arévalo conquistou 58,01% dos votos, enquanto Torres ficou com 37,24%.
“Obrigado povo da Guatemala. Este triunfo não é nosso. É de vocês, que nos apoiaram durante toda a campanha eleitoral”, disse o presidente eleito, ex-diplomata e sociólogo que dirige um partido recém-fundado chamado Movimiento Semilla (Movimento Semente). “Agora, juntos, como povo, vamos lutar contra a corrupção.”
Seus apoiadores se reuniram em frente ao hotel Las Américas na capital, Cidade da Guatemala, para o discurso de vitória de Arévalo. A multidão fez um imenso buzinaço, agitando bandeiras do país e aplaudindo alto.
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Até alguns meses atrás, a ideia de uma presidência de Arévalo parecia absurda. O intelectual de 64 anos, que nasceu no Uruguai depois que seu pai foi forçado ao exílio pelo golpe na Guatemala apoiado pela CIA, em 1954, chegou raspando no segundo turno de domingo. Ele ficou em segundo lugar no primeiro turno, em junho, com apenas 12% dos votos.
Semanas depois, em julho, o principal promotor da Guatemala tentou, sem sucesso, suspender o partido de Arévalo. A iniciativa foi vista amplamente como uma tentativa, recheada de motivações políticas, de minar sua campanha. Com efeito bumerangue, porém, só fez impulsionar ainda mais o nome de Arévalo, suscitando apoio de todo o espectro político.
No domingo, o presidente cessante da Guatemala, o conservador Alejandro Giammattei, deu os parabéns pelo Twitter e disse que convidou Arévalo ao palácio presidencial para organizar “a transição mais ordenada e completa que o país já viu”. O novo chefe de Estado assumirá o cargo em 14 de janeiro.
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O avanço democrático da Guatemala contrasta com a situação desoladora em El Salvador e na Nicarágua. O presidente salvadorenho, Nayib Bukele, colocou cerca de 1% da população de seu país atrás das grades como parte de uma altamente controversa “guerra contra as gangues” e parece prestes a garantir um segundo mandato de cinco anos na eleição de 2024, apesar disso ser proibido pela Constituição.
Já o nicaraguense e herdeiro do sandinismo, Daniel Ortega, governa ininterruptamente desde que foi eleito em 2006. Aos 77 anos, não dá sinais de deixar o cargo. Ortega recentemente deportou mais de 200 presos políticos para os Estados Unidos e retirou-lhes a cidadania.
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Além de suas políticas anticorrupção, Arévalo disse que deseja expandir as relações com a China, em paralelo à aliança de longa data da Guatemala com Taiwan. Ainda não se sabe como ele planeja fazer isso, dada a política chinesa que impede seus aliados de manterem relações diplomáticas com Taipei.