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Âncora de TV é denunciado por estupros, e #MeToo ganha força na França

Um grupo de mulheres veio a público revelar que o sedutor, na intimidade, era um predador

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h46 - Publicado em 5 jun 2022, 08h00
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  • QUEDA - PPDA: de conquistador invejado a “pária” na capa de revista -
    QUEDA – PPDA: de conquistador invejado a “pária” na capa de revista – (Eric Fougere/Corbis/Getty Images)

    Só agora, cinco anos depois da explosão mundial do #MeToo, a sofisticada e intelectual França está desembrulhando o pacote do francês sedutor, romântico, galanteador irresistível, e deixando à mostra a imagem sem disfarce de uma cultura machista e desrespeitosa. No centro das revelações está um âncora televisivo admirado nacionalmente, Patrick Poivre D’Arvor, o PPDA, 74 anos, que no auge da fama, nas décadas de 90 e 2000, à frente de um noticiário assistido por todo mundo na TF1, a maior emissora francesa, encarnava o charme, a confiança e a segurança do mais bem-sucedido — e invejado — dos homens. Pois um grupo de mulheres veio a público revelar que o sedutor, na intimidade, era um predador: PPDA é acusado de estupros, investidas grosseiras, abusos em série e difamação de vítimas que resistiram.

    O fio da meada foi puxado por ele mesmo. Em maio, seguríssimo de sua reputação, D’Arvor, casado há cinquenta anos e pai de três filhos, abriu processo por difamação contra dezesseis mulheres que o acusavam de abusos, alegando que eram “recalcadas” e que haviam sido “rejeitadas”. Em seguida, em uma entrevista desastrosa, confirmou que “sedução é importante para minha geração”, aí incluídos “beijos no pescoço”. Um portal de jornalismo investigativo decidiu então reunir vinte de suas vítimas em um estúdio e gravar o especial PPDA: Trinta Anos de Silêncio, repleto de denúncias cabeludas. “Queremos mostrar que estamos unidas, formamos um bloco. Patrick Poivre D’Arvor já não mete medo”, declarou a atriz Florence Porcel, a primeira a acusá-lo (queixa arquivada por falta de provas).

    Em um dos relatos mais violentos do programa, a professora Margot Cauquil-Gleizes conta que, em maio de 1985, quando era uma aspirante a romancista de 17 anos, enviou os seus escritos ao jornalista, que convenceu seus pais a autorizar um encontro dos dois no saguão de um hotel. De lá, ele a levou a um quarto, atirou-a sobre a cama e a estuprou. O encontro de vítimas abriu um amplo debate, no país dos debates, sobre consentimento e sexismo. “O comportamento dele ainda é comum na França, onde grifes seguem apelando para o sexo para vender roupas e os homens fazem comentários crus sobre a aparência das mulheres no trabalho”, ressalta Bérengère Stassin, pesquisadora de mídias da Universidade de Lorraine.

    Após a rejeição inicial ao #MeToo, visto como um americanismo sem sentido, nos últimos meses vários famosos franceses foram expostos e estão tendo ações reabertas, caso do escritor premiado e pedófilo assumido Gabriel Matzneff, dos atores Gérard Depardieu e Richard Berry, do intelectual Olivier Duhamel e do ministro do Interior, Gérald Darmanin. Boa parte dos ataques já prescreveu, mas PPDA, justamente por ter aberto o processo contra as mulheres, deve continuar vendo sua reputação rolar ladeira abaixo.

    Publicado em VEJA de 8 de junho de 2022, edição nº 2792

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