Relatório indica presença sem precedentes de extremistas nas forças alemãs
Presença de extremistas é motivo de 'vergonha', mas não um 'problema estrutural', diz ministro do Interior, Horst Seehofer
O governo alemão revelou nesta terça-feira, 6, um relatório sem precedentes sobre a presença da extrema direita nas forças de segurança, um motivo de “vergonha”, mas não um “problema estrutural, segundo o ministro do Interior, Horst Seehofer. De acordo com o documento, menos de 1% nas forças policiais, agências de segurança e militares da Alemanha defendem visões de mundo de extrema direita.
Escândalos se multiplicaram nos últimos meses após a descoberta de vários grupos de policiais que trocavam comentários racistas. No Exército, um comando de elite infiltrado por neonazistas foi parcialmente dissolvido.
“Cada caso comprovado é uma vergonha para todas as forças de segurança”, declarou Seehofer em entrevista coletiva. Segundo ele, o relatório é o mais abrangente desde a reunificação alemã, há 30 anos.
Desde o fim da II Guerra, a Alemanha reprime o extremismo com vigor — o uso de símbolos e expressões do nazismo está proibido, negar fatos ocorridos durante o regime de Hitler é ilegal e a incitação ao ódio é punida com até cinco anos de prisão. Nada disso, porém, vem sendo suficiente para impedir que a extrema direita levante a cabeça.
Os serviços de Inteligência contabilizam, de acordo com dados divulgados nesta terça, cerca de 377 casos de extremistas de direita nas forças de segurança, incluindo 319 na Polícia, uma pequena minoria entre os 300 mil policiais. Esses dados cobrem o período de janeiro de 2017 a março de 2020. Desde então, houve mais 125 notificações
Não existe “nenhuma rede de extrema direita dentro da Polícia Federal”, ressaltou o responsável Dieter Romann.
Os números se mostraram um alívio para Seehofer, acusado de não querer esclarecer totalmente as tendências de alinhamento à extrema direita, em sua convicção de que as ideias extremistas não são um “problema estrutural”.
Embora tenha apresentado este relatório elaborado pelos serviços de Inteligência, Seehofer ainda está relutante quanto a fazer investigações muito profundas, para evitar envergonhar o conjunto dos “99% de policiais que respeitam” a Constituição. No entanto, as regiões anunciaram que poderão conduzir suas próprias investigações para preencher essa lacuna.
Pressão por investigações
De fato, a pressão aumentou nos últimos meses, inclusive por parte do Partido Social-Democrata, parceiro dos conservadores na coalizão da chanceler Angela Merkel, para esclarecer o tamanho real desses grupos.
O próprio presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, convocou no final de setembro que se lute “com mais determinação” contra as redes de extrema direita no país.
A porosidade entre a extrema direita e parte da Polícia é, porém, algo comprovado. O partido Alternativa para a Alemanha (AfD) é o grupo no Bundestag com mais policiais em suas fileiras: 5 de 89.
No ano passado, quando houve crescimento de 10% no número de atos violentos cometidos por grupos nacionalistas, o governo declarou a extrema direita a “maior ameaça” à segurança nacional. A listagem oficial de radicais de direita registra o nome de 32.000 pessoas, das quais 13.000 propensas à violência.
Vários casos recentes, que as investigações do governo não incluíram na contagem, geraram indignação na Alemanha.
Na Renânia do Norte-Vestfália, a região mais populosa da Alemanha, cerca de 30 policiais, suspensos desde então, trocaram no aplicativo WhatsApp fotos de Adolf Hitler e suásticas, assim como bandeiras do Terceiro Reich e uma montagem mostrando um refugiado em uma câmara de gás em um campo de concentração. Um grupo semelhante foi desmantelado no final de setembro em Berlim.
Em julho, investigadores anunciaram a prisão de um ex-policial e de sua esposa, suspeitos de enviar e-mails ameaçadores a políticos e figuras públicas em toda Alemanha. As mensagens eram assinadas como “NSU 2.0”, uma referência a um pequeno grupo neonazista alemão cujos membros cometeram dez assassinatos racistas durante os anos 2000.
O Exército também não está livre. O KSK, um comando de elite, foi parcialmente dissolvido. Vinte de seus membros eram suspeitos de pertencer a um movimento neonazista, proporção cinco vezes maior do que no Bundeswehr (Exército) como um todo, segundo o Serviço de Contrainteligência alemão.