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“Assombrações e visagens dizem muito sobre quem somos”, diz Luiz Antonio Simas

Em 'Bestiário Brasileiro', o historiador e a ilustradora Barbara Quintino fazem inventário de figuras como o Boitatá, o Curupira e a Loira do Banheiro

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 5 out 2024, 16h36 - Publicado em 5 out 2024, 07h00

Em livro ilustrado por Bárbara Quintino, o historiador Luiz Antônio Simas resgata monstros, assombrações e visagens da cultura popular brasileira. Bestiário Brasileiro: Monstros, Visagens e Assombrações (Bazar do Tempo) traz um inventário de manifestações do imaginário coletivo oriundas dos universos rural e urbano. Simas, que estará na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), no Rio de Janeiro, entre os dias 9 e 13, segue os passos de Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) ao descrever e contextualizar figuras como o Boitatá, o Curupira, a sereia Uiara, o Velho do Saco, a Loira do Banheiro e vários outros, que ganham forma nos traços coloridos e lúdicos de Bárbara. Carioca, filho e neto de pernambucanos e alagoanas, o escritor também resgata uma expressão oriunda dos estados nordestinos, a visagem, categoria referente às monstruosidades que se materializam diante dos descrentes. A seguir, os principais trechos da conversa.

O que um folclore de um país diz sobre o povo dele? Eu acho que folclore, ou melhor, cultura popular, define o que aquele povo tem do ponto de vista da construção de sentido de vida, de beleza, mas também fala muito sobre nossos horrores e medos. Essas assombrações e visagens dizem muito sobre o que nós somos, tanto em termos do que construímos como sentido de vida, quanto daquilo que temos de medonho. É um indício poderoso para tentarmos entender quem somos.

Por que você prefere usar o termo “cultura popular” em vez de “folclore”? O termo folclore acabou ganhando certos sentidos sociais que o vinculam muito ao campo do pitoresco. Isso é complicado porque é como se tivéssemos uma cultura erudita e rebuscada, mas a cultura do povo fosse relegada ao campo do pitoresco. Prefiro trabalhar com a ideia mais ampla de cultura popular para não depreciar o complexo de sabedorias do povo.

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TOURO COROADO Figura seria o lendário rei Dom Sebastião,de Portugal, encantado – (Barbara Quintino/Bazar do Tempo/Divulgação)

Por que os monstros brasileiros não são tão populares mundialmente quanto os monstros clássicos da cultura anglo-saxã? Acho que talvez porque fomos colônia, não metrópole. O colonialismo opera na depreciação das culturas dos povos oprimidos. Temos monstros brasileiríssimos vinculados às culturas indígenas, às redefinições das culturas populares ibéricas e ao imaginário das Áfricas plurais, mas há uma desqualificação desses saberes. Além disso, o processo de urbanização é assassino de monstros, especialmente do imaginário rural, enquanto alguns monstros europeus são urbanos.

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O escritor Xico Sá festejou nas redes sociais que você recuperou o termo “visagem” no livro. Isso foi intencional? Foi. Eu cresci numa família nordestina, sou o primeiro carioca dela, e visagem era uma coisa muito comum. De repente, ninguém mais falava em visagem. Então foi uma maneira de fazer uma remissão à minha avó e meu avô, que acreditavam profundamente numa variedade impressionante de seres sobrenaturais. Visagem é uma herança familiar.

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ONÇA CABOCLA Kianumaka-Manã é uma deusa indígena da liberdade e tem um espírito livre – (Barbara Quintino/ Bazar do Tempo/Divulgação)

Você propõe uma diferença entre monstro, assombração e visagem no livro. Pode explicar? O monstro seria aquilo que foge do que consideramos normal. Estudar os monstros é interessante para compreender uma determinada sociedade, porque as sociedades têm repúdio em relação àquilo que se apresenta como diferente. A visagem é aquilo que você vê, algo que se materializa. E a assombração talvez seja a mais amedrontadora, porque nunca precisa ser vista. A assombração é uma porta que bate, um vento que sopra diferente. Eu fui um garoto com muito medo de assombração.

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Quais são suas figuras folclóricas preferidas? Quando criança, eu era muito impactado pelas histórias do Boi-Tatá. Mas os monstros que mais me impressionaram eram mais urbanos, como a loura do banheiro e o homem do saco. Eu tinha muito medo de assombrações em geral.

O que você acha que falta para resgatar essas figuras em filmes, séries, livros e outras mídias? Falta fazermos um trabalho mais sistemático de perceber que esses monstros, visagens e assombrações são atualíssimos e contemporâneos. Falta uma consciência de brasilidade, de entendê-la como um manancial enorme para contar histórias e entender sentidos de mundo. O Brasil gosta muito pouco da brasilidade, e falta esse apreço pelo que temos de interessante.

Você acha que incluir essas figuras em jogos eletrônicos e RPGs seria uma forma de resgatá-las? Valeria, se fosse uma interação. Mas o desafio é manter a dimensão do encanto e do assombro. Valeria usar isso para a tela, mas também abrir a possibilidade de nos espantarmos com o mistério ligado à rua. Estamos num mundo muito desencantado. Temos muita religião e pouca magia, e a religião é inimiga da magia.

Capa de 'Bestiário Brasileiro; Monstros, Visagens e Assombrações' (Bazar do Tempo), de Luiz Antonio Simas, com ilustrações de Barbara Quintino -
Capa de ‘Bestiário Brasileiro; Monstros, Visagens e Assombrações’ (Bazar do Tempo), de Luiz Antonio Simas, com ilustrações de Barbara Quintino – (Bazar do Tempo/Divulgação)
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