Aos 46 anos, a carioca Alessandra Montagne vive há 25 em Paris e, depois de muita ralação ao fogão, ingressou naquele rol de chefs que passam pelo crivo da crítica, inclemente na cidade, e colhe elogios pela gastronomia que produz em dois restaurantes de puro sotaque brasileiro: o Nosso e o Tempero, próximos à arena de Bercy, onde Rebeca Andrade vai duelar por medalhas enfrentando ninguém menos que a genial Simone Biles. Logo ela estará em ação também no museu do Louvre, pilotando um dos restaurantes a convite de Alain Ducasse, o dono da maior coleção de estrelas no guia Michelin, a quem se refere como padrinho nesta competitiva arena.
Conhecedora da cena gastronômica parisiense, Alessandra sabe muito bem como este território é repleto de boas surpresas, algumas das melhores do mundo, mas também reserva dissabores ao paladar e ao bolso. Para evitar este infeliz destino num lugar tão rico em opções, ela dá dicas simples aos turistas que já começam a formar um formigueiro humano e tirar suas selfies em torno dos cartões-postais. “O que recomendo para quem vem de fora é procurar os locais onde os franceses fazem suas refeições”, diz. Eis a receita que ela dá, com o olhar de quem conhece os bastidores da cozinha, para fugir das várias armadilhas espalhadas pelas encantadoras ruelas e bulevares.
Quantidade indigesta
Desconfie quando um restaurante serve vinte entradas e mais vinte pratos. Ele não tem condições de executá-los todos in loco. A maior chance aí é que uma parte seja comida congelada, mas ninguém vai admitir. Ao contrário: uma lei francesa autoriza os estabelecimentos a dizer que é tudo fait maison, feito ali mesmo, considerando apenas que a iguaria foi aquecida no lugar. Na prática, até o McDonald ‘s ostenta o tal selo.
Tudo ao mesmo tempo agora
Pizza, sushi, carne – não há como fazer tanta variedade mantendo a régua alta. As cozinhas em Paris são espremidíssimas e dificilmente acomodariam lado a lado um sushiman e um pizzaiolo. A probabilidade de a receita desandar é alta.
Cartão-postal é para ver, não para comer
Os estabelecimentos que gravitam em torno das grandes atrações, como a Torre Eiffel, costumam cobrar caro por uma comida insossa que os franceses não comem. Viu um engarrafamento de ônibus turísticos na porta? Foi dado o sinal para fugir.
Não responda ao chamado
Aqueles garçons plantados na porta, convidando a entrar, são um indício de que a casa não enche pelas razões que deveria. Há muitos desses no Quartier Latin e nas imediações da Notre-Dame e da Sacre Coeur.
O idioma aqui é francês
Menu em inúmeras línguas? Está aí a certeza de que o lugar não está na rota dos locais. Preferível procurar aqueles bistrôs onde o povo da cidade vai e, se não entender o que o menu diz, acionar o velho e bom Google Translator.
O barato que sai caro
Parece sedutor aceitar um Kir royal de graça para ter um refresco nestes dias de termômetros nas alturas. Mas cuidado que uma coisa leva à outra e daqui a pouco você está dentro do restaurante. Detalhe: já houve casos em que o mimo presenteado na porta é feito da mistura de sobras de tintos e brancos, o que resulta nos rosés dos tais drinques gratuitos.
Olhar a comida do vizinho
Vários restaurantes têm mesas do lado de fora, os chamados terraces. Observe os pratos de quem já está sentado e veja se abrem o apetite. Se não, meia volta volver.
Tamanho pode ser documento
Aqueles salões gigantes, para centenas de pessoas, dificilmente darão conta de oferecer à mesa um confit ou um tartare que façam jus à tradição. A exceção são os bouillons, restaurantes em que, por não muitos euros, dá para provar de tudo um pouco da gastronomia local. Os franceses adoram.