Há fotografias olímpicas que nascem clássicas — a mais emblemática até aqui dos Jogos de Paris foi clicada a mais de 15 000 quilômetros de distância, na Praia de Teahupo’o, no Taiti, onde se disputava o torneio de surfe. O fotógrafo francês Jérôme Brouillet, da agência AFP, vive há mais de dez anos na Polinésia Francesa e gira o mundo atrás dos bailarinos dos oceanos. Da soma do conhecimento do esporte e das agressivas ondas daquela praia, de mãos dadas com perfeito controle de tempo e sorte, ele fez a imagem que circulou o mundo pelas redes sociais. Parece ter sido tratada digitalmente, filha da inteligência artificial, mas não. É 100% real. Mostra o brasileiro Gabriel Medina parado no ar, de punho erguido como o de um herói grego, com a prancha ao lado, em construção geométrica. Brouillet, que conhece as manhas e manias de Medina, sabe que, ao sair de tubos imensos como os de Teahupo’o, ele sempre faz algum gesto especial. O fotógrafo estava numa lancha com outros dez profissionais. Fez quatro cliques daquele momento, apenas quatro. Um deles, agora marcado para sempre, foi escolhido pelo editor e distribuído aos quatro ventos. Em minutos, viralizou. “É apenas mais uma foto, estou fazendo o que amo”, disse o profissional, em falsa modéstia. O impressionante registro, o corpo e o equipamento paralisados entre o mar e o céu, é a mais bem-acabada imagem do que o francês Henri Cartier-Bresson definiu como o “instante decisivo”. Assim: “Não há nada no mundo que não possua um instante decisivo”.
Publicado em VEJA de 2 de agosto de 2024, edição nº 2904